Moradores da Ocupação Mauá, no centro da capital paulista, relataram que um grande contingente de policiais entrou no local com cães farejadores e quebrou câmeras de segurança
Os moradores da Ocupação Mauá, localizada na região central de São Paulo, foram surpreendidos com a chegada inesperada da Rota canil, da Polícia Militar, na tarde deste sábado (20) no local.
Inúmeras viaturas, motos e cães farejadores invadiram o prédio em que residem 237 famílias. Formada há 14 anos no edifício onde, um dia, foi o Hotel Santos Dumont a ocupação é apoiada pelo Movimento de Moradia na Luta por Justiça (MMLJ).
De acordo com o advogado do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos que esteve no local, Eduardo Abramowicz Santos, 25 anos, a ação ocorreu por volta das 16h e acabou por volta das 17h30. Segundo a polícia, houve uma denúncia de que alguém no local portava drogas. “Eles vieram com um exército de policiais, inúmeras motos e carros, entraram na ocupação sem mandado, com cachorros farejadores, dizendo que receberam uma denúncia da presença de drogas no local. Eles impediram a entrada e a saída dos moradores”.
Apesar da denúncia, os policiais averiguaram quase todos os apartamentos. “Eles não tinham o nome de uma pessoa específica, encontraram drogas em um apartamento. Não tivemos relatos de violência física, mas de toda a forma, os moradores foram impedidos de entrar e sair da ocupação. Os policiais estavam fortemente armados e intimidaram os moradores”, diz o advogado.
A conselheira tutelar Janete de Fátima estava dentro de seu apartamento na ocupação quando tudo ocorreu. Ela diz que ouviu uma sirene e foi descer para ver o que ocorria, mas foi pega de surpresa por um policial armado que exigiu que ela permanecesse dentro de casa. “Quando disparou uma sirene eu tentei sair, mas os policiais já estavam aqui em cima e não me deixaram descer”.
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Com medo do que poderia ocorrer, Janete ficou dentro de casa com a família. “Ficamos fechadas dentro de casa, eu, minha filha e minha neta. Ninguém entrava e ninguém saía do prédio. Nos fizeram entrar em casa com uma metralhadora na mão, na minha casa não pediram para entrar. Eles subiram no telhado e estavam quebrando tudo lá no pátio. Foram muitas viaturas e motos”, relata.
Nelson da Cruz Costa, uma das lideranças da ocupação ficou preso, mas do lado de fora do local. “Eu não estava na ocupação na hora que os policiais chegaram, quando recebi as mensagens peguei um táxi e vim correndo para poder acompanhar junto com as pessoas o que aconteceu. Foi horrível, eles trancaram a portaria”.
Para ele faltou diálogo dos policiais com as lideranças da ocupação. “O Estado só nos representa para diminuir a nossa imagem, se eles viessem aqui, a liderança atenderia prontamente eles, não iria negar. Isso que eles fizeram não se faz com nenhum ser humano”, disse revoltado com a situação.
Em um vídeo a Nelson mostra a quantidade de viaturas no local. “Cada vez mais chegam viaturas aqui para o povo ficar coagido”.
Os moradores também denunciaram que os policiais danificaram as câmeras de segurança da entrada da ocupação, como explicou Benedito Roberto Barbosa, 60 anos, advogado popular do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos. “Os policiais quebraram as câmeras de vigilância da ocupação, onde tem uma portaria. Esta ação foi uma violência ao direito de ir e vir das pessoas. Não é a primeira vez que isso acontece na Ocupação Mauá, é um absurdo essa forma de agir em uma ocupação organizada, no centro de São Paulo”.
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As imagens de câmera de segurança confirmam as denúncias dos moradores, em uma delas um policial destrói o aparelho.
Benedito ainda aponta que já foram encaminhadas denúncias para os órgãos responsáveis. “Já entramos com denúncias na ouvidoria da polícia, no Ministério Público e no Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, pedindo providências em relação a esse ato de violência da PM. Isso precisa ser mudado”.
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De acordo com o advogado Eduardo Abramowicz Santos, uma mulher grávida foi encaminhada à 2ª Delegacia de Polícia. “Segundo o sargento comandante encontraram drogas em um dos apartamentos e encaminharam uma grávida para o 2º DP, ela foi atendida por um advogado da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil”.
Arnobio Rocha, advogado da Comissão de Direitos Humanos da OAB informou que a grávida se encontrava com fortes dores na barriga, mas “sem nenhum sinal de agressões físicas”, ela está na delegacia sob suspeita de porte de drogas.
Procurada pela Ponte, a Polícia Militar não respondeu aos questionamentos enviados até a publicação desta reportagem.
ERRATA: Uma versão anterior desse texto dizia que a Ocupação Mauá é auxiliada pelo MTST. Na verdade é o MMLJ (Movimento de Moradia na Luta por Justiça) que é ligdo à ocupação. A informação foi corrigida às 12h30 do dia 21/2/2021.
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