Anderson Silva da Conceição tinha sido absolvido, mas acabou condenado a sete anos de prisão em regime semiaberto em 2023 após recurso da Defensoria; caso aconteceu em 2019 quando mulher de 19 anos que relatou violência em viatura
O Comando Geral da Polícia Militar de São Paulo expulsou da corporação, nesta quarta-feira (24/4), o soldado Anderson Silva da Conceição. Ele foi acusado, junto com o soldado Danilo de Freitas da Silva, por estupro contra uma jovem de 19 anos que tinha pedido ajuda para chegar ao terminal de ônibus e relatou ter sido obrigada a fazer sexo oral na viatura em Praia Grande, no litoral paulista, em 2019.
A Polícia Militar considerou que ele cometeu atos desonrosos e “atentatórios a instituição e ao Estado e aos direitos humanos” ao infringir as transgressões disciplinares consideradas graves de “faltar com a verdade” e “ofender a moral e os bons costumes por atos, palavras ou gestos”. A decisão foi publicada no Diário Oficial do Estado.
Os dois policiais foram condenados pelo crime em 2023, após o caso ter ficado conhecido por conta da absolvição de Anderson, que dirigia a viatura, e a aplicação de pena de sete meses e seis dias de prisão em regime aberto contra Danilo por “libidinagem ou pederastia em ambiente militar” no Tribunal de Justiça Militar (TJM), em 2021.
O tribunal reconheceu o crime de estupro em segunda instância, após recurso da Defensoria Pública, sendo que Danilo foi condenado a 16 anos de prisão em regime fechado e Anderson a sete anos de prisão em regime semiaberto. Os dois estão recorrendo. À reportagem, a assessoria do TJM disse que “o processo corre em segredo de justiça, por isso as informações dos autos ficam restritas às partes e seus advogados”.
Em 2022, Danilo pediu demissão da corporação, o que foi acatado.
Em 2021, quando saiu a primeira decisão sobre o caso, o juiz Ronaldo João Roth entendeu que não houve crime de estupro porque, na visão dele, a vítima não teria resistido. “Ora, segundo a versão isolada da vítima, o ato libidinoso que praticou (sexo oral no corréu Danilo) foi fruto da violência do policial, no entanto, ela não ofereceu nenhuma resistência física, também nada falou, nem pediu ajuda ou socorro ao motorista da viatura policial, mas depreende-se de sua versão que a vítima ficou intimidada pelo fato do corréu Sd [soldado] Danilo estar armado, com a arma de fogo no coldre que portava – embora não tivesse usado sua arma –, mas ela poderia dizer não à intenção do corréu Danilo, ela poderia resistir, ela poderia chamar o outro corréu (motorista) para se ver livre daquela situação, mas nada fez”, escreveu.
O texto da sentença deixou movimentos de mulheres e entidades de direitos humanos indignados. O Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres da Defensoria Pública de São Paulo, que atua como assistente de acusação do caso, entrou com um recurso para que fosse reconhecida a legitimidade do órgão para interpor recursos, além de pedir a revisão da sentença porque o resultado “deixou de considerar os resultados dos exames periciais e o depoimento da vítima” e “em virtude da ausência de imparcialidade do juízo, na medida em que o julgamento foi informado por estereótipos/estigmas de gênero e não na prova dos autos”. Em 2022, o pedido foi aceito e a decisão considerada inédita porque apenas promotores podem recorrer de decisões da parte da acusação, segundo o Código de Processo Penal Militar.
Na ocasião, como a Ponte revelou, Roth também passou a ser investigado pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) por suposto favorecimento ao advogado José Miguel da Silva Junior, que era um dos representantes do soldado Anderson.
No ano passado, o Órgão Especial determinou o arquivamento do caso. A Ponte não teve acesso às razões da decisão pois o processo está sob sigilo.
O que dizem as defesas
A Ponte procurou o Felipe Molina, um dos advogados de Anderson, sobre a decisão do Comando da PM, mas não teve retorno.
Buscamos também a advogada Flavia Artilheiro, que representa Danilo. Ela disse que não pode comentar o caso por conta do sigilo do processo.
A assessoria da Defensoria Pública disse que não lhe cabe comentar procedimentos administrativos da polícia.
O que diz o governo
A reportagem contatou as assessorias da Secretaria de Segurança Pública e da PM, mas não teve retorno.