Quando a realidade parece ficção: os roubos cinematográficos dos chefões do PCC

    Ações ousadas e violentas, com metralhadoras, granadas e carros importados: assim os membros da facção criminosa paulista realizaram assaltos a bancos e aeroportos nos anos de 1999 e 2000; um deles foi inspiração para minissérie da TV Globo

    Acima, imagem de 6 de outubro de 2000, reproduzida pela TV Globo, mostra os criminosos chegando na pista do Aeroporto Internacional de Brasília, de onde levaram 61kg de ouro; abaixo, Cego, Tiriça e Tico-Preto

    Os roubos mais cinematográficos registrados no país, dignos de roteiros da Netlix, como La Casa de Papel, foram protagonizados nas décadas passadas pelos chefões do PCC (Primeiro Comando da Capital), hoje recolhidos em presídios federais.

    Foram ações ousadas e violentas, nas quais os criminosos desafiaram as forças de segurança, utilizando explosivos, granadas, fuzis, metralhadoras, pistolas, revólveres, coletes à prova de bala e carros importados.

    Um dos roubos mais espetaculares aconteceu em 6 de julho de 2000, no coração da Capital Federal. O alvo escolhido foi o Aeroporto Internacional de Brasília.

    A quadrilha comandada por Daniel Vinícius Canônico, o Cego, Roberto Soriano, o Tiriça, e Airton Ferreira da Silva, o Tico Preto, roubou 61 kg de ouro de um avião da Vasp no pátio do aeroporto. O caso virou inspiração para a minissérie “A Teia”, que passou na TV Globo há cinco anos.

    Esses três presos, segundo o Ministério Público de São Paulo, fazem parte da alta cúpula do PCC. Eles contaram com a ajuda de outros integrantes da facção e com informações privilegiadas de um funcionário da Infraero.

    Cego, Tiriça e Tico Preto estudaram a rotina dos seguranças e de outros trabalhadores do aeroporto. Os criminosos chegaram inclusive a filmar as vítimas durante o expediente.

    Uma parte do bando conseguiu entrar no aeroporto utilizando uniformes da Infraero. Outro grupo se disfarçou de funcionários dos Correios. Carros roubados e importados foram usados na ação para garantir a fuga.

    Os criminosos não tiveram dificuldade para chegar até a aeronave. Foram logo atirando e renderam funcionários. Havia passageiros e um dos disparos quase atingiu o tanque de combustível do avião da Vasp.

    O bando fugiu levando o ouro, mas acabou capturado dias depois. Cego foi condenado a 14 anos e dois meses; Soriano a 10 anos e seis meses; e Tico Preto a 16 anos e dois meses.

    Edson do Nascimento, sobrinho de Tico Preto, recebeu uma pena de 15 anos. Evermodo Xavier de Souza, funcionário da Infraero, foi condenado a 14 anos em primeira instância pela Justiça Federal.

     Cego não ficou preso muito tempo. Escapou da cadeia e, dois meses depois, em 28 de setembro de 2000, foi detido em São Paulo por porte de arma.

    Três meses antes, em junho, ele era investigado por participação no roubo a outro avião, dessa vez um Sêneca, no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, de onde ladrões roubaram R$ 3 milhões.

    Os assaltantes, armados de fuzis, pularam na frente do avião na cabeceira da pista. O dinheiro roubado era do Banco do Brasil e tinha sido colocado na aeronave, em malotes, por seguranças do carro-forte da Protege.

    Tico Preto e o sobrinho Edson também não ficaram longo tempo atrás das grades. Quatro meses depois do roubo ao avião da Vasp, em Brasília, eles coordenaram outro assalto cinematográfico.

    Em 8 de novembro de 2000, os assaltantes invadiram uma chácara e renderam sete pessoas da mesma família na região de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo.

    A chácara seria usada como a base de operação da quadrilha, para que o plano dos assaltantes pudesse ser colocado em prática.

    Segundo o Ministério Público Estadual de São Paulo, outro chefão do PCC, Cláudio Barbará da Silva, atualmente recolhido em presídio federal, também participou da ação.

    Na madrugada seguinte, em 9 de novembro de 2000, a quadrilha sequestrou o gerente da Caixa Econômica Federal, Cirus Marques Moura. A mulher dele, Chirley Maquilaine de Souza, também foi feita refém.

    O casal foi levado para a chácara, usada como cativeiro. Por volta das 6h40 daquele dia, os criminosos renderam Fernando Guardieiro Cândido, vigia da agência bancária, que estava a caminho do trabalho.

    Às 7h, os ladrões se dirigiram à agência, levando o gerente e o vigia, e esperaram a chegada dos funcionários. Uma tesoureira, um avaliador de penhores e outro gerente foram dominados. 

    Os funcionários tinham o segredo dos cofres e foram obrigados a abri-los, caso contrário, a mulher de Cirus e os demais reféns seriam executados.

    Os ladrões roubaram R$ 90 mil em dinheiro e 26 lotes de joias penhoradas, avaliadas em R$ 3.534.832,60. O bando fugiu em seguida, mas acabou perseguido por policiais militares.

    Houve troca de tiros e o soldado José Roberto Serafim, da Polícia Militar, foi baleado e não resistiu. Parte dos criminosos se refugiou na Mata Santa Teresa e acabou presa.

    Tico Preto foi condenado a 63 anos e seu sobrinho Edson, a 50 anos. Luís Carlos Bento Tavares pegou uma pena de 50 anos.

    No prontuário de Barbará, consta que que ele foi condenado a 54 anos pela participação no crime. No ano anterior, ele havia realizado outro crime, usando o mesmo modus operandi.

    Em 21 de janeiro de 1999, Barbará e seu inseparável parceiro de crime, Lourinaldo Gomes Flor, o “Velho Lori”, junto com outros assaltantes, sequestraram o gerente-geral  do Banco do Brasil, em Ribeirão Preto.

    Velho Lori | Foto: reprodução

    Dois colegas de trabalho do gerente também foram rendidos e levados com ele para uma chácara.

    Ao amanhecer do dia seguinte, os ladrões foram a agência e obrigaram os funcionários a abrir os cofres. Foram roubados R$ 10.126.000,00.

    A Justiça condenou Barbará a uma pena de 73 anos em regime fechado pelo assalto ao banco e pelos sequestros das vítimas. A pena de Lori totalizou 27 anos e oito meses.

    “Velho Lori”  é um dos integrantes mais antigos do PCC e um dos mais “respeitados” pela cúpula da maior facção criminosa do Brasil.

    A matrícula dele no sistema prisional, de número 38.824, também é uma das mais antigas. O número de matriculados hoje no sistema prisional paulista passa da casa de um milhão.

    “Vellho Lori”, atualmente recolhido em presídio federal,  é apontado pelos líderes do PCC como o “mestre” e “pioneiro” dos grandes roubos a agências bancárias.

     Em 13 de abril de 2000, ele comandou um assalto de repercussão nacional, contra uma agência da Caixa Econômica Federal de Cuiabá, no Mato Grosso.

    Foi mais uma ação ousada coordenada por Lori. O endereço da agência era na avenida do CPA, em frente ao antigo prédio da sede Polícia Federal em Cuiabá.

    Lori e os parceiros José Reinaldo Girotti, o Girotinho, outro integrante do PCC, e Marcelo Pires, levaram 500 kg em joias da agência, avaliadas à época em R$ 5 milhões. Os ladrões foram condenados a 10 anos.

    Cuiabá foi palco de outra ação cinematográfica. O crime aconteceu em abril de 1999, em uma agência do Banco do Brasil, no centro da capital do Mato Grosso.

    Marcola também participou de um dos conhecidos assaltos cinematográficos planejados pela facção no início dos anos 2000 | Foto: reprodução

    O mentor do assalto foi um velho conhecido da polícia paulista: Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, matrícula 45.465, apontado pelo Ministério Público Estadual como o líder máximo do PCC.

    Marcola roubou R$ 6 milhões da agência, porém, acabou preso. Só que não chegou a esquentar sua cela na Cadeia de Carumbé. Fugiu da prisão pela porta da frente.

    Todos os chefões do PCC recolhidos em presídios federais têm longas condenações a cumprir. A pena total de Marcola soma 330 anos. A de Tico Preto chega a 126 anos; Barbará a 125 anos; Lori a 118 anos, Cego a 99 anos e Soriano a 65 anos.

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