José Carlos Dias, integrante da Comissão Arns, assina documento que pede que Tribunal Penal Internacional investigue denúncia de genocídio dos índios.
Evitar um extermínio indígena. Este é o objetivo segundo os idealizadores de uma petição que denuncia internacionalmente o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por supostamente incentivar o genocídio do povo indígena. Documento feito pela Comissão Arns em conjunto com o CADHu (Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos) e enviado nesta quarta-feira (27/11) cobra uma avaliação e futura investigação do TPI (Tribunal Penal Internacional).
A acusação tem como base falas de Bolsonaro e iniciativas tomadas ou omitidas pelo poder público, como a ausência de combate aos incêndios na Amazônia, ações de enfraquecimento de instituições que fazem o controle e fiscalização de invasões a terras indígenas, por exemplo. Também está incluído especificamente o Dia do Fogo, quando se teve um chamado para uma série de queimadas promovidas por madeireiros ilegais em 10 de agosto de 2019.
O Tribunal sediado em Haia, na Holanda, foi criado em 2002 junto do Estatuto de Roma, ao qual o Brasil é signatário. Cabe ao TPI investigar denúncias sobre supostos crimes contra uma sociedade cometidos por pessoas específicas, como chefes de estado. O órgão internacional já investigou políticos como o ditador líbio Muamar Kadafi por crimes contra a humanidade em protestos ocorridos no país em 2011. O Tribunal determinou a prisão de Kadafi junto com a de seu filho, Saif al-Islam, e o chefe da inteligência local, Abdullah al-Sanoussi.
Além do genocídio também estão tipificados sob cobertura de análise do TPI crimes de guerra, contra a humanidade e crime de agressão. O objetivo da ação contra Bolsonaro, segundo os idealizadores, é fazer com que uma investigação seja iniciada para verificar se o ex-capitão do Exército comete, de fato, um genocídio.
Para isso, o TPI terá como base a sustentação da Comissão e solicitará informações a órgãos brasileiros, tanto oficiais quanto ONG (Organizações Não-Governamentais) para analisar se os elementos são suficientes para iniciar a apuração solicitada. Este trabalho ficará a cargo da chefe da procuradoria do Tribunal, Fatou Bensouda, a quem o documento foi enviado oficialmente. Caso a resposta seja positiva, aí a investigação tem início.
Segundo José Carlos Dias, presidente da Comissão Arms e ex-ministro da Justiça, a denúncia internacional faz parte do “nosso papel de defender os índios que estão perecendo”, chamando os índio de “irmãos”. “O direito deles é permanecer índios dentro das suas culturas, suas regiões, vivendo aquilo que é o seu cotidiano. Isso não pode ser imprimido, objeto de extermínio por parte do governo e é o que está acontecendo”, continua.
Segundo a advogada Eloísa Machado, professora da FGV (Fundação Getúlio Vargas), as ações e omissões contra os índios são as mais claras de perseguição cometidas pelo governo Bolsonaro. “É a área, talvez, que esteja mais claro esse ataque sistemático, essa incitação contra um modo de vida particular. Ele [Bolsonaro] opõe isso ao que na cabeça dele é o interesse nacional, o que na cabeça dele significa desenvolvimento e não podemos permitir que isso aconteça”, explica advogada, que também assina a petição.
Para o ex-ministro, o genocídio do povo indígena não é o único motivo para Bolsonaro ser denunciado ao mundo. “Se eu pudesse, faria tomando o governo dele como um todo, mas nós temos que particularizar. E aqui concretamente estamos defendendo a civilização indígena”, explica Dias. “Temos que externar a nossa indignação contra esses atos de ódio e mostrar a força que resta de nós em termos de sociedade civil”, continua José Carlos Dias.
Sua avaliação inclui fala autoritárias vindas de um dos filhos do presidente, o deputado federal por São Paulo Eduardo Bolsonaro, e do ministro da Economia, Paulo Guedes, incitando a criação de um novo AI-5 (Ato Institucional). A referência clara ao período da ditadura militar em que os direitos fundamentais foram retirados e pessoas foram mortas pelo governo militar surgiu após a liberdade do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, quando Eduardo citou uma ação caso “esquerda se radicalizar”, ou se o país registrar protestos de rua como os ocorridos recentemente na Colômbia, Chile e Bolívia.
“Isso, por parte do deputado, quebra de decoro [parlamentar], merece uma punição dentro da própria Câmara Federal. Com referência à fala do ministro, podemos é deplorar que ele tenha a coragem de dizer isso”, define Dias. “Nós rememorarmos aquele momento que foi um dos momentos mais doloridos da história do Brasil, que foi a promulgação do AI-5. Falar do AI-5, para mim, é palavrão”, continua.