Exclusivo: Rapper e Mães de Maio chamam a atenção para a violência policial no Brasil através do clipe da música “Chapa”, letra que fala sobre saudade
Emicida concede entrevista exclusiva à Ponte Jornalismo
Leandro Roque de Oliveira, o rapper Emicida, lançou nesta quarta-feira (31) o videoclipe da música “Chapa” em conjunto com as Mães de Maio. Em entrevista exclusiva à Ponte Jornalismo, o cantor afirmou que a letra, que teve a composição terminada em Cabo Verde, na África, retrata a saudade. E a ânsia de um retorno de um ente querido.
A ideia inicial não era ter uma letra ácida, que remetesse diretamente às famílias brasileiras vítimas de violência do Estado. Emicida teve como uma de suas inspirações para escrever a letra justamente o povo de Cabo Verde. Seus anseios e história, que deixaram marcas muito fortes presentes naquele povoado até hoje.
Videoclipe da música “Chapa”
— No entanto, a música representa essas pessoas [brasileiras]. Normalmente, e até penso isso nos shows, quando canto uma música, homenageio uma ou outra pessoa. Em “Chapa”, eu penso em todos nós. Porque cada um pode ser um chapa.
“Chapa, desde que cê sumiu / Todo dia alguém pergunta de você / Onde ele foi? Mudou? Morreu? Casou? / Tá preso, se internou, é memo? Por quê?”, começa a música. Assim como começa a angústia de todo familiar que tem um ente desaparecido.
Emicida: Quando 18 pessoas morrem em uma cidade e ninguém fala nada, essa cidade também está morta
“Mal posso esperar o dia de ver você / Voltando pra gente / Só voz avisar, o portão bater / Você de um riso contente / Vai ser tão bom, tipo São João / Vai ser tão bom, que nem réveillon / Vai ser tão bom, Cosme e Damião / Vai ser tão bom, bom, bom”, conclui, com a esperança do reencontro. Que de muitas famílias brasileiras, principalmente as mais pobres e as negras, também é retirado. As pessoas não têm sequer o direito de sonhar.
Sentimento esse que é compartilhado pelas cinco senhoras chamadas para estarem no vídeo com o rapper. Sentimento que também é compartilhado por cerca de 12 mil pessoas mortas por policiais militares no Estado de São Paulo em quase 21 anos. Para essas senhoras e famílias, a esperança de poder ver novamente o filho ou familiar não existe mais.
— A gente precisa pensar, em conjunto, sobre essa fita. Os trabalhadores têm que agir, mano. Esse estalo, eu tive quando aquele moleque de 17 anos tomou um tiro de um policial, no Jardim Brasil, e ainda teve forças pra perguntar por que o cara tinha atirado nele.
— O Douglas?
— O Douglas. Pode crer. Quando eu fui na passeata, junto com os familiares, para cobrar Justiça, eu subi naquele palanque… e cortou minha brisa, mano. Fiquei pensando que pode ser qualquer um, tá ligado? Posso estar voltando do show, do rolê, da casa da namorada… e já era.
— Você vê, né, mano, a história dos filhos dessas senhoras é parecida. Parece que, se você não souber, é uma história só. Saiu de casa, foi abordado e… [faz sinal de tiro com as mãos].
— Emicida, você já se imaginou sendo um chapa?
— Respondendo à sua pergunta, sim. Não perguntaram nada pro Douglas. Por que iam perguntar pra mim?