Violência afeta saúde mental de 1/3 dos moradores da Maré, no Rio, revela estudo

Para cerca de 1/3 da população adulta do Complexo da Maré a saúde mental é arduamente afetada pela violência – e não só a armada. Segundo o relatório, 44% dos entrevistados disseram ter estado em meio a um tiroteio nos 12 meses anteriores, sendo 73% dos que responderam vítimas desta situação mais de uma vez

Como vai a saúde mental dos moradores de favelas? Quais os efeitos dos conflitos armados, tão frequentes nestas comunidades, sobre seu equilíbrio e sua saúde física? Buscando medir os impactos da violência no cotidiano de moradores no conjunto de favelas da Maré, um estudo pioneiro mostra que essas pessoas estão em maior vulnerabilidade em relação ao sofrimento mental.

Os dados chocam e acendem alerta para políticas públicas voltadas a esses grupos. Na análise feita pela pesquisa, a maioria da população (63%) sente medo (sempre ou muitas vezes) de ser alvejada por uma arma de fogo na Maré. O número torna-se ainda maior quando perguntados sobre o medo constante de serem atingidos ou alguém próximo: 71%.

O impacto psicológico é inegável. Para cerca de 1/3 da população adulta da Maré (31% dos entrevistados), a saúde mental é arduamente afetada pela violência – e não só a armada. Segundo o relatório, 44% dos entrevistados disseram ter estado em meio a um tiroteio nos 12 meses anteriores, sendo 73% dos que responderam vítimas desta situação mais de uma vez. Ao todo, 44% acreditam que sua saúde mental foi prejudicada.

A iniciativa ”Construindo Pontes” é liderada pela organização inglesa People’s Palace Projects e pela Redes da Maré, e foi realizada entre 2018 e 2020 com 1.411 moradores acima de 18 anos. O resultado tem como desdobramento a primeira Semana de Saúde Mental da Maré, a Rema Maré, que acontece de 23 a 28 de agosto.

Confira programação da Semana de Saúde Mental – Rema Maré

A primeira edição da campanha Rema Maré será um espaço de reflexão e ação em relação ao tema, com debates e intervenções artísticas voltados para moradores da Maré e entrará no calendário anual de atividades da Redes da Maré. Na programação, diferentes ações e atividades artísticas e culturais decorrentes do projeto Construindo Pontes:

● Intervenções musical e teatral dos jovens artistas participantes do Becos (MC Martina, Thais Ayomide, Tainá Ina, Matheus Araújo, Jonathan Panta e Rodrigo Maré) no novo galpão do Espaço Normal. As apresentações serão para pessoas e organizações convidadas, respeitando os protocolos de segurança durante a pandemia e haverá espaço limitado para o público.

● Produção de mural de azulejos em um beco da Maré, a partir de oficinas com moradores coordenadas pela Laura Taves;

● Faixas na avenida Brasil e lambes nas favelas da Maré com trechos de poemas dos artistas de Becos e dados da pesquisa;

● Bike som pelas ruas da Maré tocando o álbum Satélite, de Rafael Rocha, composto durante o processo criativo de Becos, com distribuição do Guia de Saúde Mental;

● Cineminha nos becos- projeção dos videos com as letras do podcast Becos nas 16 favelas da Maré;

● Entre as ações já realizadas pelo Construindo Pontes estão “A Maré de Casa” – série de registro fotográficos realizados por moradores da Maré – e “Becos”, peça sonora em quatro atos produzida por jovens artistas mareenses.

Live sobre pesquisa acontece nesta segunda, 23

Além de um perfil da população, com dados sobre cor, educação, ocupação, renda, hábitos culturais e religião, a pesquisa Construindo Pontes traz informações sobre a exposição dos moradores a situações violentas; quais situações lhes provocam medo; suas percepções a respeito da própria saúde física e mental; hábitos de consumo cultural e padrões de uso de drogas legais e ilegais.

O projeto, desenvolvido ao longo de quase três anos, reuniu pesquisadores de várias áreas – ciências sociais, saúde, economia e cultura – da UFRJ, UFRGS e da People’s Palace Projects com a Universidade de Queen Mary em Londres e se desdobra em quatro publicações que tratam do tema, a partir de abordagens diversas, além de um boletim e infográficos da pesquisa. O antropólogo Luís Eduardo Soares assina um livro de narrativas sobre estudo.

Na tarde desta segunda (23), às 17h, acontece um webinar com o time de acadêmicos envolvidos na elaboração do relatório. O encontro reunirá Eliana Sousa Silva (Redes da Maré), Paul Heritage (Queen Mary University of London/People’s Palace Projects), Miriam Krenzinger (Dir. da Escola de Serviço Social- UFRJ), Marcelo Santos Cruz (Instituto de Psiquiatria – UFRJ), Leandro Valiati (UFRGS), Luiz Eduardo Soares (antropólogo , autor e consultor) e Eduardo Ribeiro (consultor dados e estatísticas- UERJ). A mediação da jornalista Anabela Paiva.

Para se inscrever no evento, basta clicar aqui.

Publicado originalmente no Maré Online

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