Detido na grande manifestação de 2013 no Rio de Janeiro, ele cumpria a pena em regime aberto desde 1º de dezembro de 2015. Defesa alega que flagrante foi forjado
Em audiência de custódia realizada ao final da tarde desta quarta-feira, 13/01, no Rio de Janeiro, foi decidido que o ex-catador de latas Rafael Braga Vieira, 27 anos, tivesse sua prisão em flagrante delito convertida em prisão cautelar. Segundo o advogado Lucas Sada, a decisão havia sido tomada já durante o plantão judiciário que antecedeu a audiência, e a despeito das evidências da inocência do indiciado, apresentadas pelos advogados que atuam em sua defesa, o juiz Marcelo Oliveira da Silva optou por manter a decisão.
Preso na grande manifestação de 2013 na capital fluminense, desde 1º de dezembro Rafael cumpria sua pena em regime aberto e usando uma tornozeleira eletrônica. Porém, na terça-feira (12/01) foi preso por policiais militares da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) da Penha, na Zona Norte do Rio de Janeiro, onde vive com sua família. Ele se dirigia a uma padaria, por volta das nove horas da manhã, quando cinco PMs o abordaram com violência na rua conhecida como “Sem Terra”, na comunidade Vila Cruzeiro.
Ouvido na audiência, Rafael manteve integralmente a versão apresentada à 22ª Delegacia de Polícia (Penha), na terça-feira, 12/01, quando, após ser vítima de um novo flagrante forjado, foi autuado por tráfico de drogas, associação para o tráfico e colaboração com o tráfico, depois de ser abordado violentamente por policiais militares da UPP da Penha, que o torturaram, ameaçaram de estupro e de “jogar arma e droga na conta”, como denunciou a Ponte Jornalismo.
Nulidade do flagrante
“Nós apresentamos uma série de argumentos defensivos, tanto relativos à nulidade do flagrante, à ilegalidade material do flagrante, pelo fato de ter sido forjado e pelo fato de ele [Rafael] ter sofrido violência física e psicológica, quanto pela capitulação equivocada, porque sequer é possível se imputar, concomitantemente, colaboração e associação, posto que colaboração é uma espécie de associação de menor importância”, explica Sada, em entrevista à Ponte.
A defesa também argumentou com base na “desnecessidade da prisão do Rafael”, segundo o advogado, uma vez que a reincidência de Rafael não tem relação alguma com a prática de tráfico e que ele encontrava monitorado pela tornozeleira eletrônica desde que passou a cumprir sua pena em regime aberto, em dezembro. Além disso, ele possui residência fixa, na região em que foi abordado, e uma ocupação lícita – trabalha no Escritório de Advocacia João Tancredo, no Centro do Rio de Janeiro. “Ademais, não há nenhuma gravidade concreta na infração a ele imputada que produzisse abalo na ordem pública”, pontuou Sada.
Apesar das evidências e da fragilidade da versão apresentada pelos policiais, os argumentos defendidos pelos advogados do Instituto de Defensores Humanos (DDH), que atuam em defesa de Rafael desde 2013, quando Rafael foi preso injustamente acusado de supostamente portar material explosivo, não foram acatados pelo juiz, que considerou a legalidade integral do flagrante e decidiu pela necessidade de manutenção da prisão. “É uma decisão protocolar, tomada numa audiência de custódia, num juízo de cognição sumária, com a qual nós não concordamos e da qual divergimos frontalmente”, defende Sada.
Para tomar tal decisão, o juiz levou em consideração a reincidência de Rafael e argumentos como o de que “o indiciado tem a personalidade voltada para a prática delitiva”, conforme consta no documento da audiência de custódia que teve início por volta das 17h desta quarta-feira, 13/01. “A prisão cautelar deve ser fixada para garantia da ordem pública ao contrário da manifestação da defesa, já que esta está atrelada diretamente à plausibilidade do indiciado voltar a delinquir”, de acordo com o mesmo.
Próximos passos
Após distribuição do flagrante do Rafael para uma das varas criminais da comarca da capital, onde a causa será processada e julgada, a defesa protocolará um pedido de liberdade provisória, para que Rafael possa responder ao processo em liberdade, além de insistir pela nulidade do flagrante.
Trata-se de mais um processo de criminalização “deflagrado por uma ação ilegal da polícia, que se baseou no estereótipo criminal que o Rafael ostenta, sendo negro, pobre, jovem, homem, em local de periferia, e ainda com o agravante da tornozeleira eletrônica”, segundo Sada. “Uma vez que o sujeito ingressa no sistema penal, a chance de ele ser novamente criminalizado, novamente apanhado pelo sistema, é maior. É uma fábrica de produzir crimes e criminosos”, enfatiza o advogado.