Rhuan, atingido nas costas por um PM: ‘Minha mulher morreu sem saber o porquê’

    Com bala alojada nas costas, jovem de 19 anos fala com revolta sobre a morte da namorada Brenda Lima de Oliveira, assassinada com um tiro no peito disparado por um policial de folga

    Rhuan e a mãe, Adriana, no enterro de Brenda | Foto: Reprodução/TV Diário

    Por volta das 8h desta terça-feira (3/7), Rhuan Carlos dos Santos Macedo se despedia da namorada Brenda Lima de Oliveira. Aos 19 anos, ele enterrava a companheira, baleada no peito por um policial militar de folga no começo da madrugada do domingo (1/7), no Jardim Santo Antônio, em Poá, cidade da Grande São Paulo. O rapaz ainda estava com a bala alojada e um curativo nas costas. Naquela noite, o PM Johnatas Almeida Lima e Lima confundiu o casal em uma moto com uma dupla que, segundo ele, o perseguia, e atirou diversas vezes em sua direção. Rhuan também foi atingido pelas costas, mas sobreviveu. Ferida no peito, Brenda não resistiu e morreu no local.

    “O policial da sacada fez um disparo. Na hora que atirou, só vi a Brenda caindo nos meus braços. A bala também me atingiu, a perfurou e me acertou nas costas”, contou o rapaz, em entrevista à TV Diário. “Minha mulher morreu sem saber o porquê”, desabafou, emocionado. Os dois passavam na Rua Pedro Martins para ver uma casa que tinham acabado de alugar e onde, em breve, iriam viver juntos. Com dois quartos, o espaço parecia ideal para que o casal realizasse o sonho de ter filhos e construir a nova família, mas os tiros mudaram os rumos da vida de Rhuan e Brenda.

    De acordo com o PM, ele começou a ser ameaçado após uma operação no bairro. Ele não participou da ação, mas pessoas passaram na rua gritando “policial cagueta, vai morrer”, segundo relatou à Polícia Civil. Johnatas conta que a casa onde mora com os pais passou a ser vigiada por um casal. Às 22h do sábado, uma bomba foi jogada na sacada. Sua reação foi ficar atento e, quando ouviu uma moto se aproximar, saiu com arma em punho e atirou ao ver um movimento brusco do garupa. Não soube dizer qual era o movimento.

    Na garupa estava Brenda, que morreu com um tiro no peito. Rhuan trabalha como entregador de pizzas na região e vive com a família no bairro vizinho, Jardim São José. Brenda morava com a mãe e o pai em Guarulhos, mas visitava a avó, que mora no São José, aos finais de semana.

    “Eu vou ter que conviver o resto da minha vida com essa dor, porque não vai passar. A dor não vai passar, era minha única filha”, disse Sueli Maria de Lima, mãe de Brenda, instantes antes do enterro da filha. Seu marido e pai da garota, Ednaldo Silva, tentou ir atrás de provas para ajudar nas investigações, sem sucesso. “Perguntei para os vizinhos sobre as câmeras, todo disseram que estavam desligadas. Falei que só queria saber se tinha uma filmagem, é minha filha. A gente já não sabe se é medo, se é defesa”, desabafou.

     

    Brenda tinha 20 anos e olhava com o namorado uma casa para alugarem | Foto: Reprodução/TV Diário

    A mãe de Rhuan estava inconformada. “Uma pessoa irresponsável, que entra em uma corporação para defender a população. Ele agiu pior do que um bandido e ninguém faz nada”, criticou Adriana Macedo, ainda muito abalada no Cemitério Municipal de Poá.

    A reportagem tentou conversar com Rhuan e os familiares de Brenda após o enterro, mas, muito abalados, preferiram o silêncio. Um tio dela explicou que todos atingiram o limite, que já tinham dito o que precisava ser denunciado. Na casa do rapaz, ninguém atendeu. Vizinhos disseram que ninguém entrou ou saiu do lugar até o começo da tarde.

    Revolta generalizada

    O clima na região é de tristeza e revolta. Andando pelas ruas, as pessoas estão cabisbaixas e não se fala em outra coisa a não ser no assassinato de Brenda. A revolta é tamanha que dois ônibus foram incendiados no terminal do bairro, o que fez a Radial, empresa de transporte que atua na região, retirar veículos de ao menos três linhas com destino final no terminal. Um lado da cidade de Poá, cujos seus 17 mil quilômetros quadrados são divididos ao meio pela linha do trem, ficou sem transporte público desde a tarde de segunda-feira (2/7).

    A rua em que foram ver a casa de dois cômodos, que segue para ser alugada, agora tem uma viatura da PM com dois policiais 24 horas. Esta presença é determinação do comando da corporação por temer que o policial Johnatas sofra algum tipo de represália. A Ponte esteve no local para ouvir a versão do policial sobre o caso, mas ninguém atendeu. Segundo um dos policiais da viatura ali parada, ninguém saiu da casa ou sequer abriu as janelas no período em que estavam ali na frente.

    Ouvidoria classifica caso como grave

    A Ouvidoria das Polícias de São Paulo tomou conhecimento da morte de Brenda Lima de Oliveira através de contato da reportagem e abriu, como de praxe, um procedimento para apurar o que aconteceu. A análise é de que o caso é “prioritário” e os indícios são de que Brenda e Rhuan nada tinham a ver com as pessoas que o PM Johnatas Almeida Lima e Lima diziam vigiar sua casa e atirarem uma bomba na sacada.

    “A ocorrência é grave e vamos acompanhar como caso prioritário, acompanhar de perto a investigação da PM. O caso é grave por se tratar de uma morte, de um homicídio”, afirmou o ouvidor das polícias de São Paulo, Benedito Mariano, que espera, agora, os laudos técnicos.

    Questionado se está dentro dos padrões um PM atirar em caso de movimento brusco, como está no B.O. e foi usado como justificativa por Johnatan, o ouvidor é taxativo: “Evidentemente que não”.

    O registro da ocorrência aponta que nenhuma arma foi encontrada na cena do crime além da calibre .40 de uso do policial militar, que estava de folga. Antes de a bomba ser lançada, o PM ligou ao 190 por conta de um casal que, segundo ele, estava vigiando sua casa. Ambos foram abordados pela Rocam e saíram de lá. Após a morte de Brenda, a Polícia Civil confrontou as informações e os dados do homem e da mulher abordados durante a tarde são diferentes dos de Rhuan e Brenda, as vítimas dos disparos.

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