A cabeça a prêmio de Zidane, delator do PCC

    Diferente dos delatores da Lava-Jato, ele segue preso e ameaçado de morte: “minha cabeça vale R$ 3 milhões”

    A cabeça de Zidane vale R$ 3 milhões para quem conseguir matá-lo. É muito dinheiro.

    Mas quem está a prêmio não é o ex-jogador da Seleção Francesa de Futebol e atual técnico do Real Madri, o melhor time do mundo.

    A recompensa, na realidade, é oferecida para quem executar o preso Orlando Motta Júnior, o Zidane, também conhecido como Macarrão. Zidane ganhou esse apelido por causa de sua semelhança com o craque francês.

    Até 2010, ele era um dos homens fortes da cúpula do PCC (Primeiro Comando da Capital), a maior e mais temida facção criminosa do País.

    O prestígio e a confiança que desfrutava no PCC eram tantos que ele foi autorizado a criar e coordenar para o grupo a “sintonia dos gravatas”. Criada em 2006, a “sintonia dos gravatas”, é até hoje o braço jurídico do PCC.

    Esta célula é formada por advogados contratados pela organização criminosa para cuidar dos interesses de seus integrantes.

    Nos últimos anos, dezenas de advogados foram detidos e apontados como pombos-correios: aqueles que levam e trazem recados da facção.

    Em novembro do ano passado, ao menos outros 40 advogados foram presos durante a deflagração da Operação Ethos, sob a mesma acusação.

    Orlando Motta Júnior, o Zidane: “Minha cabeça vale R$ 3 milhões”

    Em agosto de 2009, quando estava recolhido na Penitenciária 1 de Avaré, no interior de São Paulo, Zidane soube da morte de seu advogado, Marlon Teixeira Marçal. Também chamado de “Pequeno Falcão”, Marlon foi acusado pelo PCC de ter desviado dinheiro da facção.

    Zidane ficou revoltado com o assassinato. Foi contra a execução. A partir daí passou a sofrer ameaças daqueles que antes o reverenciavam.

    Em 2 de novembro de 2009, em posse de um telefone celular, Zidane, com medo de morrer, ligou para o 190 da Polícia Militar e para o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), do Ministério Público Estadual.

    Ele pediu “seguro”, proteção. Estava com muito medo de ser assassinado. Foi transferido de prisão.
    Meses depois, Zidane delatou às autoridades o assassinato de um agente penitenciário, executado a mando do grupo criminoso.

    O PCC não conseguiu matá-lo. Mas fez pior. Tirou um pedaço importante de Zidane.

    Como vingança, a facção executou a mulher de Zidane, uma das pessoas que ele mais amava.

    O crime ocorreu em 7 de setembro de 2010, em São José dos Campos, no Vale do Paraíba.

    Ao depor em julho deste ano como testemunha de acusação no processo da Operação Ethos, Zidane fez a grave revelação:

    “Minha cabeça vale R$ 3 milhões.”

    Ele disse isso enquanto era interrogado pelo advogado de alguns dos réus no processo.

    Zidane também se emocionou e não conteve as lágrimas ao afirmar que apenas dois homens da cúpula do PCC foram contra a morte de sua mulher. “Foram o Marcola (Marco Willians Herbas Camacho) e o Vida Loka (Abel Pacheco de Andrade)”, acrescentou, chorando durante o depoimento.

    Marcola é apontado como o líder máximo da organização. Vida Loka é considerado o número 2 na hierarquia do grupo.

    A Ponte teve acesso ao depoimento de Zidane. As declarações dele foram gravadas. O vídeo tem cerca de 85 minutos de duração.

    Dos aproximadamente 40 advogados processados na Operação Ethos, Zidane disse conhecer apenas cinco. Os nomes dos demais, ele garantiu que nunca ouviu falar deles depois de 2006, quando criou a “sintonia dos gravatas”, até 2010, quando saiu do PCC.

    Alguns desses desconhecidos, no entanto, já foram condenados na Operação Ethos.

    Um deles, Vinícius Guimarães Pinheiro Lemos, foi condenado a oito anos e nove meses.

    A jornalista Luana de Almeida Domingos, presa e acusada no mesmo processo, “jamais pisou em um presídio”, segundo sua família.

    Zidane nunca ouvir falar de Vinícius e de Luana. Ambos dizem ser inocentes, afirmam que não integram o PCC e não são pombos-correios.

    Ao Estado agora cabe a obrigação de cuidar da segurança e da integridade física de Zidane, para impedir que ele seja executado pelos rivais.

    Fosse Zidane algum delator da Operação Lava-Jato, no mínimo já estaria nas ruas. Com ou sem tornozeleira eletrônica.

    A situação de Zidane não é muito diferente do caso de Luís Carlos dos Santos, ex-diretor do Condepe.

    Ele também foi condenado na Operação Ethos. A sentença aplicada pelo Juiz Gabriel Medeiros foi de 16 anos e dois meses em regime fechado.

    Santos foi acusado de ser cooptado pelo PCC para divulgar falsas notícias de violações de direitos humanos no sistema prisional.

    Em troca receberia R$ 5.000,00 mensais da organização. O ex-diretor do Condepe confessou a participação no crime.

    Por conta disso foi ameaçado de morte. Há 10 meses não vê a luz do dia. Está isolado na masmorra e não pode sair para o pátio no banho de sol.

    O dinheiro recebido do PCC por Santos, réu confesso, não chega a ser nem de perto uma gorjeta, se comparado ao caso de Geddel Vieira Lima.

    Ontem, durante a Operação Tesouro Perdido, policiais federais encontraram R$ 54 milhões em espécie num apartamento que seria usado por Lima em Salvador.

    Ex-ministro dos governos Temer e Lula, Lima é acusado por fraudes na liberação de créditos da Caixa Econômica Federal.

    Ele teve a prisão decretada pela Justiça Federal em julho deste ano, mas cumpre prisão domiciliar na Bahia.

    Lima pode ver o mar azul da Bahia e o sol todos os dias. Já Zidane e Santos, que de um jeito ou de outro colaboraram com a Justiça, correm risco de morte, mesmo na masmorra.

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