Ariel de Castro Alves compartilhou uma arte que retratava a ligação de maus policiais a grupos de extermínio em agosto de 2015, quando 32 pessoas foram mortas em chacinas na região de Osasco (SP)
O processo movido por policiais militares que se sentiram moralmente ofendidos por uma charge compartilhada no Facebook pessoal do advogado Ariel de Castro Alves, um dos candidatos à Ouvidoria da Polícia de São Paulo no ano passado, não teve sequer início e foi extinto sem julgamento do mérito. Em agosto de 2015, mês marcado pela matança que deixou 32 pessoas mortas na região de Osasco, Grande SP, após a morte de um PM e de um GCM (guarda civil metropolitano), Ariel publicou na sua rede social uma charge de 2012 que retratava a ligação de maus policiais a grupos de extermínio. A reação da corporação foi expor publicamente o advogado, com um print screen de seu perfil pessoal. A legenda da imagem, assinada pelo Centro de Comunicação Social, foi a seguinte: “É de se lamentar o fato de uma pessoa que se diz defensora dos direitos humanos generalizar toda uma classe de trabalhadores por conta de atos supostamente praticados por bandidos que integram temporariamente a Instituição”.
Após a exposição, o advogado, que é membro do Condeca (Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente) e coordenador do Movimento Nacional de Direitos Humanos em São Paulo, afirmou ter recebido mensagens intimidatórias. “Rapidamente minha página passou a receber dezenas de comentários, chegando quase a 200 comentários na própria postagem da charge ou em outras postagens. Algumas ameaçavam minha integridade, outras me ofendiam com xingamentos e outras me ameaçavam de processos e representações na OAB. A maioria dos autores das mensagens, pelos seus perfis no Facebook, possivelmente eram policiais militares”, afirmou à Ponte Jornalismo.
À época dos fatos, o ouvidor da Polícia de São Paulo, Julio Cesar Neves, afirmou que a nota divulgada pela PM era arriscada, porque poderia deixar Ariel vulnerável. “A Polícia Militar do Estado de São Paulo tem o direito de se expressar, mas a nota divulgada é arriscada. Porque é uma indução ao erro por parte de outras pessoas”, disse à Ponte. “É claro que o Ariel não teve intenção de promover ofensas. Isso daí tem que ficar claro para o comando da PM. Eu acredito que, se a Polícia Militar se sentiu ofendida, tinha que ter processado aquele suposto autor da charge por crime contra honra. Não divulgar uma nota que pode induzir pessoas ao erro”, complementou.
Representados pela advogada Erika Bergamo, os policiais que entraram com a ação civil por danos morais são Sergio Marques (capitão da Comunicação Social da PM), Maria da Penha Ramos Dutra dos Santos, Ana Paula Benevenuto Queiroz, Amanda Hatsume Sato Sabbatini, Carlos Eduardo Banhos Ignacio, Davi de Carvalho Freixo, Emerson Massera Ribeiro, Georgia A. Públio Mendes, Luciano Piva e Maria Aparecida de Carvalho. A juíza Daniela Pazzeto Meneghine Conceição foi a responsável pela extinção do processo sem o julgamento do mérito, que é quando o juiz põe fim à relação processual sem dar uma resposta, positiva ou negativa, ao pedido do autor.
“Teor do ato: Ante o exposto, JULGO EXTINTO o processo, sem exame do mérito, com fundamento no artigo 267, inciso IV (pressuposto processual) do Código de Processo Civil. Não há condenação em honorários advocatícios. Arquivem-se os autos, com as cautelas de rigor”, escreveu a juíza Daniela Pazzeto Meneghine Conceição. “Dos autos, verifica-se que a charge divulgada pelos réus não faz alusão direta a nenhum dos autores, vez que não especifica nomes e tampouco aponta claramente quais são os policiais militares criticados pela referida charge. Verifica-se ainda, que a publicação da charge não tem como objetivo atingir a imagem dos requerentes, haja vista que, conforme alegaram, ‘exercem suas funções pautados na legalidade e legitimidade’, não sofrendo assim, qualquer espécie de dano, bastando para tanto cumprir a obrigação para a qual foram investidos pelo Estado”, determinou.
Ariel relembrou que a charge não é de sua autoria e que não teve a intenção de ofender a corporação e seus membros. “Apenas protestar com relação ao caso específico da chacina de Osasco, no qual as investigações policiais demonstraram o envolvimento de alguns maus policiais nos assassinatos. A reação à minha postagem no Facebook ocorreu pelo excesso de corporativismo de setores da PM! Todo dia posto charges de políticos e outras charges com sátiras referentes as mazelas brasileiras e nunca ocorreu esse tipo de reacção”, disse. “Atuo há 20 anos na área de direitos humanos, principalmente da defesa dos direitos de crianças e jovens. Já fui alvo de outras tentativas de intimidações e perseguições, inclusive de dois inquéritos que foram arquivados pela Polícia Civil e pelo Ministério Público. Nunca tinha sido alvo de ação de indenização por danos morais, como neste caso. Isso não me intimida! Vou continuar defendendo as causas que eu acredito, sempre com responsabilidade”, complementou.
Procurada, a Polícia Militar se limitou a afirmar: “Para o melhor atendimento, queira nos informar de qual emissora vc pertence.”