Luiz Carlos Santos é investigado por receber R$ 4,5 mil por mês da facção criminosa para realizar falsas denúncias. Acesso de policiais a vítimas de violência do Estado preocupa membros do Condepe
Luiz Carlos Santos, vice-presidente do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), órgão da Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça, foi preso na manhã desta terça-feira (22/11), em Cotia, na Grande São Paulo, durante operação da Polícia Civil e do Ministério Público Estadual. A prisão dele é temporária, de cinco dias, de acordo com o advogado Carlos Miramontes, presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), e que acompanha o caso.
Santos e pelo menos outros 31 advogados são acusados de receberem dinheiro do PCC (Primeiro Comando da Capital) para realizar falsas denúncias de violência promovidos por membros do Estado. A Promotoria aponta que Santos recebe R$ 4,5 mil por mês da facção criminosa. A Polícia Civil aponta que, desde que começou a colaborar com o crime, já ganhou R$ 130 mil.
De acordo com a suspeita, os advogados também ajudavam a facção a movimentar o dinheiro do crime organizado e ainda levantavam nomes e endereços de agentes penitenciários e de seus parentes assim que o PCC julgasse necessário.
Também durante a manhã desta terça, policiais foram à sede do Condepe, no centro da capital, e apreenderam objetos e computadores utilizados pelo vice-presidente. Segundo Miramontes, Santos teme pelas relatórios, nomes, listas, atas e demais informações que estão no computador. A preocupação é de que as informações vazem para policiais acusados de crimes e que esses acusados queiram realizar algum tipo de retaliação.
Criado em 1991, o Condepe é um órgão que trabalha para a preservação dos direitos dos cidadãos. Ligado à Secretaria da Justiça e Cidadania, do governo de Geraldo Alckmin (PSDB), o conselho funciona na sede da pasta, mas atua de forma autônoma. De acordo com a Polícia Civil, a investigação, denominada “Operação Ethos”, teve início há um anos e meio. De lá para cá, 55 pessoas foram identificadas. Dessas, 41 estavam em liberdade e outras 14, presas.
A defesa de Santos afirma que ele vai ser transferido para o local do processo, em Presidente Prudente, onde será ouvido. Como o processo está no interior de São Paulo, o advogado não teve acesso à acusação na íntegra. Mas as primeiras informações que chegaram à defesa é de que a prisão temporária pode ter sido deflagrada por causa de uma carta escrita por um integrante do PCC há dois anos, em que o preso da facção afirmava que o PCC deveria ajudar Luiz Carlos Santos porque ele fiscalizava os presídios assegurando os direitos humanos aos encarcerados de São Paulo.
Rildo Marques de Oliveira, ex-presidente do Condepe, afirma que “espanta” a polícia entrar no Condepe e “verificar processos, sem acompanhamento de ninguém do Condepe, incluindo alguns em caráter de sigilo, com informações de vítimas que fizeram denúncias de violência policial”.
Em nota, o Condepe afirmou que teme a prisão do vice-presidente do conselho “ser mais uma ofensiva contra aqueles que lutam pela democracia, efetivação dos direitos principalmente os que envolve a dignidade da pessoa humana”. Confira a posição do Condepe, divulgada após reunião dos conselheiros, movimentos sociais e a presidente Maria Nazareth Cupertino, na íntegra, no fim desta reportagem.
A SSP (Secretaria da Segurança Pública) afirmou que as detenções e apreensões ocorreram de acordo com a legalidade. Na tarde desta terça-feira (22/11), o secretário Mágino Alves Barbosa Filho e o subprocurador-geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais do MP, Mário Sarrubbo, também vão falar sobre a operação à imprensa.
Em 2011, Luiz Carlos dos Santos foi preso sob suspeita de extorquir um guarda civil municipal de Cotia para que agentes não o denunciassem à imprensa por suposto estupro de uma adolescente, que teria ocorrido dentro da viatura da GCM.
De acordo com a acusação, o guarda municipal gravou as conversar que teve com Santos por telefone, em que eles acertavam o valor de R$ 10 mil para que ele não fosse entregue à imprensa. O vice-presidente foi preso em flagrante, recebendo um envelope que, dentro, tinha R$ 120. Ele respondia às acusações em liberdade.
À época, Luiz Carlos Santos afirmou que os guardas fizeram uma armação contra ele em forma de represália. Ele informou que, antes disso, os guardas envolvidos haviam sido denunciados por ele por terem violado direitos humanos.
De acordo com a Prefeitura de Cotia, o caso denunciado por Santos foi arquivado porque nada foi comprovado.
Confira, abaixo, a nota oficial do Condepe sobre o caso.
Com relação à prisão temporária do Conselheiro Luiz Carlos dos Santos, Vice-Presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo – CONDEPE, no âmbito da operação Ethos, vimos esclarecer que:
1. O Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo – CONDEPE, criado pela Constituição Estadual Paulista, constituído por representantes da sociedade organizada, eleitos por entidades de base, sendo sua composição ainda integrada por representantes do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, do Governo do Estado de São Paulo, da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, Ministério Público do Estado de São Paulo, Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de São Paulo e Defensoria Pública do Estado de São Paulo, tem, dentre outras, a função institucional de receber, apurar e acompanhar denúncias de violações de direitos humanos;
2. O Conselheiro Luiz Carlos Santos é membro eleito do CONDEPE, indicado pela entidade CODE (Conselho Defesa Direitos Humanos de Cotia e Região), tendo sido eleito Vice-Presidente pelo membros do Conselho. Possui reconhecida trajetória de contundente defesa dos direitos humanos. Nos últimos anos, tem se dedicado a denunciar práticas de violência policial, a cobrar apuração das chacinas no Estado de São Paulo, bem como a apontar violação de direitos no sistema prisional;
3. Ao contrário do que se tem afirmado, nenhuma denúncia de violação de direitos humanos apresentada pelo Conselheiro Luiz Carlos se mostrou inconsistente, sendo todas devidamente embasadas em processos administrativos e posterior apuração;
4. Nesse sentido, causou-nos surpresa a prisão do Conselheiro Luiz Carlos. Como defensores de direitos humanos, reiteramos o princípio fundamental da presunção da inocência;
5. O CONDEPE se coloca à disposição do Poder Judiciário para contribuir com a rigorosa apuração da verdade dos fatos, sem prejulgamentos;
6. Informamos que computador e documentos do CONDEPE, que guardam informações sigilosas acerca de pessoas que denunciam violação de direitos humanos, foram apreendidos. Exigimos a garantia da integridade institucional do Conselho, a preservação dos dados e manutenção do sigilo das informações;
7. Em um momento de ascensão de discursos e práticas que violam os direitos humanos, reafirmamos o papel do CONDEPE na defesa do Estado Democrático de Direito, das liberdades constitucionais, do direito à livre expressão e manifestação, refutando quaisquer intenções de criminalização dos movimentos sociais e dos defensores dos Direitos Humanos.
São Paulo, 22 de novembro de 2016
Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo.