Pesquisadores, autoridades e moradores de regiões periféricas da capital paulista assistiram a vídeos, debateram e apresentaram dados das violações dos direitos humanos que acontecem nos bairros afastados
Defensores de direitos humanos, autoridades e moradores de regiões afastadas da capital paulista se reuniram na noite de quinta-feira (21/7), no centro de São Paulo, para uma roda de conversa sobre a criminalização da periferia. Além de moradores de bairros periféricos da capital paulista, como a favela de Vila Prudente, estavam presentes representantes da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC), do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo (Condepe-SP ), do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca) e pesquisadores do assunto. Para a vereadora do município de São Paulo Juliana Cardoso (PT), o encontro serviu “para ver nossas conquistas e pensar nos desafios do futuro”.
O evento começou com a apresentação de vídeos denunciando violações nos direitos humanos. O primeiro a ser apresentado foi a reportagem da “TV Folha” sobre a reintegração da comunidade de Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), em 2012. Em seguida, foi transmitido o vídeo “Jardim Sem Flores“, que homenageia mulheres do Movimento Independente Mães de Maio, produzido no final de 2011. O terceiro vídeo foi uma entrevista realizada pela Ponte Jornalismo com Débora Maria da Silva, das Mães de Maio (confira abaixo).
Polícia da ditadura
A conversa começou abordando a questão do modelo de polícia que seria adequado para as necessidades sociais, especialmente para negros moradores da periferia. “Não existe democracia sem segurança pública, por isso devemos pensar em uma polícia cidadã, que não vê a sociedade como inimiga”, disse Clara Castellano, da Coordenação de Políticas de Direito à Memória e à Verdade.
Clara, que apresentou alguns dados do seminário “Juventude, Segurança Pública e Direitos Humanos”, acredita que “desde a ditadura, o papel de Polícia Militar é matar pobre, preto e periférico”.
As semelhanças da polícia no período da ditadura militar no Brasil com as maneiras de atuação atualmente também foram ressaltadas pela vereadora Juliana Cardoso: “Os modos perversos de torturas e desaparecimentos da época da ditadura militar continua até hoje”.
Políticas públicas
Na roda de conversa também foi abordada a forma como o Estado chega nas regiões periféricas. Segundo a pesquisadora Kassia Bobadilla, dizer que este não chega nas favelas e periferias não é uma afirmação correta. “O Estado chega nos bairros onde os negros e pobres vivem, sim. Ele chega como forma de controle e opressão. A polícia vai bater, o conselho tutelar vai tirar o filho de uma mãe”, explica.
Além disso, Kassia, que faz estudos sobre a favela de Vila Prudente, revelou que um dos principais problemas enfrentados pelos jovens das periferias é a estigmatização por causa de passagens pelo sistema penitenciário e tatuagens. Segundo ela, a maior preocupação das mães é o uso frequente que a polícia faz do chamado ‘forjamento’, quando policiais colocam drogas em mochilas ou roupas dos jovens para acusá-los de tráfico e prendê-los.
A falta de alternativas de lazer nos bairros mais afastados do centro foi um dos alvos das críticas de residentes de periferias que estiveram no evento. Para eles, a repressão da PM nos bairros periféricos acontece principalmente porque a juventude não tem oportunidades de escolher espaços para passar os períodos de lazer. “A polícia joga bomba, mas a Secretaria de Cultura continua não chegando na periferia”, reclama Valdênia Paulino Lanfranchi, presidente do Cedeca Sapopemba.
Valdênia ainda destaca a falta de política direcionada ao grande número de famílias que tem entes no sistema penitenciário. “Toda semana muitas famílias viajam horas para visitar parentes em presídios, passam muitos sofrimentos, humilhações, não recebem apoios e nós não debatemos isso”.
Representação na mídia
Kassia Bobadilla usou o espaço para mostrar como bairros periféricos são abordados pela mídia desde pelo menos a década de 1950. Ela apresentou imagens de manchetes de jornais antigos retratando as regiões com estereótipos e as classificando como “criadoras de malfeitores”.
O retrato dos negros pela mídia, reproduzido pela sociedade, foi o ponto de avaliação da coordenadora de Políticas para Juventude da SMDHC, Gabriela Vallim. “A palavra ‘negro’ já vem carregado de explorações e pontos negativos que marcaram nosso passado, por isso muitos negros preferem ser chamados de ‘moreninhos’, ‘marrom bombom’, entre outros termos”, diz.
A roda de conversa terminou com o presidente do Condepe, Rildo Marques, apontando as dificuldades que o conselho tem para dialogar com órgãos responsáveis pela segurança pública. Rildo apresentou a foto do PM com a máscara do palhaço Coringa, revelada pela Ponte Jornalismo em 14/7, e disse que a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) não aceita ajuda para solucionar problemas como esse.