PM que teria matado durante agenda de Tarcísio em Paraisópolis participou de ação que deixou criança ferida

Segundo promotor, câmera mostra tenente Ronald Camacho disparando contra Felipe Lima durante tiroteio em 2022, na campanha eleitoral do atual governador de SP; troca de tiros da PM no mesmo bairro nesta quarta (17) teve criança ferida na cabeça

À esq. policiais são filmados olhando para o chão e recolhendo objetos após criança ser atingida em tiroteio nesrta quarta, em 17/4/2024; à dir. o então candidato a governador Tarcísio de Freitas em entrevista coletiva após jovem ser morto perto de sua campanha em Paraisópolis, em outubro de 2022 | Foto: Reprodução / Amauri Gonzo

Um dos policiais militares que participou de ação que terminou com uma criança negra de sete anos ferida na comunidade de Paraisópolis, zona sul da capital paulista, nesta quarta-feira (17/4), teria sido responsável pela morte de um homem durante uma agenda de campanha do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) na região quando ele ainda era candidato, em 17 de outubro de 2022.

Na época, Tarcísio estava visitando a inauguração do primeiro pólo físico de uma universidade na favela, acompanhado por moradores e pela imprensa, quando o evento foi interrompido por um tiroteio. Felipe da Silva Lima, de 27 anos, foi encontrado com ferimentos de arma de fogo próximo à Rua Ernest Renan.

A investigação do caso foi arquivada no ano passado pois o Ministério Público de São Paulo (MPSP) e o Tribunal de Justiça (TJSP) entenderam que os PMs agiram em legítima defesa. Apesar de a perícia não ter identificado qual arma foi responsável pelo disparo que atingiu Felipe, o promotor Fabio Tosta Honer descreveu que a câmera que o tenente Ronald Quintino Correia Camacho usava na farda identificou que ele deu um tiro na direção que o homem estava, como apontou o site Metrópoles.

O tiroteio teria acontecido após dois homens, um deles com um “volume na cintura”, terem filmado uma viatura descaracterizada da PM. Felipe aparece em um vídeo feito por um dos policiais se aproximando do veículo usando uma camiseta verde e branca conduzindo a moto e Rafael Almeida Araújo, de boné branco e camiseta azul, na garupa com o celular apontado como se tivesse filmando. Ambos sem capacete.

O tenente declarou que a equipe de segurança de Tarcísio, que continha policiais em trajes civis, indicou que os disparos vinham sentido na Rua Ernest Renan e a equipe foi atrás. Lá, Camacho disse que viu um homem de boné branco e camisa azul se protegendo atrás de um poste, com arma em punho, que mirou duas ou três vezes em sua direção e deu um tiro. Ronald afirmou que, para “repelir injusta agressão”, fez um disparo de fuzil. Depois, viu o homem caído, ferido por arma de fogo, próximo a uma motocicleta caída e com um carregador de munição.

Contudo, testemunhas ouvidas pelo site Intercept Brasil disseram que Felipe foi baleado por policiais à paisana (sem farda) quando estava desarmado. Agentes licenciados da Polícia Federal e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que estavam no evento, negaram integrar a equipe de segurança de Tarcísio.

O Intercept também entrevistou especialistas que apontaram condutas dos PMs que atrapalharam as investigações.

Uma delas, indicada no inquérito, é que policiais coletaram objetos espalhados pelo chão, como cartuchos íntegros e deflagrados, o que pode prejudicar a realização da perícia para indicar, por exemplo, trajetória de disparos, identificação dos disparos realizados e de munições que foram empregadas. O tenente Ronald Camacho disse em depoimento, também obtido pela Ponte, que determinou o recolhimento dos vestígios dos disparos “devido à insegurança no local para as equipes e para os moradores”.

Comportamento semelhante foi gravado por moradores na região onde a criança teria sido ferida nesta semana. Em um vídeo, policiais do 16º BPM/M aparecem conversando, olhando para o chão e recolhendo objetos, que poderiam ser estojos (cartuchos) dos projéteis disparados.

Em nota, a Ouvidoria das Polícias de São Paulo disse que abriu um procedimento, “oficiando a Policia Civil, solicitando detalhes do que foi instaurado para apuração da ocorrência, assim como laudos periciais e imagens do entorno e à Corregedoria da PM, solicitando imagens das COP’s [câmeras operacionais portáteis, que os PMs usam na farda] e o afastamento dos policiais envolvidos, uma vez que imagens recebidas por esta corregedoria mostram policiais em ações que viriam a obstruir o trabalho da perícia no local”.

Em coletiva nesta quarta-feira, o porta-voz da PM, coronel Emerson Massera, declarou que o local foi preservado. Também disse, antes de qualquer conclusão da investigação, que não foi tiro da polícia que atingiu o menino pois “pode ser sido um disparo dos bandidos ou pedaço de reboco, estilhaço ou uma queda”. “As imagens das câmeras corporais, porém, nos dão certeza de que o menino não estava na linha de ação dos policiais”, afirmou, embora as imagens das câmeras não tenham sido disponibilizadas.

No boletim de ocorrência, o delegado Rogerio Zuim Uehara, do 89º DP (Jardim Taboão), não informou se viu as imagens nem consta pedido expresso. Consta apenas requisição de perícia e não houve apreensão de armas dos policiais envolvidos nem justificativa para não ter ocorrido as apreensões por parte da Polícia Civil.

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À Ponte, a Secretaria de Segurança Pública disse que “todas as circunstâncias do caso são investigadas por meio de inquérito policial, instaurado pelo 89° Distrito Policial (Jardim Taboão). As providências de Polícia Judiciária estão em andamento com depoimentos, requisições de laudos periciais, análise de imagens e expedição de ofícios, dentre outras medidas pertinentes. Os fatos também são apurados pela PM por meio de Inquérito Policial Militar (IPM).”

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