Anulação do julgamento que condenou os policiais foi revogada pelo STJ. São Paulo tem aula pública sobre o massacre neste sábado (2)
Após 29 anos, ninguém ainda foi preso pelas 111 mortes ocorridas no dia 2 de outubro de 1992, na maior chacina já vista no Brasil e que ficou conhecida como massacre do Carandiru. O caso está prestes a ir para o Supremo Tribunal Federal, depois que a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça não reconheceu, este mês, a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo para que o julgamento, realizado em 2014, fosse anulado.
Em setembro de 2016, A 4ª Câmara Criminal do TJ-SP afirmou não haver elementos capazes de demonstrar quais foram os crimes cometidos por cada um dos agentes. Diante da decisão do STJ, a advogada que defende os policiais, Ieda Ribeiro de Souza, garante que levará o caso para a Suprema Corte, mas não informou quando fará isso. “Estou dentro do prazo”, garante.
Grupos de defesa dos direitos humanos comemoraram o posicionamento do STJ e veem a ação como algo que possa ajudar na condenação definitiva dos PMs que participaram da invasão ao presídio. Para debater o tema, a Frente Estadual pelo Desencarceramento promove uma aula pública na tarde deste sábado (2/10), às 14h30, na Praça do Ciclista, na Avenida Paulista, região central de São Paulo.
“A decisão anterior do TJ SP era uma verdadeira afronta à luta pela efetivação dos direitos humanos no Brasil. A decisão do TJ abria ainda mais precedentes para a ampliação dos já altos índices de violência e letalidade nas ações policiais em São Paulo e no Brasil, sob o falso argumento de ‘legítima defesa’”, comenta Ariel de Castro Alves, advogado e presidente do grupo Tortura Nunca Mais. “O que se espera é que o TJ de São Paulo garanta efetividade a essa decisão do STJ, e os condenados sejam presos e cumpram suas penas”, completa.
Próximo a completar quase 30 anos, que também é tempo máximo para que uma pessoa cumpra pena no Brasil, o massacre do Carandiru provoca revolta e aumenta sentimento de impunidade para aqueles que vivenciaram aqueles momentos de terror. É o caso de Sidney Sales, atualmente pastor evangélico, que conseguiu sair com vida da Casa de Detenção do Carandiru naquele dia.
“O sentimento que tenho é o de injustiça. Existe lei para o negro da periferia, para aquele que rouba um litro de leite para matar a fome de um filho, mas para esses policiais a lei não é a mesma. Pode ver que a grande maioria que estava envolvido naquele dia saiu da rua e foi fazer trabalho administrativo dentro do quartéis”.
Extenso, lento e ineficaz
Todos que acompanham o julgamento dos policiais acusados de matar mais de uma centena de homens concordam em um mesmo ponto: a morosidade do caso. Com quase três décadas, mais de 200 volumes, uma série de recursos e solicitações tanto da defesa quanto da acusação, o julgamento do massacre do Carandiru é um processo sem precedentes dentro da história do direito no país.
“Teve recurso que demorou dez anos para ser julgado, habeas corpus que durou mais oito. Eu não tenho ideia de quanto tempo mais vai durar esse julgamento. Eu não esperava que esses recursos demorassem tanto. É um processo único no Brasil e que eu não tenho conhecimento que haja algo parecido no mundo”, comenta a advogada Ieda Ribeiro de Souza, que está no caso defendendo os policiais desde 1996.
Durante esses 29 anos a legislação brasileira mudou e para Iara Ribeiro esse também é um dos motivos para a lentidão. “O caso saiu da Justiça Militar para a Justiça Comum. Se estivesse na militar já teria sido julgado”, diz a advogada que atualmente defende apenas policiais da Rota que atuaram no 1º e 2º andar do Pavilhão 9. Dos 79 policiais que foram acusados de participarem do massacre, 15 já morreram. Por conta do número de réus, a o caso em quatro partes, cada um correspondendo a um andar do presídio que foi invadido.
Convertido ao protestantismo, Sidney Sales crê que a justiça dos homens pode demorar, mas a divina já começou agir há algum tempo. “Já faz quase 30 anos que tudo aconteceu e desde então eu digo que Deus começou a fazer justiça quando aquelas pessoas que foram responsáveis, que foi o Ismael Pedrosa, que era o diretor da penitenciária e foi assassinado, e o coronel Ubiratan, que foi morto pela própria esposa”.