Pai de jovem baleado encontrou imagens no Facebook e, em meio aos comentários de “bandido bom é bandido morto”, desabafou: “não desejo essa dor para nenhum inimigo”
Os policiais militares Junio Galo de Camargo e Flavio Augusto Pena, ao lado dos GCMs (guardas civis municipais) Fernando Gonçalves Maya Perez e Helio Fernandes Gonçalves, de Cotia (Grande São Paulo), são investigados pela morte de dois rapazes, ambos de 20 anos, na madrugada de segunda-feira (27/05), na altura do km 20 da rodovia Raposo Tavares.
Os quatro estão sob investigação por parte do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), da Polícia Civil, e por parte da Corregedoria (órgão fiscalizador) da Polícia Militar por participação na morte de Guilherme Ferreira dos Santos e Lucas Francisco da Silva, ambos de 20 anos.
Camargo, Pena, Perez e Gonçalves, juntamente com outros policiais militares e guardas municipais de Cotia, que estiveram no local das mortes dos dois rapazes e ainda não foram identificados, também são investigados sob suspeita de colaborar para que imagens dos corpos de Santos e Silva, perfurados por tiros, fossem veiculadas em redes sociais e em grupos no WhatsApp.
Autoridades precisam entender o papel do Whatsapp na violência policial
Questionado pela Ponte Jornalismo sobre como fotos dos corpos de Santos e Silva, perfurados por tiros, foram veiculadas em redes sociais e em grupos de comunicação, o comandante-geral da Polícia Militar de São Paulo, coronel Nivaldo Cesar Restivo, não se manifestou. O questionamento foi o seguinte: “Como as fotos foram feitas se existiam PMs preservando a cena da ação dos PMs e de guardas civis de Cotia contra Lucas, Guilherme e dois amigos?”
Os guardas municipais e policiais militares afirmaram que Santos e Silva foram mortos em um tiroteio quando os dois, ao lado de dois jovens de 17 anos, tentaram resistir à prisão e atiraram contra os agentes das forças de segurança. Essa versão para a morte de Silva e Santos é a investigada pela Corregedoria da PM e pelo DHPP.
Segundo Camargo, Pena, Perez e Gonçalves, os quatro jovens estavam em um Voyage roubado. Eles teriam furado uma barreira policial na rodovia Raposo Tavares e, após serem perseguidos, perderam o controle do carro, bateram contra uma mureta de proteção da rodovia e desceram atirando contra os policiais militares e guardas municipais. Santos e Silva foram mortos com tiros na região do peito. Nenhum policial militar ou guarda municipal foi ferido no suposto confronto.
Ao lado do corpo de um dos rapazes mortos, caído distante cerca de 30 metros do Voyage batido, os policiais militares e os guardas municipais disseram ter encontrado a réplica de uma arma de fogo (pistola). Perto do corpo do outro jovem, a 10 metros do veículo, os agentes das forças de segurança afirmaram ter localizado um revólver calibre 38. No tambor da arma, pelo relato dos agentes, havia três cápsulas de munições deflagradas e duas intactas.
Os dois jovens de 17 anos que acompanhavam Santos e Silva conseguiram escapar dos tiros dos agentes das forças de segurança ao correr cerca de 400 metros por uma região de mata às margens da rodovia Raposo Tavares. Horas depois, eles foram localizados nos prontos-socorros dos hospitais Bandeirante e Geral de Cotia. Ambos estavam feridos por tiros. Um no ombro; o outro, no pé. Eles foram apreendidos e encaminhados para a Fundação Casa.
Quando fotos dos rapazes começaram a circular nas redes sociais e em grupos de WhatsApp, o pai de um dos jovens feridos na ação dos policiais militares e guardas municipais se deparou com a imagem e se manifestou na rede social Facebook, logo abaixo da imagem do corpo de um dos rapazes. Ele tentava, em vão, barrar as dezenas de comentários de frequentadores da página que exaltavam as mortes cometidos pelos militares e guardas e os comentários de “bandido bom é bandido morto”.
Por meio de nota oficial, emitida pela empresa terceirizada CDN Comunicação, o secretário da Segurança Pública da gestão de Geraldo Alckmin (PSDB), Mágino Alves Barbosa Filho, informou:
“A Corregedoria da Polícia Militar informa que instaurou Inquérito Policial Militar para apurar a conduta dos PMs, como é de praxe em ocorrências com mortes envolvendo agentes. A Corregedoria analisa imagens veiculadas em redes sociais, conforme citado pela reportagem. O caso também é investigado pela Polícia Civil para apurar a ocorrência de uma maneira geral”.
A Prefeitura de Cotia, responsável pela Guarda Civil Municipal, também se manifestou por meio de nota oficial, mas não atendeu ao pedido de entrevista com os guardas municipais Perez e Gonçalves.
Com a palavra, a Prefeitura de Cotia:
“Os três [sic] guardas citados que compunham a viatura de ROMU (Rondas Ostensivas Municipais) estavam fazendo patrulhamento no sentido leste da Rodovia – a aproximadamente três quilômetros do rodoanel – avistaram um bloqueio da Polícia Militar; o Sargento Camargo, da PM, prontamente solicitou apoio referente a um veículo produto de roubo que havia transposto o bloqueio, colocando em risco a vida dos policiais, evadindo-se sentido Rodoanel.
O motorista do carro efetuou uma manobra conhecida por Cavalo de Pau e bateu o veículo no guard-rail lateral. Os quatro indivíduos suspeitos desceram armados do carro, disparando contra as guarnições, tanto da Polícia Militar quanto da ROMU. Os tiros foram revidados perante a injusta agressão e dois assaltantes morreram no local. Os outros dois suspeitos foram socorridos.
Foi constatado que os mesmos quatro suspeitos estavam aterrorizando os moradores do bairro Jardim Suburbano, praticando roubo de veículos e assaltando usuários do transporte público nos pontos de ônibus da região, segundo depoimentos das vítimas.
Diante dos fatos citados acima, foram tomadas as devidas providências. A ocorrência teve início às 2 horas da manhã e término às 15 horas do mesmo dia”.