Motoboy diz que tomou tapas e chute ao ser preso por suspeita de ter estuprado adolescente, que depois negou o crime. Condepe acompanha o caso
Um motoboy de 23 anos alega ter sido espancado por um policial militar antes de ser preso em flagrante sob a suspeita de ter estuprado uma estudante de 16 anos, em Itapeva (290 km de São Paulo), em 16/7. A adolescente negou posteriormente as acusações feitas contra o rapaz e foi aberto um inquérito na Polícia Civil para investigar o caso, que é acompanhado também pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe).
O motoboy conta que tomou tapas no rosto e levou um chute na barriga, depois de ser obrigado a se ajoelhar e confessar que teria estuprado a adolescente em meio a um matagal, ao lado da rodovia Luiz Sguario. Ele negou ter cometido o crime, mas foi levado à Delegacia de Defesa da Mulher, onde acabou preso em flagrante pela delegada de plantão. No dia, a estudante afirmou em depoimento que tinha sido ameaçada e obrigada a subir na moto quando voltava da escola, sendo obrigada a ir até o matagal com o rapaz.
Os PMs afirmaram que estavam em patrulhamento pela área quando ouviram um barulho vindo do meio do mato e foram ver o que estava acontecendo. Segundo os policiais, o rapaz saiu em “atitude suspeita”, seguido da adolescente. Uma oficial da PM contou que, após alguns minutos, a suposta vítima teria afirmado que o autor praticou atos libidinosos com ela, sempre sob ameaça.
Dois dias após a prisão do motoboy, a estudante foi até a delegacia acompanhada da mãe e afirmou ter trocado mensagens com o suspeito pelo Whatsapp, combinando o encontro. Ela disse também que subiu na moto por vontade própria e que ele não a obrigou a fazer nada durante o tempo em que ficaram juntos. O exame de corpo delito apontou que não houve relação sexual entre os dois.
O delegado que instaurou o inquérito no dia 29 para investigar a denúncia estava cobrindo férias e deixou o caso com o titular do 4º DP de Itapeva.
O pai do motoboy, um motorista de 58 anos, afirma que está indignado com tudo o que aconteceu. “Eu quero justiça, e rápido. Só vou ficar tranquilo quando ver esses policiais fora da farda”, diz. Ele fala que fez denúncias à Corregedoria da PM e à Ouvidoria das Polícias sobre o caso e que temeu que o filho sofresse algum tipo de violência durante os dois dias em que permaneceu preso.
Acompanhamento
Ao instaurar o inquérito para apurar a acusação de tortura, o delegado notificou também o Condepe, que acompanha o caso. “Primeiro, não se trata meramente de um desvio de conduta. Parece mais uma ação padronizada de ordens dadas pelo comando. Todo problema tem sido as orientações para abordagem”, diz o presidente do conselho, Rildo Marques de Oliveira.
O presidente do Condepe critica também a forma como foi feito o flagrante. “O que vemos é um estado militar onde o acusado não tem direito à defesa e o inquérito é feito de forma rasa, sem preocupação de obter provas contundentes”, afirma.
O relator da comissão de violência e letalidade policial do conselho, Luiz Carlos dos Santos, deve ir até Itapeva ainda nesta semana.
Outro lado
A Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo afirmou, em nota, que o delegado José Carlos Bertolucci ouviu os envolvidos na ocorrência e, até o momento, “não surgiram elementos que confirmem a tortura alegada”. “Ainda serão realizadas algumas diligências para a conclusão da investigação”, diz a nota da SSP.
Segundo a secretaria, a Polícia Militar também instaurou inquérito para apurar todos os fatos e circunstâncias relatados. “Entretanto, informa a PM, verificou-se que não há registro de lesões corporais no laudo de exame de corpo de delito, ao qual o denunciante foi submetido no IML [Instituto Médico Legal]”, afirma em nota.
O inquérito informa que, no momento da prisão, o motoboy preferiu permanecer calado e se manifestar apenas em juízo.
A SSP diz que, ao contrário do que afirma o presidente do Condepe, todas as providências foram tomadas para elucidar o caso. “Nem a secretaria nem as polícias têm compromisso com eventuais erros e desvios cometidos por seus policiais”.