Para modelo carioca, a beleza brasileira é trans e negra: “belezas como a minha precisam ser desmistificadas e reconhecidas como belas”
Aos 27 anos, a modelo Eloá Rodrigues vive um sonho, que não é só dela, é coletivo. Travesti negra, ela foi coroada a Miss Beleza T Brasil no último sábado (24/10) em um evento em São Paulo. Cria de São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro, Eloá foi campeã do Miss Beleza Trans Rio de Janeiro em 2019 e 2020. Agora começa a preparação para representar o país na Tailândia no Miss Internacional Queen, uma espécie de Miss Universo Trans.
Para abraçar esse título, Eloá concorreu com 22 candidatas. Deixou para trás no pódio as modelos Luna Ventura, representando Minas Gerais, e Raquel Eshilley, representando o Pará. Depois da coroação, Eloá recebeu diversas mensagens, no post do Miss Beleza T Brasil no Instagram, deslegitimando sua vitória.
“Por mais que eu tenha sofrido ataques racistas, eu tive muita mensagem positiva, muitas pessoas me reconhecendo com esse título. Isso não tem preço que pague. As pessoas se enxergarem em mim e ver que é possível estar nesse lugar é incrível, é transformador”, afirma em entrevista à Ponte.
Para Eloá, a beleza brasileira é trans e é negra. “As pessoas negras são maioria nesse país e eu costumo pensar na hierarquia social, da pirâmide social, em que as mulheres trans e travestis são a base para que essa pirâmide não desabe. As meninas brancas não são questionadas pela sua beleza. Belezas como a minha precisam ser desmistificadas e reconhecidas como belas”.
Para chegar até aqui e conquistar essa coroa, Eloá precisou enfrentar muitos outros desafios. Desde os 21 anos Eloá se entende travesti e sempre teve o apoio da família, mas, por outros motivos, acabou sendo expulsa de casa aos 23.
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“Eu tive uma trajetória atípica de outras pessoas trans, consegui ter alguns acessos por conta da minha família. Mas isso não impediu que eu vivesse violências simbólicas, agressões e ser expulsa de casa como a maioria das pessoas trans”, lembra.
Em 2016, em meio ao caos que vivia em sua vida, conheceu o Prepara Nem, cursinho preparatório para pessoas trans e travestis, e ingressou em Ciências Sociais na UFF (Universidade Federal Fluminense). Também foi nessa época que percebeu que na moda havia uma possibilidade de transformar sua vida e inspirar outras pessoas.
“As oportunidades apareceram na minha vida e eu consegui mostrar que era possível chegar em outros espaços. Conheci o ativismo e a militância nesse processo de me preparar para o vestibular, também conheci outras pessoas trans e isso foi incrível para eu crescer enquanto pessoa, enquanto ativista, e perceber que eu não estava sozinha no mundo”, aponta.
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Hoje, Eloá é presidenta do Conselho LGBT+ de Niterói. Apesar de vivenciar na pele as dificuldades de permanecer na universidade, um “espaço tão embranquecido”, como define, Eloá sabe a importância de resistir. “Estar na universidade não é um processo fácil, mas me mostrou como é possível criar oportunidades”.
Em 2019, concorreu pela primeira vez ao Miss Beleza T Brasil, ficando na décima colocação. A partir daí, traçou um objetivo: ser a campeã. Com um ano de preparação, conseguiu.
“Foi muito importante porque eu consegui avaliar os meus erros nesse processo. Para além da realização pessoal, tem o impacto que isso causa na comunidade onde eu vivo, seja aqui na periferia do Rio de Janeiro, na comunidade negra ou na comunidade LGBT+”.
É justamente essa representação e representatividade que motivam Eloá. “A gente tá nas ruas, tá nas esquinas, mas temos conseguido furar essa bolha e ocupar outros espaços. As pessoas vão questionar, vão tentar deslegitimar esse tipo de beleza. Por isso é muito importante reivindicar esse espaço enquanto travesti, para dizer que uma travesti pode ser um ícone de beleza, pode ser uma influencer, pode ser professora, pode estar na política. Me dizer travesti é revolucionar”.
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