Representantes de grupos minorizados falam sobre o medo diante da chegada de Jair Bolsonaro, político de extrema direita, à Presidência
Desde o primeiro turno das eleições de 2018, assim como a Ponte mostrou em uma série de vídeos com relatos direcionados aos familiares, o clima de medo e insegurança se intensificou. Foram dezenas de agressões, alguns assassinatos e centenas de ameaças realizadas em nome de Jair Bolsonaro.
Neste domingo (28/10), em votação apertada, 55% dos brasileiros escolheram o candidato da extrema direita, que por muitas vezes destilou preconceito e ódio em seus discursos contra negros, mulheres, LGBTs, pobres e defensores dos direitos humanos, para governar o país. As minorias em direitos, que sempre estiveram à margem da sociedade buscando espaço, foram ouvidas mais uma vez pela Ponte que busca entender o significado dessa escolha.
Lésbica, periférica e designer, Natália Soueid, 22 anos, contou à Ponte que, depois de votar em São Miguel Paulista, bairro da zona leste de São Paulo, o medo a dominou. “Isso me assusta muito, a situação que estamos e o que está por vir. Eu nunca me importei tanto e nunca tive tanto medo do resultado de uma eleição. Tenho muito medo, principalmente pelas pessoas que estão na linha de frente militando e são mais marginalizados, queria poder abraçar todas as pessoas que estão com medo como eu”, desabafa Natália.
A também designer Joanna Dalleth, 24 anos, relatou que foi ameaçada. “Quando eu fui votar, eu estava toda de vermelho, e um cara falou para mim ‘depois de hoje esses viados e sapatão vão acabar’. E eu tô muito preocupada, não estou conseguindo racionalizar muito, não sei o que fazer, mas agora o espírito é de resistência”.
Para a professora Ana Paula Vieira de Oliveira, 33 anos, foi o ódio por um partido que motivou as pessoas a escolherem o discurso de ódio. “Assisti a candidatura de Jair Bolsonaro com certo receio, mas sempre imaginei que seria impossível a sua vitória por se tratar de uma pessoa carregada de preconceito, que prega o ódio descaradamente. Eu sou mulher, negra, cristã e pobre, pertenço a grupos que sempre foram vistos com olhares condenatórios e de exclusão. Venho de uma família, onde me ensinaram que resistir era a única escolha que eu tinha para sobreviver. Sempre defendi o diálogo, a educação e a compaixão como instrumentos para construir uma sociedade mais justa, livre da violência”, afirma a professora.
Anarquista, mulher negra e bissexual, a jornalista Jessica Gomes, 27 anos, conta que por muitos anos anulava os votos por não encontrar em candidatos alguém que, de fato, a representasse. Mas, diante da ameaça à liberdade de expressão decidiu votar contra Bolsonaro. “Quando eu fui votar nessas eleições, principalmente hoje, eu fui votar porque essa minha crença na autogestão tava sendo um risco para mim. O governo do PT era um governo que eu odiava, era um governo genocida, que matava índios, negros e colocava Exército na favela. Mas votar no PT hoje foi a maneira de eu saber que eu ia poder me opor. A partir do momento em que um presidente diz que vai matar, desaparecer e exilar as pessoas por serem quem são eu não posso exercer nem o meu direito mínimo que eu acredito ser um direito”, declara.
Jéssica conta que o resultado das eleições a fez tomar duas decisões. “Vou voltar a escrever e falar mais vezes que eu amo as pessoas que eu amo, viver mais esses momento. E isso não porque eu tenho um medo eminente de morte, esse medo eu sempre tive por ser como eu sou, por nascer como eu nasci”, finaliza a jornalista.
Para o analista de relacionamento Paulo Nascimento, 24 anos, os próximos dias são incertos e assustadores. “Quando eu fui votar estava tranquilo, mas depois do resultado das eleições, pelos comentários que eu vi de familiares em redes sociais comemorando a vitória e alguns amigos, que são eleitores dele, perguntando se eu vou fugir do país, se eu vou morar fora, se eu ia virar hétero… Eu ouvi bastante gente falando que agora os gays iam ter que ir embora ou iam ter que virar macho. Eu tô em estado de choque. Fico pensando como vai ser ir trabalhar e sair 22h para vir para casa. Como vai ser quando eu vou encontrar meu namorado e assim como serão os próximos dias”, desabafa Paulo.