Vítima conta que comércio do irmão no Jardim Brasil pegou fogo na madrugada de Natal e ela foi pedir ajuda para a polícia, mas acabou agredida
Era madrugada de Natal, quando a vendedora ambulante Kelly Cristina dos Santos, 42 anos, foi pedir ajuda a uma base policial na Avenida Antenor Navarro, no Jardim Brasil, região da Vila Medeiros, zona norte de São Paulo. Em vez de auxílio, segundo Kelly, o policial deu um soco na boca dela.
Tudo aconteceu depois que o comércio do irmão dela, que fica no térreo de uma casa de dois andares onde vivem a irmã e a mãe dela, estava pegando fogo. Kelly mora também no local, mas em uma casa nos fundos do terreno. Mesmo com o auxílio de vizinhos estava difícil debelar o incêndio.
Isso porque no Jardim Brasil há anos existe racionamento de água de madrugada. “Quando dá umas 23h já não tem mais água, tem racionamento de água aqui no bairro. E para apagar fogo precisa de água. Aí tem um pessoal de uma tabacaria aqui do lado que até tentou ajudar, mas não estava dando certo”, conta Kelly à Ponte.
Um pouco antes de notarem o incêndio, a família estava reunida por causa da ceia de Natal. Uma amiga de Kelly que participava da celebração, em determinado momento, se despediu. Ao acompanhá-la até a porta da casa, sentiu um cheiro de queimado. “A impressão era de vela queimando, mas a gente não conseguiu de imediato identificar de onde vinha”, conta.
Kelly então foi para a casa dela e estava na sala com seu marido, quando o cunhado entrou gritando que o comércio estava pegando fogo. A base da PM fica a 200 metros do local onde estava acontecendo o incêndio. Desesperada, Kelly foi tentar com que os policiais chamassem o bombeiro. “Eu sabia que eles mesmos não iam resolver, mas de repente acelerar esse socorro”, continua. A vítima conta que os policiais que estavam na base não são os que sempre estão por lá e imagina que era algum esquema de plantão por causa das festas de fim de ano.
“Quando eu me aproximei, o PM logo disse: ‘quem é filha da puta?’. Aí eu falei: ‘ninguém. Eu não falei nada disso’. E comecei a tentar explicar que havia um incêndio, mas ele não quis ouvir e disse pra eu ir embora. Eu me neguei e voltei a pedir ajuda. Foi quando ele me deu um soco”, relatou.
Kelly afirma que, após a agressão, ficou nervosa e começou a discutir, mas destaca que, ainda assim, não houve justificativa para uma agressão daquela maneira. “Quando você procura a Polícia Militar, uma instituição que eu respeito, a gente quer proteção. E eu me deparei com uma pessoa desestruturada. O policial estava totalmente alterado, não estava em seu estado normal”, lamenta.
O policial que teria agredido Kelly foi identificado por testemunhas e no registro da ocorrência como PM Carlos Schuller. Nesta quinta-feira (26/12), Kelly Cristina foi até a Corregedoria da Polícia Militar para denunciar a conduta do policial. “Não acho que a polícia toda seja assim. Muito pelo contrário, tem muito policial bom, mas o que aconteceu não foi certo. Se eu tivesse xingado ele, tentado agredir, poderia me prender. Mas não me bater”, diz.
Na versão da Polícia Militar, Kelly estava alterada e acabou batendo a boca em uma quina da porta da base policial. De acordo com o TC (Termo Circunstanciado) registrado no 73º DP (Jaçanã), Kelly teria desacatado os policiais ao chegar no local. “A autora Kelly disse ‘esse bando de polícia filha da puta que não serve para nada’. Foi orientada que se retirasse pois aparentava estar embriagada e posteriormente retornou com um grupo de cinco pessoas e passou a tentar invadir o posto”, diz o registro oficial.
A ocorrência foi registrada como desacato, lesão corporal e resistência. “O processo é acompanhado pela Polícia Militar que apurará todos os fatos e responsabilizará os policiais militares, se for o caso”, diz trecho da nota enviada à Ponte. A SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo) enviou, por e-mail, nota de igual teor.