Em ação no STF, procuradora-geral da República define decreto como ilegal por invadir competência do legislativo e aponta que ele afronta a dignidade humana
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, quer que o STF (Supremo Tribunal Federal) suspenda o decreto presidencial que extinguiu 11 cargos de peritos do MNPCT (Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), responsável por investigar violações de direitos humanos em locais de privação de liberdade, como penitenciárias, hospitais psiquiátricos e abrigos de idosos. Com a decisão, o presidente Jair Bolsonaro jogou o trabalho do órgão para o voluntarismo, inviabilizando a sua continuidade.
O decreto assinado em junho deste ano alterou a lei 12.847 de 2013, que criou o Mecanismo de Combate à Tortura e, por isso, a PGR aponta que o ato é ilegal: porque invade a competência do legislativo.
Na Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental (leia íntegra da ADPF aqui), protocolada no STF nesta quarta-feira (31/7), Dodge afirma que “o ato presidencial causa lesão aos preceitos fundamentais como a dignidade humana – classificada na Constituição Federal como princípio fundamental da República Federativa do Brasil – e aos princípios da legalidade e da vedação à tortura”.
Em evento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública em João Pessoa, na Paraíba, nesta quarta-feira (31/7), Raquel Dodge comentou a petição proposta por ela e defendeu o trabalho realizado pelo Mecanismo de Combate à Tortura. “O decreto enfraquece as medidas de prevenção de tortura e do cumprimento de penas cruéis e degradantes que são vedações constitucionais expressas, necessárias para a garantia da dignidade humana e do estado de direito que nos distingue como nação civilizada no cenário mundial”, declarou.
“Esse mecanismo não poderia ser enfraquecido porque ele representou um avanço muito importante no tocante ao enfrentamento da tortura no Brasil que, infelizmente, é uma prática ainda existente”, continuou Dodge.
Na petição, noticiada no portal do MPF (Ministério Público Federal), Raquel Dodge menciona que o ato de prevenir a prática de tortura e de outros tratamentos desumanos, além de respeitar a Constituição, também está alinhado com acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário, como a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, assinada em Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1984; a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, de 1989; a adesão ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, promulgada pelo Decreto 4.388, de 25 de setembro de 2002; e a promulgação do Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, de abril de 2007.