Presos do PR ficaram sem cobertores no frio de menos de 10 °C, denunciam famílias

Diretor da Penitenciária Central do Estado II teria recolhido mantas enviadas por parentes sob alegação de padronização. Para Frente pelo Desencarceramento, o que ocorreu foi tortura

Penitenciária Central do Estado II | Foto: Deppen/Reprodução

Presos da Penitenciária Central do Estado II – Unidade de Segurança, em Piraquara, no Paraná, enfrentaram sem cobertores as temperaturas de menos de 10 °C do mês de junho, segundo denúncias de familiares. Todos os cobertores da unidade foram recolhidos a mando do diretor, Olival Monteiro, sob alegação de padronização. Para a Frente Estadual pelo Desencarceramento do Paraná, entidade que luta contra as prisões em massa, o que houve foi tortura.

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Parentes de presos contaram à Ponte que a violência contra os detentos se intensificou a partir de maio, quando Olival Monteiro assumir a direção da Penitenciária. Ele já havia sido acusado de violar direitos de presos por grupos de direitos humanos no ano passado, quando dirigia a Casa de Custódia de São José dos Pinhais.

O envio de cobertores e de itens de vestiário — lençol, calça, blusa, camiseta, bermuda, chinelo — nas unidades prisionais por meio de visitas foi proibido em 23 de maio, quando o Departamento Penitenciário do Paraná (Deppen) do governo Ratinho Júnior (PSD) publicou uma portaria, a 005/2024, informando que passaria a fornecer todos eles. O problema é que, segundo familiares disseram à Ponte, a direção da Penitenciária Central retirou os cobertores que já estavam com os prisioneiros.

A mãe de um detento, que pediu para não ser identificada, diz que as mantas fornecidas pela unidade só passaram a ser entregues em julho. “Os presos ficaram quase dois meses no frio”, diz. 

Frio como tortura

Um abaixo-assinado feito por familiares, critica a qualidade dessas mantas (leia o texto). Segundo o documento, elas são finas, não esquentam e feitas com material que dá alergia.

Outra familiar afirma que os uniformes também foram retirados. Cada preso, segundo ela, ficou apenas com um conjunto. “Quando visitei meu familiar, ele só tinha a roupa do corpo”, fala.

Ela conta que os parentes não podem mais mandar qualquer roupa de frio. Meias e cuecas acabam retidas na portaria, mesmo sendo brancas, como exigem as regras do Departamento Penitenciário.

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A familiar fala que só conseguiu enviar um cobertor para o parente no dia 17 de julho, 12 dias após o Deppen atualizar a portaria 005/2024 e passar a permitir o envio de uma manta de solteiro na cor cinza, a cada quatro meses. Contudo, a entrega deste item não contempla todos os presos, já que algumas sacolas com coberturas continuam a ser retidas, conta.

Um ofício elaborado pelos ativistas da Frente pelo Desencarceramento descreveu situações em que o frio foi usado como tortura. Segundo o documento, os presos estão sendo impedidos de ir para a visita usando blusas e meias. Mesmo em dias de temperaturas baixas, nos banhos de sol, os trajes eram shorts e camisetas. “Essas práticas não possuem nenhum fundamento e se caracterizam apenas como tortura”, escreveu o documento da Frente (leia a íntegra).

Histórico de denúncias

A denúncia da Frente aponta que as violações aumentaram desde a nomeação de Olival Monteiro, que já havia sido denunciado quando comandava a Casa de Custódia de São José dos Pinhais. Em março de 2023, o Brasil de Fato reportou casos de violações físicas, negligência médica e fome denunciados pela Frente naquela unidade.

Os presos contaram aos familiares que a comida vinha azeda e em baixa quantidade. Água e luz eram reguladas. Agentes do Setor de Operações Especiais (SOE) teriam feito ações truculentas nas celas com uso de spray de pimenta.

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O cenário é semelhante ao denunciado na Penitenciária Central. Um exemplo é que as roupas fornecidas aos presos pela direção da unidade têm furos, são finas e muitas vezes não cabem nos presos, segundo relatou à Ponte uma familiar. Comida estragada, em baixa quantidade, e a demora no atendimento médico também foram relatados. 

Agressões contra os presos também são relatadas no abaixo-assinado feito por parentes. Muitos presos temem serem espancados, já que a violência é constante. “As famílias sofrem com seus entes queridos presos”, completa o texto.

Omissão

No dia 23, a Frente enviou mais um ofício às autoridades ligadas ao sistema penitenciário do Paraná. Desta vez, o assunto era a hospitalização de um preso da unidade. No dia 19 deste mês, a mãe foi impedida de visitar o filho.

A Ponte conversou com uma familiar do preso. Ela diz que a tia foi informada ao tentar visitá-lo de que ele não estava lá. Tinha sido levado ao médico. Contudo, não foi dito em qual unidade e o que havia acontecido. A família tentou informações com a assistência social da unidade, sem sucesso. 

Na segunda-feira (22/7), o Hospital Universitário Cajuru entrou em contato. O preso estava na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e já tinha passado por cirurgia na cabeça. Com ajuda da Defensoria Pública do Estado do Paraná, a mãe conseguiu autorização para ver o filho internado.

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A família ainda não sabe o que aconteceu. Parentes que visitaram a penitenciária relataram que ele caiu após tomar remédios. “Até agora não tivemos notícia nenhuma da Penitenciária ou da assistência social explicando o porquê dele estar internado”, diz a familiar.

O que dizem as autoridades

A Ponte procurou o Departamento Penitenciário do Paraná (Deppen) solicitando uma posição sobre as denúncias. Também foi requerida entrevista com um porta-voz e com o diretor da Penitenciária. Até agora, não teve resposta.

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