Vídeo flagra policial civil agredindo trabalhador em canteiro de obra

    Operário reclamou de agente prisional que invadiu canteiro de obras em SC. Agente pediu ajuda a um policial civil, que agrediu e prendeu o trabalhador

    Uma quarta-feira de sol e trabalho. Aliás, o trabalho estava quase acabando em um canteiro de obra no centro de Navegantes, no litoral norte catarinense, em 19 de outubro, quando o relógio digital no celular dos colegas marcava 16h30. Nesse horário, um dos operários, Emerson Ribeiro da Silva, 20 anos, foi ameaçado por um agente prisional e agredido a socos por um policial civil.

    “Ele colocou o dedo no gatilho, fiquei até meio escamado, mas não fiquei quieto não. Ele não pode fazer isso. Eu nem sabia que ele era policial, ele disse que era, mas como eu sei? Ele não mostrou distintivo nenhum, não tinha viatura, só falou apontando a arma pra mim”, conta Emerson. O vídeo com as agressões tomou as redes sociais.

    Segundo as vítimas, o abuso começou por volta das 16h, quando o agente prisional, dirigindo um Gol preto, entrou em um trecho da Rua Prefeito José Juvenal Mafra que estava fechada para obras. Um carro da empresa responsável pela obra estava atravessado na via. Segundo testemunhas, o agente desceu do Gol e entrou no carro da empresa para retirá-lo da rua.

    “Aqui está em obra e uma quadra antes já tem quatro placas informando que o trânsito está interrompido. Na outra quadra tinha um carro nosso atravessado e nós estávamos trabalhando mais pra frente, aí apareceu esse Gol preto. Quando fui ver o cara entrou no carro, tirou o freio de mão e jogou o carro pra frente, deixou lá e passou”, explicou. Neste momento, Emerson foi até o agente e afirma que o questionou dizendo: “O senhor não está vendo que está parado, que está tudo em obra? O senhor é folgado que vai entrando no carro dos outros”.

    Irritado, o agente se identificou como policial. “Ele ficou alterado e disse: ‘o senhor me chamou do que, de folgado? Eu sou policial’. E nisso ele já sacou a arma e apontou pro rapaz com o dedo no gatilho”, contou um colega de Emerson. Ele ouviu do agente que voltaria em dez minutos para prender o operário. Foi o que aconteceu. O agente saiu no Gol e voltou em uma viatura da Polícia Civil, acompanhado de um policial.

    Já sentado e trabalhando na colocação de lajotas, Emerson não teve qualquer reação e foi atingido pelo policial civil com socos na cabeça antes que pudesse se levantar. “Me algemaram como se eu tivesse feito algo grave e eu só estava sentado trabalhando”, contou o operário. Nem os gritos de indignação ou os celulares apontados que filmavam a agressão intimidaram o policial. Os socos continuavam e, quando confrontado sobre a truculência, o agente prisional respondeu à população: “quer ensinar o nosso serviço?”. Questionado se “o serviço de vocês é bater?” por uma pessoa que acompanhava a ação, o agente disparou: “com reação, é”. Emerson foi algemado, colocado na viatura e levado para a delegacia, onde ficou por cerca de uma hora antes de assinar um termo circunstanciado (registro de ocorrência para delitos leves) por desacato e resistência.

    Além de Emerson, outros funcionários e pessoas que presenciaram a ação estiveram na delegacia. Um dos funcionários contou à reportagem que foi intimidado no momento em que prestava seu depoimento. “Na hora que eu fui lá, esse cara do vídeo, esse de blusa verde simplesmente esvaziou a delegacia e ficou do meu lado durante o depoimento. Eu conheço um pouquinho de lei, sei que isso não pode e disse para ele. Perguntou ‘o senhor está incomodado?’, eu respondi ‘um pouquinho’, mas ele continuou lá. Tentou, sim, me intimidar”, disse o funcionário. “É uma situação brava, todo mundo conhece a fama desse cara aqui, muita gente reclama dele. Tu fica até meio assim de estar aqui trabalhando.” 

    A advogada do rapaz solicitou as imagens das câmeras de segurança dos estabelecimentos comerciais próximos aos dois pontos onde Emerson foi vítima, primeiro de ameaça com arma de fogo, depois de agressões físicas e prisão. As imagens gravadas por moradores do local já foram anexadas ao inquérito.

    Mesmo de posse das imagens, o delegado regional Angelo Cintra disse que não podia afirmar se houve abuso de autoridade na conduta do agente e do policial. “Eu não posso afirmar isso agora porque, apesar de a gente estar vendo as imagens, somente com os depoimentos finais poderemos confirmar alguma coisa. Nós não conseguimos captar ali o que foi dito pelo sujeito, o que foi dito no momento da prisão”, disse à Ponte. Angelo afirmou ainda que “o policial tentou prendê-lo após ele [policial] pedir para retirar o veículo, se identificar e ouvir ‘vai tomar no cu, policial de merda’”.

    O delegado encaminhou o caso à Corregedoria da Polícia Civil, que tem 30 dias para analisá-lo. Ele se recusou a informar os nomes do agente prisional e do policial civil que agrediram o operário.

    Emerson afirma que pretende processar o policial e o agente prisional por abuso de autoridade. “Só espero justiça porque é errado o que os dois fizeram, eu estava só trabalhando”, lamentou. No dia seguinte à agressão, o operário já estava no mesmo canteiro de obras, trabalhando.

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