Manifestantes se reuniram próximo ao prédio da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, no centro da capital paulista, que foi cercado por policiais antes mesmo do início da mobilização
O ato realizado no fim da tarde desta quinta-feira (3/8) pedindo o fim da Operação Escudo foi marcado pelo cerco da Polícia Militar aos manifestantes e por denúncias da violência sofridas por moradores da Baixada Santista. Convocando pela Coalizão Negra Por Direitos e por outros movimentos sociais, a manifestação ocorreu em frente ao prédio da Secretaria de Segurança Pública (SSP) no Largo São Francisco, em São Paulo.
As ruas no entorno do prédio foram bloqueadas por viaturas da polícia e também por carros da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). Em alguns pontos, houve regista para o acesso à concentração dos manifestantes. O prédio da SSP estava completamente cercado por PMs e grades de ferro, impedindo qualquer passagem até o local. PMs do Batalhão de Ações Especiais (Baep) também compuseram o policiamento do ato. Minutos antes de começarem as falas, o número de agentes da polícia era maior do que o de pessoas que vieram para protestar.
“Estamos aqui em frente a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo e para a nossa surpresa o prédio está sitiado. É a primeira vez que eu vejo isso, particularmente. Eu já vim em algum atos aqui na frente e nunca vi esse esquema de isolar de estar portando fuzil e fazendo revista aleatória para denunciar a chacina do Guarujá. O que a gente está vendo é uma guerra”, disse Luana Alves, vereadora do PSOL em São Paulo.
A manifestação começou por volta das 18h30min e contou com a presença de parlamentares e representantes de movimentos sociais. Entre os presentes estava Maria Cristina Quirino, mãe de Denys Henrique, morto em 2019 no massacre de Paraisópolis. A pesquisadora fez paralelo entre a atuação da PM que resultou na morte do filho dela e de mais outros oito jovens com o operação na Baixada Santista.
“É a mesma situação porque têm a deliberação do Estado. A gente sabe que o Estado é assassino. Quem delibera uma ação que mata os filhos da gente, sejam eles envolvidos ou não com o crime, eles estão errados porque no nosso país não existe pena de morte”, disse Maria Crisitina.
Também foram relatadas denúncias de violações que estariam sendo cometidas pelos policiais atuantes na Operação Escudo. SImone Nascimento, membro da coordenação nacional do Movimento Negro Unificado (MNU) e co-deputada estadual da Bancada Feminista (PSOLBSP) lembrou da visita feita por parlamentares ao litoral e também do protesto ocorrido na quarta-feira (2/8) no Guarujá, que tinha o mesmo objetivo: o fim da operação.
“A gente quer o fim da Operação Escudo antes que mais vidas sejam ceifadas. Nessa guerra do Estado contra a população são os territórios periféricos que sofrem com a insegurança pública”, falou a parlamentar.
Presente no ato, Ana Laura Cardoso Oliveira, 29 anos, integrante da rede Emancipa, fez um protesto silencioso ao pintar as mãos de vermelho. “Isso aqui é uma demonstração do sangue que está escorrendo lá do povo no Guarujá. A gente quer mostrar que isso aqui não pode ser naturalizado. As pessoas tem que ter vergonha de achar que sangue escorrendo é normal”, contou Ana Laura.
Entenda o caso
No sábado (29//7) foi deflagrada a Operação Escudo pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP). Isso ocorreu após a morte do soldado da PM Patrick Bastos Reis, 30 anos. Ele atuava na equipe da Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota) e foi atingido por um disparo enquanto estava em patrulhamento próximo ao túnel da Vila Zilda, em Guarujá, no litoral paulista.
Aproximadamente 600 agentes das polícias militar e civil foram deslocados para o Guarujá com o objetivo de localizar e prender os suspeitos de envolvimento na morte do PM. No domingo (30/7), contudo, o ouvidor das policiais, Claudinho Silva, deu entrevistas dizendo que recebeu denúncias de violações e tortura cometidas pela polícia e que a ação já havia deixado 10 mortos.
O número foi contestado pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e pelo secretário de Segurança Pública Guilherme Derrite. Em entrevista coletiva concedida no Palácio dos Bandeirantes, ambos afirmaram só terem recebido relatos de oito mortes e que todas elas teriam acontecido em confronto. Questionados sobre as denúncias de torturas, a dupla negou ter conhecimento dos fatos e classificou as queixas como “narrativa”. O trabalho dos policiais na operação também foi elogiado por Tarcísio e Derrite.
Ainda na coletiva, Tarcísio afirmou que a Escudo duraria pelo menos mais 30 dias, mesmo com a prisão de Erickson David da Silva, apontado como o autor do disparo que matou o PM. Outras três pessoas já tinham sido presas por suspeita de envolvimento na morte.
Especialistas ouvidos pela Ponte classificaram a ação como uma “operação de vingança” já que mesmo com as prisões que objetivaram o trabalho, mortes seguiram sendo registradas no Guarujá e depois em Santos, cidade também do litoral paulista.
Dados divulgados pela SSP na manhã desta quinta-feira (3) dão conta de 16 mortes desde o início da Operação Escudo (duas delas em Santos e as demais no Guarujá). “Todas as ocorrências com morte durante a operação foram resultado da ação dos criminosos, que optam pelo confronto”, diz a secretaria em nota publicada em seu site. A versão difere da relatada por moradores e por organizações ligadas aos direitos humanos.
Residentes das áreas com maior presença dos policiais contaram à Ponte o terror e a tensão que sentem desde o início da operação. Familiares dos mortos contestaram inclusive as versões de que houve confronto com a polícia nos minutos que antecederam às mortes.
Na quarta-feira (2/8), foi organizado por movimentos sociais da região da Baixada Santista o ato “Ser Pobre Não É Crime”. A manifestação contou com a presença de familiares das vítimas, moradores da região, representantes da Ouvidoria das Polícias, parlamentares e pesquisadores da área de Segurança Pública.