Willio Paul vendia meias no calçadão nesta quarta (14) quando agentes municipais chegaram para apreender suas mercadorias. Imigrante foi agredido com golpes de cassetete e spary de pimenta; “foi abuso por parte da guarda civil”, diz advogado
O haitiano Willio Paul, 36 anos, que trabalha como vendedor ambulante, foi agredido por guardas civis municipais de Osasco (Grande SP), durante uma ação que visava tomar as mercadorias que ele vendia. O caso ocorreu na tarde de quarta-feira (14/7) na Rua Antonio Agú, no centro da cidade.
Um vídeo gravado por uma testemunha mostra quando as mercadorias do homem negro já estão no chão e o haitiano e um dos guardas se atracam. Nesse mesmo instante, um outro agente passa a desferir golpes de cassetete contra o homem negro, que a todo momento tenta de desvencilhar. Em dado momento, surge um outro guarda que borrifa spray de pimenta contra o ambulante. Um terceiro guarda também participa das agressões. As imagens ainda flagram quando um dos guardas derruba Willio no chão e o imobiliza com um golpe de enforcamento, também conhecido como mata-leão.
A cena foi acompanhada por diversas pessoas, algumas delas gritando para que as agressões parassem. Segundo o relato dos guardas no boletim de ocorrência elaborado no 5° DP de Osasco, eles faziam patrulhamento de rotina a pé pelo calçadão quando, por volta das 14h30, visualizaram um indivíduo comercializando objetos no chão.
Segundo o autor da narrativa, o GCM Wellinton, eles “interpelaram o sujeito se ele possuía o alvará para comercialização daqueles produtos e naquele local”. Como Willio não apresentou nenhuma documentação, “iniciaram o procedimento de apreensão de produtos em situação irregular”. De acordo com o a versão apresentada ao delegado pelos funcionários municipais, ao ser informado sobre a apreensão, o haitiano “valeu-se de alguns colegas também ambulantes, os quais tentarem impedir que os guardas efetivassem a apreensão dos produtos e conduzissem Willio até o distrito”.
Sobre a agressão, o GCM explicou que o guarda de nome Cristiano foi empurrado por Willio contra uma placa de anúncio, ocasião em iniciou-se uma luta corporal entre Cristiano e Willio. O guarda que narra o ocorrido ainda sustentou que entrou na confusão “evitando que Willio pegasse a arma de seu colega e acionou reforço de seus colegas de profissão, uma vez que sentiu-se cercado por populares”.
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O boletim de ocorrência ainda cita que pesquisa realizada no celular de Willio constatou que que o aparelho em sua posse possuía queixa de furto, conforme boletim de ocorrência eletrônico.
Após tomar conhecimento das agressões e da detenção, Willio Paul recebeu ajuda do vereador Emerson Osasco (Rede) e do advogado criminalista Renan Bohus. “Emerson me ligou relatando um abuso policial. Cheguei na delegacia e comecei a acompanhar um haitiano, que tinha sido preso pelo crime de resistência”, contou Bohus.
O advogado detalhou à Ponte como tudo ocorreu. “Nós apuramos que esse haitiano vende meias no calçadão de Osasco. Momento que a Guarda Civil Municipal foi fazer a apreensão dessas meias, porque ele não tinha licença para vender meias. O haitiano pediu para que não levassem as meias, em meio esse diálogo, houve um abuso por parte da guarda, que acabou agredindo o haitiano. Um segura, um passa uma rasteira e o terceiro começa a agredir ele de forma covarde, agredindo com cassetete”.
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Bohus então detalhou a reação do ambulante. “O haitiano, naquele momento, tentando evitar que houvesse a apreensão, inclusive pedindo para que não levassem as meias embora, foi detido e encaminhado para delegacia pelo crime de resistência. Chegando lá, ele deu a versão dele e os guardas deram uma versão totalmente desconexa dos fatos, basta analisar o vídeo para tirar a própria conclusão”.
Sobre o celular que consta como objeto de furto, Bohus disse que a história é diferente, que sequer houve furto do aparelho. “Ele tinha adquirido um celular faz uma semana. A dona desse celular perdeu o celular. Quando chegou na delegacia os guardas também estavam alegando que ele tinha roubado o celular, o que é uma tremenda mentira. Nós ligamos da delegacia para a vítima, e a vítima sequer quis representar, porque ela não foi roubada, ela perdeu o celular e alguém achou e alguém vendeu para o Willio”.
“A pessoa convenceu o Willio que o celular era lícito. Ele adquire o celular e como tinha sido detido pela questão da resistência, os policiais também tentaram o acusar de ser um roubador, o que também é mentira”, completou o advogado. Segundo Bohus, como forma de pagamento, o haitiano deu um celular que tinha, mais R$ 300, além de outros R$ 250 para arrumar a tela, que estava quebrada. O aparelho foi apreendido para devolução à dona.
Outro lado
A reportagem procurou a Guarda Civil Municipal de Osasco. Em nota, o órgão informou que “prefeitura não compactua com nenhuma ação violenta em nosso município e determinou a abertura de uma sindicância para apurar o caso”. “No entanto, é preciso esclarecer que durante patrulhamento na Rua Batista de Azevedo em 14/07/2021, guardas civis municipais avistaram um indivíduo comercializando produtos no calçadão. Na abordagem constou-se tratar de um ambulante que não apresentou documento que comprovasse ter autorização para trabalhar no local. Ao ser informado da irregularidade e que deveria deixar a área, o ambulante tentou impedir que os GCM’s efetivassem a apreensão dos produtos e empurrou um dos guardas contra uma placa de anúncio e ambos entraram em luta corporal. Durante o atrito, o ambulante tentou pegar a arma do guarda, que foi ajudado por outros agentes municipais que acompanhavam a operação”.
O comunicado ainda sustenta que, “após o ocorrido, o rapaz foi conduzido ao 5º DP (centro), onde constatou-se que o celular do ambulante apresentava queixa de furto, conforme boletim de ocorrência eletrônico. Diante dos fatos, o rapaz foi autuado por receptação culposa e resistência. O celular foi apreendido e será devolvido ao proprietário, que já foi notificado”.
Já a Secretaria de Segurança Pública informou que foi elaborado boletim de ocorrência por resistência e receptação. Além disso, a autoridade policial solicitou exames periciais para os envolvidos.