Gilson Terra estava em carro da Prefeitura de SP quando homens em veículo prata atiraram com fuzil; há suspeita de que ex-PM teria envolvimento com o PCC
Homens com fuzil executaram um ex-PM (Policial Militar) na manhã desta quinta-feira (7/3) em São Paulo. Gilson Terra era suspeito de integrar um grupo de matadores de aluguel chamado “A Firma”, formado por ex-policiais militares e civis que executava policiais e advogados. Há suspeita dele ter ligações com o crime organizado.
Terra estava em um carro da Prefeitura de São Paulo que presta serviços para a secretaria de transportes. Na avenida Ragueb Chohfi, em São Mateus, zona leste de São Paulo, outro carro, de cor prata, emparelhou e os homens o fuzilaram. Ao menos três tiros acertaram Terra, um deles no rosto, e ele morreu na hora. Outros dois homens estavam com ele no veículo, foram baleados e socorridos. Eles não correm risco.
Existem duas frentes na investigação sobre a execução do ex-PM Terra, considerado um “clínica-geral” no submundo do crime: aquele que não tem lado e faz qualquer negócio por dinheiro.
A primeira: vingança por participação nas mortes de Cláudio Roberto Ferreira, o Galo Cego, e de Wagner Ferreira da Silva, o Cabelo Duro, ambos integrantes da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital). Cabelo Duro foi executado, também com tiros de fuzil, na porta de um hotel na zona leste de São Paulo, em fevereiro de 2018. Galo Cego foi morto em 23 de julho de 2018, também com tiros de fuzil, na zona leste paulistana.
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A segunda frente tenta descobrir a possível ligação do ex-PM Terra com uma negociação de cocaína pura pertencente a Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho, que, das ruas, atua como braço direito de Marco Willians Herbas Camacho, apontado pelo Ministério Público como chefe do PCC – transferido de São Paulo para penitenciária federal em Rondônia no mês passado.
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Fuminho, que atua no Peru e Bolívia, teria enviado um carregamento de drogas para Terra que, depois, revendeu o mesmo entorpecente para o braço direito de Marcola. A droga teria sido “batizada” e perdido grau de pureza, o que causou a ira do PCC.
Em 2010, o MP (Ministério Público) investigou o ex-PM Terra em uma lista de pelo menos dez suspeitos de cometerem assassinatos sob encomenda. O órgão sustentava na época que as execuções derivavam de acerto de contas por jogos de azar, como bingos, caça-níqueis e o jogo do bicho, e cada morte custava de R$ 30 mil até R$ 50 mil.
À época, o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), do MP, apontava informalmente que o ex-PM Luiz Roberto Martins Gavião, sócio de uma empresa de segurança, seria o líder do grupo – ele era considerado foragido. Gavião dividia o comando da empresa com o ex-delegado Paulo Sérgio Óppido Fleury, que foi demitido da polícia em 2010 por irregularidades administrativas.
O órgão considerava que o grupo envolvia funcionários de Gavião e Fleury nesta empresa, entre eles o ex-PM Jairo Ramos dos Santos, acusado de trocar tiros com o policial civil Douglas Yamashita, que investigava o roubo de centenas de armas de um clube de tiro.
Jairo dos Santos é assassino confesso de oito pessoas, entre policiais e empresários, crimes cometidos pela quadrilha com fuzil de calibre .223. Os PMs Gilson Terra, Paulo Cesar Reiche e Gilmar Matias dos Santos tinham ligações com Gavião, segundo investigação do Gaeco.
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Outra morte, a do ex-policial militar Eudes Aparecido Meneses, de 52 anos, em abril de 2018, é envolvida ao grupo. Menezes se intitulava matador de bandido, mercenário da Guerra do Iraque e autor de 54 mortes. Após receber um telefonema em casa em 4 de abril, saiu e foi baleado com tiros de .40. Segundo a investigação, Meneses foi demitido da PM em 2001. Ele teria envolvimento com a exploração de máquinas caça-níqueis.
Em setembro de 2016, o ex-PM Terra foi condenado a 12 anos de prisão pela morte do advogado Paulo Clélio de Almeida, que teria envolvimento com o crime organizado. Ele foi morto com 20 tiros em março de 2012, após sua casa ser roubada e suspeitar da ação de PMs. Terra foi reconhecido por testemunhas e, segundo a Polícia Civil, ele participou ativamente do homicídio do advogado. O ex-PM recorria da sentença em liberdade.
Terra teria envolvimento com Fuminho, braço direito de Marcola, apontado pelo MP como líder máximo da facção – transferido de São Paulo para penitenciária federal em Rondônia no mês passado. Fuminho, que atua no Peru e Bolívia, teria enviado um carregamento de drogas para Terra que, depois, revendeu o mesmo entorpecente para o braço direito de Marcola. Ele e outros envolvidos teriam sido jurados, termo usado para quem deve ser morto pelo PCC.
Familiares do ex-PM Terra estiveram no local da execução dele e disseram para policiais que ele estava preocupado por conta da morte de dois ex-PMs, Nunão e Tchelão, que também teriam envolvimento com a facção e faziam serviços similares ao seu.
A Ponte entrou em contato com a SSP (Secretaria da Segurança Pública), comandada pelo general João Camilo Pires de Campos, e com a PM para solicitar informações sobre a execução do ex-PM Terra e sobre o motivo e a data em que Gilson Terra foi desligado da PM. Segundo a pasta, a “vítima fatal foi soldado da PM, mas foi demitido, em 2013, por envolvimento com roubo”. ” O caso está sendo registrado pelo 54 º Distrito Policial (Tiradentes), que já solicitou as imagens das câmeras de segurança próximas ao local. Uma pessoa morreu e duas foram socorridas à hospitais da região. O Departamento Estadual de Proteção à Pessoa foi acionado e deve dar prosseguimento as investigações”, explicou a SSP.
A reportagem acionou a Prefeitura de São Paulo para explicar o que Gilson Terra fazia em um veículo oficial do município. Segundo explicado pela assessoria de imprensa da SPTrans em telefonema para a reportagem, não se tratava de um veículo oficial da Prefeitura e o ex-PM Terra não integrava o quadro de funcionários. Em nota, no entanto, o setor de mobilidade e transportes de SP apenas explicou que “irá colaborar com as investigações policiais no que estiver ao seu alcance”.
Ainda no telefonema, o funcionário da SPTrans informou que a SPUrbanuss (Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo) seria responsável por mais explicações pois o veículo em que Gilson Terra estava tinha adesivos no padrão da Via Sul, uma das empresas vinculadas à Urbanuss. A Ponte solicitou explicações ao sindicato, que enviou a seguinte nota:
“A Via Sul, por meio do SPUrbanuss (Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo), informa que contratou serviço de apoio operacional para a área de atuação, visando melhorar seu atendimento nas principais linhas do local. A ronda era feita por carro próprio do serviço de apoio, terceirizado. A Via Sul lamenta profundamente o ocorrido e espera a solução do caso pelas autoridades competentes, confiando no trabalho da polícia”, diz a Via Sul, sem detalhar quem é a empresa terceirizada responsável pelo serviço de segurança.