Para promotoria, acusados cometeram lesão corporal, ameaça e constrangimento ilegal, já que a vítima foi exposta de maneira humilhante em dois vídeos

Presos no dia 9 de junho, o pedreiro Ronildo Moreira de Araújo, 29 anos, e o tatuador Maycon Wesley Carvalho dos Reis, 27, que tatuaram a frase “eu sou ladrão e vacilão” na testa de um adolescente, foram denunciados pelo MPSP (Ministério Público do Estado de São Paulo), na quarta-feira (21/6).
De acordo com o MP, os dois homens são acusados de ofender a integridade corporal ou a saúde da vítima de forma permanente (artigo 129, §2º, artigo IV do Código Penal); de constrangê-la, “mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a não fazer o que a lei manda” (artigo 146) e de ameaçá-la, “por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave” (artigo 147).
O garoto sofreu a agressão depois de ser apontado como suspeito de uma tentativa de furto da bicicleta de um dos acusados. A tortura foi feita em um dos cômodos da pensão onde os dois vivem. Além de tatuarem a testa do jovem, eles gravaram vídeos em que o adolescente é obrigado a dizer que gostou da tatuagem.

Oferecida pela promotora de Justiça Giovana Ortolano Guerreiro Garcia, a denúncia foi apresentada à 5ª Vara Criminal de São Bernardo do Campo, no ABC (SP), cidade onde o crime aconteceu, no dia 31 de maio.
O jovem de 17 anos que foi torturado por Araújo e Reis ficou desaparecido entre o dia do crime e o dia 10 de junho, quando foi encontrado, depois que uma foto e dois vídeos em que ele aparece com a frase tatuada na testa viralizaram nas redes sociais. À Polícia Civil, Araújo e Reis admitiram que torturaram o jovem depois de suspeitarem de que ele havia furtado uma bicicleta.
Questionada pela reportagem sobre a razão pela qual os dois homens foram denunciados por lesão corporal, constrangimento ilegal e ameaça, que não são crimes hediondos, e não por tortura, Garcia explicou, por meio da assessoria de imprensa do MPSP, que, “em toda a doutrina e jurisprudência analisada pela promotora não foi possível enquadrar o ocorrido no artigo que descreve o crime de tortura, porque este possui requisitos específicos que não poderiam ser aplicados aos fatos”.
“Quanto às afirmações de que a pena seria leve, toda a gravidade e circunstâncias dos crimes pelos quais foram denunciados serão levadas em conta para a definição da pena pelo Tribunal de Justiça”, afirmou ainda a promotora.
Para o advogado Ariel de Castro Alves, conselheiro do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), o fato de o MP não ter denunciado Araújo e Reis por tortura “é um retrocesso, já que a tortura é considerada crime hediondo” e os crimes pelos quais eles foram denunciados, não. “No entanto, na somatória das penas desses três crimes, o tempo de prisão pode ser maior. Mas se eles conseguirem absolvição de alguns dos crimes, como os de ameaça e constrangimento ilegal, e forem condenados apenas por lesão corporal, podem ter benefícios quanto ao
cumprimento de pena”, pondera.
“Na tortura o início de cumprimento de pena é em regime fechado por ser crime hediondo, na lesão corporal não. Além disso já podem conseguir o benefício de responder ao processo em liberdade. Seria mais difícil conseguirem esse benefício se fossem processados por tortura, por ser crime hediondo”, completa Alves.