Defensoria pede afastamento de agentes suspeitos de torturar meninas

    “Denúncias de espancamentos são comuns em todas as unidades da Fundação Casa”, afirma defensora pública Fernanda Balera

    Ao visitar a unidade feminina da Fundação Casa (antiga Febem) em Parada de Taipas, na zona norte de São Paulo, na última sexta-feira (18), a defensora pública Fernanda Balera colheu os depoimentos de nove meninas que relataram em detalhes uma sessão de torturas, denunciada pela Ponte Jornalismo, que os agentes socioeducativos teriam praticado com as internas no dia 11.

    Nenhuma das meninas  apresentava marcas das torturas, mas isso não surpreendeu a defensora. “Além de as agressões terem ocorrido uma semana antes da minha visita, sabemos que os agentes têm bastante prática para bater sem deixar sinais. Mandam os internos tomarem banho frio logo após o espancamento, passam pomada, batem em partes do corpo que não deixam hematomas…”, enumera a defensora.

    Numa petição enviada hoje ao Ministério Público Estadual, à Corregedoria da Fundação Casa e à juíza corregedora responsável pelas unidades que abrigam adolescentes em conflito com a lei, a defensora apresenta as denúncias feitas pelas nove adolescentes Taipas e pede o afastamento cautelar (enquanto durarem as investigações) de quatro funcionários apontados como autores das agressões. “Algumas também denunciaram outros agentes, mas os dados mais consistentes apontam para esses quatro”, explica.

    Segundo Balera, a tortura de adolescentes nas unidades da Fundação Casa é uma prática generalizada, que vai muito além de Taipas. “Denúncias de espancamentos são comuns em todas as unidades da Fundação Casa. Toda semana recebemos alguma”, afirma a defensora.

    No caso da unidade de Taipas, a defensora relata que um problemas mais graves observados por ela é o grande número de funcionários homens nas funções de vigilância de meninas. “Esse problema já havia sido denunciado por um relatório do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, da Secretaria de Direitos Humanos, em agosto do ano passado, mas a Fundação Casa não tomou qualquer providência”, afirma.

    Além da Defensoria, outras instituições apuram as denúncias levantadas pela Ponte. Na mesma sexta-feira, a unidade de Taipas recebeu visitas da promotora de justiça da Infância e da Juventude da Capital Paula Augusto Mariano Marques e de três conselheiros tutelares, que estiveram no local a pedido do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana). Também no dia 18, o Condepe encaminhou as denúncias para a presidente da Fundação Casa, Berenice Gianella.

    “Tudo com medo”

    No sábado (19), no primeiro dia de visita na unidade de Taipas após a divulgação das denúncias, a reportagem da Ponte esteve no local, acompanhada por uma ativista do Coletivo Autônomo Herzer. Mães e pais das adolescentes contaram à reportagem que a direção da unidade isolou as meninas durante a visita. Em vez de reunir todas as adolescentes no pátio, dessa vez a direção só permitiu que cada menina tivesse acesso aos seus próprios familiares e mais ninguém. Algumas atividades corriqueiras, como corte de cabelo, também foram suspensas.  “As meninas estão tudo com medo”, disse uma mãe.

    Os familiares também relataram à Ponte outros casos de abuso, como revistas realizadas nas meninas por homens e a presença de chuveiros sem aquecimento. Uma mãe também disse que a filha estaria tomando medicamentos psiquiátricos acima da dose recomendada.

    As agressões do dia 11 foram motivadas por boatos de um plano de fuga, que, segundo uma das mães, teriam começado por conta de uma brincadeira feita por uma das internas. As denúncias apontam que, naquele dia, as internas acordaram às 5h com sons de barras de ferro batendo nas portas. Foram arrastadas para fora das acomodações, pelos cabelos e por seus uniformes, e depois reunidas, nuas, diante de monitores e seguranças homens e mulheres. Nesse momento, foram agredidas com chutes, tapas, socos e ofensas verbais. Após as agressões, elas teriam ficado trancadas nos quartos por cinco dias, inclusive sem o direito de irem ao banheiro.

    Outro lado

    A Ponte questionou por e-mail a assessoria de imprensa da Fundação Casa, na tarde de hoje, sobre as denúncias de violência contra as internas em Taipas e em outras unidades da antiga Febem. Até o momento, não houve resposta.

    Atualizado em 22/11, às 23h – A assessoria de imprensa da Fundação Casa respondeu:

    “Fausto, a Corregedoria Geral da Fundação CASA já instaurou uma sindicância para apurar o caso. O prazo para o termino da investigação é de 90 dias. As atividades continuam funcionando normalmente dentro do CASA Parada de Taipas.”

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