TJ adia julgamento sobre indenização a fotojornalista cegado pela PM em 2013

Desembargadores pediram para avaliar composição de turma julgadora que é diferente da de 2017; para Sérgio Silva, a demora de uma resolução “é quase como o impacto de levar novamente um tiro no olho”

O fotografo Sergio Silva deixa o Palacio da Justica, na praca da Sé, após adiamento do novo julgamento no TJSP do seu pedido de indenização | Foto: Gustavo Basso / Ponte Jornalismo

A 9ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) adiou, nesta quarta-feira (29/3), o julgamento para avaliar se o Estado é responsável pelo disparo de um policial militar que cegou o fotojornalista Sergio Silva quando cobria uma manifestação em 2013.

O relator Rebouças de Carvalho pediu aos colegas para que o caso fosse retirado da pauta porque a composição da turma julgadora era diferente da de 2017 e essa questão precisava ser analisada. Além do relator, nesta terça estavam presentes os desembargadores Décio Notarangeli e Ponte Neto. O colegiado que negou o pedido em segunda instância contava com o desembargador Oswaldo Luiz Palu no lugar de Ponte Neto. Em 2017 o relator havia entendido que não existia comprovação de que foi um agente público que disparou uma bala de borracha que atingiu o olho da vítima, o chamado de nexo de casualidade.

O caso voltou ao TJSP por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF). A defesa do fotógrafo havia entrado com um recurso à corte com base na jurisprudência do caso do fotojornalista Alex Silveira, que foi cegado pela PM em 2001, e em 2021, o STF reconheceu a responsabilidade do Estado para indenizá-lo. Contudo, os ministros decidiram que o tribunal de origem, que já havia negado nas duas instâncias a indenização, deveria reavaliar a solicitação de Sergio tendo em vista a nova jurisprudência que tem repercussão geral, ou seja, é válida para casos semelhantes.

Após decisao do STF de revisao do julgamento realizado em 2017 no mesmo TJSP, o colegiado decidiu nesta quarta-feira (29) retirar a decisão da pauta, fazendo com que o julgamento, que se arrasta a uma década, não tenha data prevista para sua conclusão | Foto: Gustavo Basso / Ponte Jornalismo

Sergio saiu abatido da sessão e protestou em frente ao Palácio da Justiça, no centro da capital, com uma gaze amarrada nos olhos. “A cada dia que passa, é como se esses 10 anos tivessem um peso ainda maior. É muito violento ter que lembrar o que aconteceu e ficar sustentando uma defesa de algo muito óbvio. Isso vai alimentando um trauma que é muito difícil de esquecer”, declarou. “É uma dor que é difícil de dizer, é quase como o impacto de levar novamente um tiro no olho. Esperar mais um dia, mais um mês, mais um ano é muito dolorido.”

Para Mauricio Vasques, advogado de Sergio, o colegiado deveria permitir que a defesa fizesse a sustentação oral ao desembargador que não participou do outro julgamento, ou seja, apresentar presencialmente as justificativas que foram redigidas no processo para que o caso fosse analisado. “A situação desse caso é dramática. A esperança é que o Tribunal de Justiça se sensibilize, se não pelos argumentos e pela clareza que há, pelo menos pela condução do que o Supremo Tribunal Federal está agora orientando e que não tem mais volta”, criticou.

O caso

Sérgio Silva perdeu a visão do olho esquerdo ao ser atingido por uma bala de borracha na esquina das ruas da Consolação e Caio Prado, no centro de São Paulo, durante a repressão da Polícia Militar a um ato pela redução do preço da passagem de transporte público do Movimento Passe Livre (MPL), em 13 de junho de 2013, nas chamadas Jornadas de Junho.

Desde então o fotógrafo tenta responsabilizar o Estado e ser indenizado pela agressão, emuma saga que já dura uma década. A primeira decisão veio em 2016, quando o juiz Olavo Zampol Júnior, da 10ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, determinou que a culpa pelo ferimento era do próprio fotógrafo. O juiz afirma que foi Sérgio quem se colocou na “linha de tiro” e, portanto, era o responsável pelas consequências.

Em 2017, a 9° Câmara do TJSP entendeu “não haver provas” de que o ferimento no olho do fotógrafo foi causado por uma bala de borracha e que, portanto, não há “nexo causal com o comportamento danoso do Estado”. O colegiado respaldou decisão em primeira instância, porém, reconheceu que o fotógrafo não “teve culpa” pelo incidente e estava fazendo o seu trabalho. Contudo, os desembargadores inocentaram o Estado por consideraram as provas apresentadas insuficientes para ligar um policial, no caso, um agente do Estado, como causador do dano.

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Em 2019 a defesa de Sérgio teve pedido de recurso ao Superior Tribunla de Justiça (STJ) negado. De acordo com os ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina, Gurgel de Faria e Regina Helena Costa, relatora do caso, o pedido não preenchia os requisitos básicos para ser analisado. Assim, decidiram por negar o recurso antes mesmo de entrar no mérito posto pela defesa, o de não terem podido coletar provas na primeira instância – quando o juiz Olavo Zampol Júnior antecipou a decisão e considerou Sérgio culpado pelo ferimento ao se “ao se colocar na linha de confronto entre a população e os policiais”.

Ainda em 2019 Sérgio acionou o STF para um último recurso, mas diante da nova jurisprudência criada pelo caso de Alex Silveira, a corte devolveu o caso ao tribunal paulista.

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