Projeto voluntário confecciona mais de 2 mil máscaras na Baixada Santista

    Ação “Máscaras para Todas” produz itens que são entregues gratuitamente a postos de saúde, hospitais e instituições de caridade da região

    Máscaras e folheto com instruções, distribuídos por voluntários | Foto: Amanda Augusto

    Foi a partir do pedido de ajuda feito por uma tia, com o desejo de contribuir com grupos que produzissem máscaras faciais contra a Covid-19, que Larissa Doin Pogrebinschi entrou em contato com a frente de costura voluntária ligada ao Hospital Santa Marcelina, situado na capital paulista. 

    Estudante de medicina da faculdade veiculada ao hospital, Larissa começou a acompanhar a organização da frente por mensagens no Whatsapp e pensou em fazer algo parecido na região da Baixada Santista – onde trabalha o médico residente Anderson Lourenço, seu namorado.

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    “No dia em que o Ministério da Saúde orientou sobre a importância de toda a população usar máscaras, eu e minha mãe passamos a madrugada comprando material e começamos a buscar voluntários”, conta Larissa, apaixonada por medicina de família e comunidade.

    Máscaras e folheto com instruções, distribuídos por voluntários | Foto: Amanda Augusto

    Foi assim que nasceu o projeto “Máscara para todos”, que produz e entrega gratuitamente máscaras de proteção e conta com mais de 40 voluntários das cidades de Santos, Guarujá, São Vicente e Praia Grande – todas situadas no litoral sul de São Paulo. 

    Há ainda voluntários que moram na cidade de São Paulo e contribuem virtualmente com a organização e a divulgação do projeto, como é o caso de Mariana Bresciani, que elaborou a identidade visual do projeto. 

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    “Fui retirada do estágio devido à falta de equipamentos de proteção. Mas muita gente precisa permanecer atendendo as pessoas. Isso me motivou a participar do projeto e ajudar quem não tem o mesmo privilégio que eu, de poder  ficar em casa”, conta a estudante de Medicina.

    Em quase um mês, o projeto entregou cerca de 2.120 máscaras para diferentes instituições na Baixada Santista, desde postos de saúde até abrigos emergenciais e instituições de caridade.

    Beneficiários do projeto

    Um dos beneficiários do projeto foi um abrigo emergencial que acolhe 60 pessoas em vulnerabilidade social. O abrigo foi organizado durante a quarentena na escola municipal Augusto de Saint Hilaire, na cidade de São Vicente, cujas aulas se encontram suspensas. O abrigo recebeu 260 máscaras do projeto.

    “As máscaras dão maior tranquilidade para quem mora e para quem trabalha ali. Essas pessoas se sentem cuidadas e isso ajuda na recuperação daquelas socialmente vulneráveis”, afirma Esdras Nascimento, um dos responsáveis pelo abrigo que funciona a partir de recursos da prefeitura da cidade, além  de doações e do trabalho de voluntários.

    Voluntários do projeto entregam máscara no abrigo emergencial criado em escola municipal, em São Vicente | Foto: Arquivo do projeto “Máscara para todos”

    O posto de saúde Usafa Mirim II, na Praia Grande, recebeu 700 máscaras do projeto e as distribuiu para pacientes da própria unidade e de um Pronto Socorro no município.

    De acordo com Telma Guimarães, diretora do Usafa Mirim II, as agentes comunitárias desse posto já haviam começado a produzir máscaras quando foram procuradas pelo projeto “Máscara para todos”. 

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    “Nós tínhamos gente para costurar e eles tinham o material. Aí fizemos essa parceria. Trabalhamos em uma região socialmente vulnerável e começamos a conscientizar a população quando o uso de máscaras ainda não era obrigatório. Hoje, a maioria dos pacientes vem para o posto usando máscara”, afirma Telma.

    “Aprendi a costurar em dez dias”

    A procura por voluntários e doações para comprar materiais começou a partir de mensagens compartilhadas em redes sociais. Em alguns dias, inúmeras pessoas de diferentes regiões da Baixada Santista entraram em contato com a equipe para contribuir com o projeto. 

    Esse foi o caso da comerciante Jéssica Seixeira, de 37 anos. Ao ver uma mensagem sobre o projeto em um grupo de moradores da Praia Grande, Jéssica entrou em contato imediatamente. 

    Entrega de máscaras por voluntários do projeto em posto de saúde da Praia Grande | Foto: Amanda Augusto

    “Comecei cortando tecidos e aprendi a costurar em dez dias”, conta ela, que hoje atua como coordenadora do projeto na Praia Grande. Além disso, ela também cedeu um espaço na própria casa para armazenar os materiais e estocar as máscaras antes destas serem enviadas para a esterilização.

    Na quarentena, Jéssica teve que parar de trabalhar e, ao sentir sintomas de gripe, precisou se isolar da família, especialmente de um dos filhos que é asmático e, por isso, está no grupo de risco da Covid-19. “O projeto me ajudou a ocupar a mente e fazer alguma coisa durante a pandemia. Foi importante para eu não ficar entediada e ansiosa”, afirma ela.

    Outra voluntária é a dona de casa Selma Lapetina, de 56 anos. Moradora de Santos, ela soube do projeto a partir de mensagens compartilhadas por vizinhos. “Desde o início da pandemia, eu tinha vontade de contribuir com o meu tempo para alguma iniciativa contra a Covid”, conta Selma. 

    Sem saber costurar, ela se voluntariou para cortar os tecidos. Em poucos dias, seu marido Silvio, que atua como gerente comercial e está em férias coletivas pela empresa, também começou a cortar tecidos. Ambos também ajudaram a otimizar o uso de materiais e produziram vídeos com instruções para uniformizar o corte dos tecidos.

    Selma e Silvio Lapetina cortando tecidos para a confecção de máscaras | Foto: Letícia Caramez

    “É muito bom trabalhar com o projeto, ajuda a passar o tempo e nos sentimos útil. É muito gratificante ver as máscaras sendo entregues e ver que cada uma delas tem um pouco da gente. Sempre tem um lugar no mundo onde cabe a nossa doação”,  conta Selma.

    O músico Sérgio Spínola, de 43 anos, foi o primeiro integrante do projeto. Ele é um dos responsáveis pelo transporte dos materiais e pela entrega das máscaras prontas. Morador da Praia Grande, Marcelo já foi até as cidades de São Paulo, Mogi das Cruzes e São Caetano para comprar materiais que não puderam ser adquiridos virtualmente. 

    Perguntado pela Ponte se não sente medo ao sair nas ruas, ele diz que os voluntários do transporte tomam os cuidados necessários antes de sair de casa e ao retornar, além de respeitar o distanciamento social e usar o álcool gel com frequência.

    Priscila Patrus, Marcelo Spinola e Larissa Doin, voluntários do projeto Máscara para todos, após live que divulgou o projeto | Foto: arquivo pessoal

    “Aquele medo que nos protege sempre tem. O medo paralisante não. Procurar brecar ao máximo é contaminação acaba sendo uma proteção para mim mesmo também”, diz Marcelo.

    No dia 26 de Abril, o músico comemorou o aniversário fazendo uma live divulgando o projeto. “Algumas pessoas que conhecem o meu trabalho estavam pedindo e prometi que tocaria no meu aniversário. Aproveitei para divulgar e tentar conseguir novos colaboradores”, conta ele.

    Etapas de produção

    A confecção de máscaras pelo projeto “Máscaras para todos” é dividida em algumas etapas. Primeiro, as doações de materiais ou de dinheiro para comprá-los. Em seguida, dois voluntários entregam os materiais para quem vai cortar os tecidos e, em seguida, para quem é responsável pela costura.

    Após serem costuradas, as máscaras são esterilizadas e colocadas, em pares, em uma embalagem de plástico. No lado externo dela, é grampeado um folheto contendo instruções de lavagem e um molde que serve como base para novas máscaras. 

    Sônia Andrea, professora e voluntária de costura do projeto Máscara para Todos | Foto: Caroline Andrea

    “A ideia é incentivar a autonomia das pessoas em produzir as próprias máscaras manualmente, com linhas, agulha e tecidos que elas já tenham em casa, além do elástico extra enviado com os kits”, diz Larissa. 

    Desafios

    Na primeira semana de Maio, serão entregues 300 kits de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) para profissionais de postos de saúde, pronto socorro e hospitais de campanha situados na Baixada Santista. 

    Cada kit de EPI trará quatro máscaras laváveis e um escudo facial feito com placas de acetato. O objetivo é fornecer nas próximas semanas um total de 1500 kits de EPI’s, que serão produzidos conforme ocorram doações. De acordo com coordenadores do projeto, cada EPI é capaz de proteger um profissional de saúde que atua na “linha de frente” e custa R$ 10,85.

    Voluntária Helaine Caramez testando o escudo facial que será entregue pelo projeto a profissionais de saúde | Foto: Letícia Caramez

    Entre os desafios do projeto “Máscara para todos”, está a organização da logística de distribuição de materiais e máscaras e a busca por mais doações e voluntários – especialmente para a costura e esterilização. 

    A Secretaria Municipal de Saúde da Praia Grande autorizou a desinfecção das máscaras em alguns postos de saúde da cidade. Contudo, segundo coordenadores do projeto, o volume de até três mil máscaras produzidas semanalmente pelos voluntários hoje excede a capacidade de esterilização desses postos. 

    “Além de mais doações e pessoas para a costura, precisamos de hospitais, dentistas e lavanderias voluntárias que nos ajudem a esterilizar as máscaras”, afirma Larissa. Quem quiser contribuir, deve entrar em contato com os organizadores a partir das redes sociais do projeto.

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