Rodrigo Garcia pratica crime ao deixar de nomear ouvidor das polícias, diz Condepe

Conselho pediu que Procuradoria-Geral de Justiça apure se governador cometeu improbidade e crimes de responsabilidade; governador está com lista tríplice há três meses e declarou que vai delegar função a Tarcísio de Freitas

Governador Rodrigo Garcia (PSDB) | Foto: GESP

O Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) entrou com uma representação, na terça-feira (20/12), em que pede à Procuradoria-Geral de Justiça, do Ministério Públco Estadual, que investigue o governador Rodrigo Garcia (PSDB) por não ter ainda nomeado um novo ouvidor das Polícias de São Paulo para o biênio 2022 a 2024.

A solicitação foi feita quatro dias depois de Garcia ter declarado ao portal G1 que não vai escolher o novo chefe do órgão e que a função caberá ao governador eleito, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que assume no dia 1º. O Condepe é responsável pelo processo de definição da lista tríplice que é enviada ao governador para nomeação.

A lista foi deliberada em agosto com os nomes mais votados pelo conselho: Alderon Pereira da Costa, indicado pela Associação Rede Rua, Renato Simões, indicado pelo Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) e Claudio Aparecido da Silva, indicado pela Associação Santo Mártires. Desde então, Garcia ainda não nomeou um ocupante para o órgão, que segue sendo comandado pelo antigo ouvidor, Elizeu Lopes, cujo mandato terminou em fevereiro deste ano. Lopes disputava a recondução do mandato, mas não conseguiu votos suficientes para entrar na lista.

Na representação, o presidente do Condepe, Dimitri Sales, aponta que Rodrigo Garcia pode estar cometendo ato de improbidade administrativa e ou crime de responsabilidade que por se omitir dessa função. “Com a lista tríplice do atual Governador do Estado, em posse desde outubro de 2022 ainda que por várias vezes postergadas as tramitações nos órgãos internos, e sua não devida nomeação conforme publicada a nota à imprensa, poderá configurar em possível irregularidade ao não praticar ato privativo e exclusivo como prerrogativa de função, incorrendo em violação da legislação vigente”, escreveu.

Para Sales, a não nomeação também “gera consequências graves para a população paulista, como a autorização tácita, a partir da atuação leniente do atual Ouvidor da Polícia, para que agentes públicos de segurança de má índole atuem à margem da lei, sem o receio de terem a efetiva responsabilização por seus atos nos âmbitos administrativo, cível e criminal, como deveria ocorrer.”

No começo do mês, movimentos sociais fizeram um protesto cobrando a nomeação na sede da Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Fundação Casa, antiga Febem), no centro da cidade de São Paulo.

A Ouvidoria das Polícias, criada em 1997 em São Paulo e a primeira do Brasil, é ligada à Secretaria da Segurança Pública e tem, dentre suas atribuições, o intuito de receber denúncias e reclamações sobre ações arbitrárias e abusivas cometidas por integrantes das Polícias Militar, Civil ou Científica, verificá-las e cobrar respostas das autoridades competentes, seja no âmbito administrativo dentro da própria polícia e da pasta, como também no do Ministério Público. Os próprios policiais podem recorrer ao órgão. A Ouvidoria também produz pesquisas e propõe melhorias no campo da segurança pública e direitos humanos. O mandato é de dois anos e o ouvidor ou ouvidora pode ser reconduzido ao cargo apenas uma vez — ou seja, pode ser reeleito(a).

Manifestante escreve cartaz com dizeres “exigimos um ouvidor eleito” durante ocupação do prédio onde está sediada a Ouvidoria das Polícias, no centro de São Paulo, em fevereiro de 2022 | Foto: Gil Luiz Mendes/Ponte Jornalismo

Por que ainda não aconteceu a nomeação

Tudo começou com um imbróglio no processo eleitoral da Ouvidoria. Em 5 de julho, o Condepe convocou novas eleições. O processo eleitoral tinha sido suspenso após a Secretaria de Justiça e Cidadania receber representações sobre o resultado da votação ocorrida em 9 de novembro de 2021, que foi feita de forma remota e foi transmitida pelo YouTube.

Na ocasião, os mais votados para compor a lista tríplice foram Renato Simões, com nove votos, Alderon Pereira da Costa (ex-ouvidor da Defensoria Pública de 2014 a 2016) e Claudio Aparecido da Silva, ambos com oito votos cada. Elizeu recebeu quatro votos, ficando de fora da lista, e os votos em branco também foram quatro. Na publicação do resultado no Diário Oficial do Estado, porém, Elizeu apareceu com oito votos na tabela e com os votos em branco aparecendo como zerados.

De acordo com o Condepe, houve um erro na publicação dos votos da lista no Diário Oficial. Essa retificação foi solicitada, mas não foi feita. Além disso, os deputados estaduais Coronel Telhada (PP) e Douglas Garcia (PTB) entraram com pedidos de impugnação do processo eleitoral contestando essas divergências da publicação dos votos. Elizeu também entrou com recurso e questionou que o resultado foi mostrado em uma “planilha editável” e que não houve emissão de um “boletim de urna”. Os parlamentares, que são coautores de projeto de lei na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) que extingue a Ouvidoria das Polícias, alegaram que o resultado teria sido manipulado.

Desde então, o conselho e outras entidades fizeram protestos, enviaram notificação extrajudicial ao governador Rodrigo Garcia (PSDB) e movimentos sociais chegaram a ocupar o prédio onde está sediada a Ouvidoria para a continuidade do processo eleitoral.

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Na deliberação publicada em 5 de julho, o Condepe considerou que, “posto não terem sido constatados quaisquer vícios na condução do processo eleitoral para a formação da lista tríplice” e que a apuração da Secretaria de Justiça “versa tão sobre a plataforma eletrônica utilizada para a votação da lista tríplice”, e um novo pleito aconteceu em 25 de julho. Além disso, a votação foi realizada de forma presencial e o voto computado em cédula de papel. 

O que diz o governador

A Ponte procurou a assessoria do governo estadual sobre a representação e também questionou o motivo de delegar a nomeação ao sucessor, mas não teve retorno até a publicação

O que diz o Ministério Público

A reportagem também questionou se a PGJ vai ou não abrir procedimento para apurar a conduta de Rodrigo Garcia e aguarda retorno.

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