Balanço da Rede de Observatórios da Violência mostra que operações policiais deixaram 201 mortos no período de 10 meses de 2018 e, no ano passado, foram 387 casos
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Desde que assumiu o governo do Rio de Janeiro, há um ano, Wilson Witzel (PSC) adotou uma postura pública com relação à política de segurança pública de “atirar na cabecinha“. O resultado foi que a polícia matou 92% a mais no ano passado em comparação com 2018, segundo levantamento da Rede de Observatórios da Segurança.
O aumento é relativo aos dez meses analisados, de março a dezembro de 2018 e 2019. A escolha do período, de acordo com o Observatório, é para conversar com os dados gerados pelo relatório do Observatório da Intervenção, que começou em fevereiro de 2018.
Outro dado alarmante é o aumento no número de operações policiais no estado do Rio de Janeiro. De acordo com o estudo, de janeiro a dezembro de 2019, 1.296 operações foram realizadas, com um total de 387 mortes. Ou seja, uma morte a cada 3,3 operações. Em 2018, foram 201 mortes em 711 operações.
O número de mortes em ações da polícia também subiu. Segundo dados do ISP (Instituto de Segurança Pública), em 2018, o número de mortes na capital do Rio de Janeiro foi de 558 e subiu para 724 no último ano, aumento de 29,7%. Na Grande Niterói, o aumento foi de 45,2%: foram 241 mortes, em 2018, e 350, em 2019.
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O levantamento mostra que as polícias atuaram separadas na maior parte do tempo em 2019: 91% das operações envolveram apenas uma força policial. Das 1.296 operações, 63 utilizaram helicópteros, que em mais de um momento contou com apoio in loco do governador.
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Denúncia contra ‘política de massacre’ de Wilson Witzel chega à ONU
Em maio de 2019, Witzel já havia sido denunciado à ONU (Organização das Nações Unidas) pela pela Comissão de Direitos Humanos da Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro) por sua “política de massacre“.
À Ponte, em junho de 2019, a presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alerj, a deputada estadual Renata Souza, relatou as dificuldades de enfrentar o projeto que ela define como assassino do governador do Rio. Um estudo anterior do Observatório, divulgado em julho de 2019, analisou os primeiros seis meses de Governo Witzel e já apontava para uma crescente violência nas operações policiais.
A cientista social Silvia Ramos, coordenadora da Rede de Observatórios de Segurança Pública, do CESeC, da Universidade Cândido Mendes, explica que o aumento da letalidade policial no Rio de Janeiro é resultado de uma política de segurança sem inteligência, investigação e prevenção, baseada apenas em operações policiais.
“O que observamos no Rio de Janeiro, desde o ano da intervenção em 2018, é que uma parte muito grande das políticas de segurança passaram a ser operações policiais. Com o governo Witzel, temos uma impressão de que toda política de segurança é operação policial. Restaram poucas ações policiais com estratégias e iniciativas que não sejam operações. Quando a gente vê a polícia ela está fazendo operação policial”, aponta a pesquisadora.
Ramos conta que o aumento de 92% na letalidade policial surpreendeu a Rede de Observatórios da Segurança. “O ano anterior tinha sido o ano da intervenção [federal], e o ano da intervenção tinha se caracterizado por essa coisa que era o exército na rua, com milhares de efetivos novos chegando. Tínhamos tido a impressão de que essa política de operação policial tinha chegado ao seu ápice. Mas, para a nossa surpresa, ela aumentou em números de operações e letalidade policial. A cada três operações policiais temos um morto”.
Para Silvia, uma política centrada em operações policiais vai contra os princípios da própria polícia. “No mundo inteiro as polícias usam uma premissa: maior produtividade com a menor letalidade. No Rio de Janeiro parece que as polícias transformaram esse lema em muita letalidade independentemente de produtividade”, critica.
O principal motivo para o aumento da letalidade, afirma Silvia, está no comportamento do governador Wilson Witzel. “Começa com o lado mais ideológico, em que o governador diz essas coisas [como atirar na cabecinha], e depois tem uma cena performática que é o governador sobrevoando Angra dos Reis em um helicóptero de onde saía tiros”, argumenta
“Isso é muito grave, é como se o governador tivesse participando dessa operação, que usa helicópteros como plataforma de tiros sobre populações civis. Isso vai crescendo até o caso da Ágatha [Félix, menina de 8 anos morta no Complexo do Alemão durante operação policial], em que vão aumentando o número de mortes de crianças”, crava Ramos.
A prevenção, argumenta a pesquisadora, é o melhor caminho para diminuição da letalidade policial. “Uma em cada três mortes é causada pela polícia. A média é de 30%. Será que nós estamos seguindo uma política de segurança em que policiais serão responsáveis por tantas mortes no estado? É isso que esse governo tem que responder”, provoca.
A Ponte questionou o governo do Rio de Janeiro sobre os dados apresentados pela Rede de Observatórios da Violência, mas não obteve retorno até a publicação da reportagem.
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