Policiais civis da 1ª Seccional são acusados de extorquir lojistas no centro de SP

    Investigação da Corregedoria da Polícia Civil e do MP confirmou a participação de ao menos seis policiais, um deles o investigador Antônio Carlos de Araújo, irmão de ex-policial que sequestrou enteado de Marcola

    Policiais atuavam na 1ª Seccional e no 3º DP, que ficam no mesmo prédio no centro de São Paulo | Foto: Reprodução/Google Street View

    A Corregedoria da Polícia Civil e o MP (Ministério Público) Estadual de São Paulo investigam ao menos seis policiais civis acusados de extorquir, desde 2016, donos de lojas em um shopping no Pari, região do Brás, zona leste de São Paulo, e comerciantes da rua Santa Ifigênia, na zona central da capital. Um deles, o investigador Antônio Carlos de Araújo, foi detido e teve a prisão preventiva decretada pela juíza Isaura Cristina Barreira, da Vara de Plantão do Fórum Criminal da Barra Funda.

    O policial é irmão de José Roberto de Araújo, expulso da Polícia Civil e condenado a 22 anos de prisão pelo sequestro, em 2005, de Rodrigo Olivatto Moraes, enteado de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, apontado como líder máximo do PCC (Primeiro Comando da Capital). Segundo a Corregedoria da Polícia Civil, Araújo atuava com o ex-policial civil Eduardo José Caprio e com o informante Luciano Novaes Mendonça.

    Caprio era investigador e acabou expulso da Polícia Civil e condenado a sete anos, nove meses e 10 dias de prisão em 18 de setembro de 2012 pelo mesmo crime de extorsão. Mendonça e Caprio também tiveram a prisão preventiva decretada. O primeiro foi preso. O segundo, no entanto, encontra-se foragido.

    A Corregedoria chegou aos três acusados após receber e investigar uma denúncia feita pelo vendedor Diego Mathias Nunes, de 29 anos, funcionário de uma loja do chinês Paul Chen, localizada no shopping Vautier, no Pari. Em depoimento, Nunes contou que trabalha há oito anos na loja do chinês, onde são comercializados produtos eletrônicos.

    Ele disse que quando começou a trabalhar na loja conheceu Araújo, que se identificava como policial civil.
    Segundo Nunes, Araújo nunca dizia em qual unidade era lotado, mas várias vezes viu o investigador ostentando distintivo da Polícia Civil no pescoço e portando pistola.

    Nunes acrescentou que já presenciou Araújo chegando ao shopping Vautier em uma Blazer da Polícia Civil.
    O depoente afirmou ainda que Araújo passava mensalmente na loja e pegava entre R$ 50,00 e R$ 100,00 de comerciantes. O shopping tem 15 mil lojas.

    Porém, no dia 24 de agosto de 2018, outros dois homens apareceram para pegar o dinheiro e exigiram R$ 500,00. Ambos, ainda segundo Nunes, alegaram que eram da 1ª Delegacia Seccional (Centro). O patrão do vendedor estava viajando e ele se recusou em dar o dinheiro aos dois homens.

    Nunes revelou que um deles, que se identificava como Luiz, ligou para Araújo e contou que o vendedor não havia dado a quantia exigida. Na versão de Nunes, Araújo então aconselhou os dois comparsas a esperar o retorno do chinês. Entretanto, ambos foram nas outras lojas e recolheram dinheiro dos comerciantes.

    A Corregedoria apurou que o homem que se apresentava como Luiz, na realidade, é Luciano Novaes Mendonça e o acompanhante dele, o ex-policial Eduardo José Caprio. Os três acusados foram reconhecidos através de fotografias por Nunes. A Corregedoria fez diligências no shopping e teve acesso a imagens de circuitos de câmeras de segurança. Araújo, Mendonça e Caprio foram identificados nas gravações.

    Mendonça já era investigado desde novembro de 2016 em outro procedimento instaurado pelo GECEP (Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial) do Ministério Público. Ele e outros cinco policiais à época lotados na 1ª Delegacia Seccional (Centro) e no 3º Distrito Policial (Campos Elíseos) foram acusados de cobrar propina de comerciantes da rua Santa Ifigênia para permitir a comercialização de produtos piratas.

    O GECEP realizou diligências durante dois anos e, com autorização judicial, interceptou o telefone celular de Mendonça. Foram realizados 11 períodos de grampos telefônicos e as interceptações flagraram Mendonça conversando com policiais civis, falando sobre valores de propinas e até sobre seus dados bancários e seus investimentos.

    O procedimento instaurado pelo GECEP transcorreu em segredo de justiça. O processo investigado pela Corregedoria da Polícia Civil também corre sob sigilo judicial.

    O relatório final do GECEP, com data de 25 de outubro de 2018, traz a seguinte observação: “As interceptações telefônicas realizadas possibilitaram a colheita de indícios robustos de existência da organização criminosa integrada por policiais civis do 3º DP e da 1ª Seccional com vistas à prática de crimes graves em detrimento de comerciantes da rua Santa Ifigênia, como extorsão, prevaricação, entre outros”.

    No depoimento à Corregedoria, prestado em 18 de dezembro do ano passado, Mendonça negou ter cometido qualquer tipo de extorsão. Ele afirmou que não tem nenhum vínculo com o investigador Araújo e que conhece o ex-policial Caprio há quatro anos. Araújo depôs em 20 de dezembro e também declarou-se inocente. Ele disse que “está abismado com as acusações”. Acrescentou que não conhece o Shopping Vautier nem ninguém de lá. Afirmou ainda que nunca ouviu falar de Eduardo Caprio.

    Araújo contou na Corregedoria que até julho do ano passado trabalhava na 1ª Delegacia Seccional (Centro) e depois foi transferido para o DPPC (Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania). Indago sobre o seu irmão José Roberto de Araújo, o sequestrador do enteado de Marcola, o investigador disse que ele está no Interior do Estado.

    Procurados pela Ponte, GECEP e Corregedoria da Polícia Civil não quiseram falar sobre os casos porque as investigações estão em segredo de justiça.

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