De acordo com coordenadora de movimento, dupla de agentes usou alicate para abrir portão de prédio na Avenida Prestes Maia; Ouvidoria das Polícias solicitou apuração do caso
Durante a manhã desta quarta-feira (15/12), Isabela da Cunha, uma das coordenadoras da FLM (Frente de Luta por Moradia), disse que recebeu ligações desesperadas de moradores de uma ocupação na Avenida Prestes Maia, altura do número 913, onde até 2017 funcionou uma unidade do CAT (Centro de Apoio ao Trabalho) da Prefeitura, no centro da cidade de São Paulo. “Uma senhora viu dois policiais com alicate na mão abrindo a porta e ela não conseguiu segurar”, denunciou.
De acordo com ela, estavam quatro policiais civis em duas viaturas, sendo que uma dupla entrou e passou a questionar os moradores sobre a ocupação e a outra ficou do lado de fora. “Ocupamos no dia 26 do mês passado e eles ficaram perguntando se tinha gente do movimento que recebia dinheiro, se eles sabiam de quem era o prédio, gravaram o prédio”, prosseguiu. Quando chegou ao local, Isabela viu os quatro, sem identificação. “Um disse que iam verificar uma denúncia anônima de roubo de celular e entraram sem mandado”, afirma. “Depois, um outro falou que era denúncia de roubo de carga, mas saíram sem nada”.
“Quando saíram, conversaram entre si e ficaram apontando para mim e eu perguntei o que estava acontecendo”, disse. Em seguida, um dos policiais teria dito que retornaria com um mandado de busca e apreensão. “Ele disse ‘não é para você entender nada porque você está ocupando prédio particular e, se a gente achar alguma coisa, vocês vão sair”. Um dos moradores fez um registro das viaturas do lado de fora do prédio, de longe, em que não é possível identificar nem placa nem inscrição. “Na hora, ficamos muito nervosos e com medo de gravar”, declarou a coordenadora.
De acordo com Isabela, os proprietários, que seriam irmãos, já apareceram no local antes para tentar a desocupação à força. “Vieram com polícia, mas como não tem mandado, eles mesmos [policiais] diziam que não poderiam entrar”. Até o momento, disseram que não foram notificados sobre ordem de despejo e que o imóvel abriga 68 famílias. “Um dos proprietários disse que tinha contato na polícia para tirar a gente”, disse Isabela.
À Ponte, o assessor da Ouvidoria das Polícias Victor Grampa informou que foi ao prédio, mas quando chegou ao local os policiais já haviam saído. “A Corregedoria da Policia Civil foi oficiada, indicando o ocorrido, com as fotos encaminhadas para a Ouvidoria, requerendo a devida apuração”, informou.
“Ação completamente ilegal, não pode invadir casa sem um mandado judicial”, completou o advogado Benedito Roberto Barbosa, do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos.
A reportagem tentou contato com um telefone de celular que aparece fixado na fachada do local com uma placa de “vende ou aluga”, mas não teve retorno. Desde 2018, consta pelo Google Street View o mesmo número na fachada. Em busca pela plataforma GeoSampa, da Prefeitura, em que é possível pesquisar os lotes na cidade, o imóvel, que se estende até a altura do número 919, consta como de propriedade da empresa MD Mendes Administração de Bens Próprios Ltda., denominação que mudou para DDM Empreendimentos Imobiliários Ltda. no ano passado, conforme consulta na junta comercial cuja movimentação descreve o prédio como propriedade.
Não encontramos ação de reintegração de posse movida nem pela empresa nem pelos sócios. Tentamos contato com o telefone disponível na Receita Federal, que é de um escritório de contabilidade, mas não houve resposta.
O que diz a polícia
A Ponte procurou a Secretaria da Segurança Pública e questionou sobre a ação dos policiais civis. A In Press, assessoria terceirizada da pasta, encaminhou a seguinte nota:
Policiais civis do Deic estavam na avenida Prestes Maia, na tarde de hoje (15/12), quando foram acionados por um idoso, que afirmou ter sido ameaçado por um desconhecido com uma arma de fogo. O suspeito teria entrado em um prédio. Os policiais seguiram para o imóvel indicado e realizaram buscas, porém não localizaram o autor das ameaças. A vítima foi orientada a comparecer na unidade policial para registrar os fatos.
Reportagem atualizada às 10h07, de 16/12/2021, após inclusão de resposta da SSP.
