Advogados pedem ao STF soltura de presos para conter coronavírus

    Presos que não tenham cometido crimes violentos e com saúde vulnerável serão beneficiados; ‘é questão humanitária, se não for aceito será trágico’, diz presidente do IDDD

    Unidade prisional em Rio Branco, no Acre | Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ

    O IDDD (Instituto de Defesa do Direito à Defesa) entrou com um pedido de liminar no STF (Supremo Tribunal Federal) solicitando a soltura de presos que não tenham cometido crimes violentos e que estejam enquadrados em grupos de riscos à contaminação por coronavírus em todo o país.

    O documento foi endereçado ao gabinete do ministro Marco Aurélio Mello e tem como iniciativa imediata o controle da proliferação da doença no sistema carcerário brasileiro. Na semana passada, a Pastoral Nacional Carcerária já havia escrito uma nota pública recomendando a mesma coisa.

    Caso o pedido seja aceito estariam entre os beneficiados: pessoas com mais de 60 anos, soropositivos para HIV, portadores de tuberculose, câncer, doenças respiratórias, cardíacas, imunodepressoras, diabéticos e portadores de outras doenças cuja preexistência indique suscetibilidade maior de agravamento do estado de saúde a partir do contágio pelo coronavírus. A liminar poderá contemplar também mulheres grávidas e as que estão amamentando.

    O órgão fala em “tragédia” caso o coronavírus atinja o sistema prisional. “As pessoas devem ficar preferencialmente distantes umas das outras, no presídio isso não é possível em razão da superlotação. O presídio é o local por excelência que reúne todas as condições adversas para que se evite a propagação do vírus”, declarou Hugo Leonardo, presidente do IDDD, em entrevista à Ponte.

    Não há um prazo para que o pedido seja julgado. De acordo com o IDDD, os presídios brasileiros têm cerca de 10 mil pessoas que cumprem pena com mais de 60 anos, sendo 1.600 delas acima de 70, consideradas mais vulneráveis à doença. Dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) do ano passado, apontam que o Brasil tem mais de 812 mil pessoas encarceradas.

    O IDDD ainda destaca que outros países, como o Irã, já libertaram mais de 100 mil presidiários na intenção de conter mortes por coronavírus.

    A liminar está nas mãos de Marco Aurélio Mello, que em 2015 foi relator de uma ação elaborada pelo Psol (Partido Socialismo e Liberdade), que julgou uma série de violações no sistema prisional. Seu resultado mais prático foi a criação de audiências de custódia em todo território nacional.

    Hugo Leonardo, afirmou que é uma questão “humanitária” a concessão de liberdade para pessoas mais vulneráveis ao vírus e mostrou preocupação caso o pedido de liminar não seja favorável. Confira:

    Ponte – Qual a intenção do pedido ao STF?

    Hugo Leonardo – O pedido é para que o ministro Marco Aurélio dê uma liminar para converter algumas prisões em prisões domiciliares. Conceder liberdades provisórias quando possível, principalmente para aquelas pessoas que tenham ou que possuam alguma situação que a coloque como grupo de risco. Pessoas com doenças crônicas, soropositivos. A gente quer que o STF determine a libertação de presos que tenham cometido crimes sem violência, presos que eventualmente sejam idosos e estejam no grupo de risco.

    Ponte – Por que Marco Aurélio deve conceder a liberdade?

    Hugo Leonardo – Isso é fundamental, porque o Estado brasileiro como um todo não pode ficar inerte e deve agir de forma a se antecipar a essa tragédia. Isso é uma medida que, todas as autoridades, cada qual em sua competência, devem ter para si. Tomar as providências imediatas no sentido de evitar que o vírus se propague. E no sistema penitenciário não é diferente.

    Ponte – Além de liberdade para alguns presos há outra pauta na liminar?

    Hugo Leonardo – Nós pedimos para que pessoas que cheguem para uma audiência de custódia tenham, dentro do possível, a concessão de liberdade provisória ou a aplicação de medidas restritivas de direitos.

    Ponte – A suspensão das visitas não aliviaria o problema?

    Hugo Leonardo – Simplesmente suspender as visitas não vai evitar uma catástrofe no sistema penitenciário. Você vai impedir a disseminação do vírus, mas efetivamente não evitar que, uma vez o vírus tendo acometido alguns dos presos ou dos agentes, a proliferação vai ser em uma alta escala, vai contaminar toda aquela população, que já padece de muita vulnerabilidade, baixíssima resistência, são mal alimentados, não tomam necessidade de sol diária para que o corpo tenha o mínimo de produção de anticorpos.

    Ponte – O IDDD consultou profissionais da saúde para realizar ação?

    Hugo Leonardo – Nós consultamos um médico infectologista apenas para confirmar essa nossa hipótese e de fato é isso. Um quadro muitíssimo preocupante e o Estado precisa fazer mais. Não basta suspender as visitas. Toda recomendação médica é para que não se tenha contato entre as pessoas e as condições carcerárias não permitem que se cumpra qualquer tipo de recomendação médica. As pessoas devem ficar preferencialmente distantes umas das outras, no presídio isso não é possível. Devem evitar lugares fechados, no presídio isso não é possível. Devem se manter em isolamento daquelas pessoas que tiveram contato com o vírus em relação a outras, no presídio isso não será possível em razão da superlotação. O presídio é o local por excelência que reúne todas as condições adversas para que se evite a propagação do vírus.

    Ponte – Se o vírus adentrar ao sistema quais as consequências?

    Hugo Leonardo – Uma verdadeira tragédia. Não tenha a menor dúvida disso. Pela rapidez da disseminação que esse vírus tem a capacidade de se propagar e a forma como os estabelecimentos estão hoje em dia haverá uma tragédia.

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