Carta deixada em apostila ainda traz ataque político: “petista viado arrombado do caralho. Você vai sangrar feito um porco”
Rafael Pinheiro de Godoy, de 32 anos, ainda não sabe se continuará morando em Várzea Grande, na região metropolitana de Cuiabá, capita do Mato Grosso, após sofrer ameaças de morte de cunho homofóbico e político na faculdade onde faz o curso de Direito. Nesta terça-feira (18/10), uma apostila do estudante apareceu com xingamentos e desenhos pornográficos rabiscados nas páginas, além de uma carta anônima com as intimidações.
A mensagem contra Godoy inicia estipulando uma data para que ele saia da cidade e faz menção a sua orientação sexual e posicionamento político. “Você tem o prazo de até o fim do mês para ir embora, petista viado arrombado do caralho”, diz a primeira frase do texto. “Você vai sangrar feito um porco. Você e essa sua raça vai morrer um por um, defensor de bandido, defensor de estuprador, petista vagabundo”, diz outro trecho da carta.
Rafael diz que na turma de direito da União das Faculdades Católicas de Mato Grosso (Unifacc-MT) sempre houveram discussões acaloradas sobre política e, dentre os mais de 40 estudantes da sala, apenas ele e mais dois se posicionam contra o governo Bolsonaro (PL).
“Grande parte das ameaças da carta parte da homofobia, mas ali também existem menções políticas. Sempre fui muito enfático nos meus posicionamentos”, garante o estudante que não é filiado a nenhum partido político e defende a causa LGBT há mais de 15 anos.
“Sempre ouvi vários comentários homofóbicos durante toda a minha vida e deixava passar, mas nada foi tão grave como aconteceu agora”, conta o aluno, que afirma não ter ideia de quem tenha sido o autor das ameaças.
Segundo Rafael, assim que descobriu o material que o ameaçava entrou em contato com a coordenação do curso, que no primeiro momento não soube como tratar da situação, mas que a partir do dia seguinte colocou à sua disposição.
Solidão e medo
A decisão de deixar Jundiaí, no interior paulista, para ir morar na cidade matogrossense tinha como objetivo uma mudança de vida. Em menos de dois anos Rafael perdeu o pai e mãe, e no começo de 2022 decidiu ir para Várzea Grande para se dedicar aos estudos.
Quem fez as ameaças ao estudante sabia de detalhes da vida dele. A morte dos pais e os nomes deles são citados nas ameaças, assim como dados pessoais como número de RG e CPF, além do endereço antigo dele. “Eu nunca fiz nenhum tipo de cadastro em lugar nenhum desde que vim morar aqui, exceto quando fiz a matrícula da faculdade”, conta Rafael.
“Não voltei às aulas desde que tudo ocorreu. Estou perdido sem saber o que fazer da vida daqui pra frente. Estou com muito medo porque sou sozinho na cidade, não tenho parente e nem uma rede de amigos que possa me acolher”, desabafa.
Ele revela que poucas colegas de turma o procuram depois do episódio para dar algum tipo de acolhimento e que a maioria entra em contato mais pela curiosidade de saber como tudo aconteceu.
“A polarização política é algo muito grave. Setores da sociedade que já são homofóbicos erstão tendo a ousadia de achar que é normal discriminar uma pessoa pela cor da pele, pela raça, etnia ou orientação sexual. Nós temos que combater com base na Constituição federal e no estado de direito”, afirma Toni Reis, diretor-presidente da Aliança Nacional LGBTI+. A organização está prestando apoio jurídico e psicológico para o estudante.
Outro lado
A Ponte não conseguiu contato com a Unifacc e questionou a Secretaria de Segurança Pública de Mato Grosso sobre a investigação das ameaças sofridas por Rafael Godoy, mas até o momento não obteve resposta.