Famílias voltam a visitar presos, agora pela internet, mas muitas ficam de fora

    No primeiro final de semana de visita on-line nos presídios paulistas, familiares relatam falhas, mas também alegria em rever os parentes presos 

    Detento da penitenciária de Guareí (SP), em março deste ano | Foto: Daniel Arroyo/Ponte

    A empregada doméstica Rosângela Costa, 26 anos, quase não conseguiu dormir na noite de sexta-feira (24/7). Na manhã de sábado, mais precisamente às 9h22, a videochamada com seu marido, detido na Penitenciária de Piracicaba (SP), foi autorizada. Por 11 minutos, ela conseguiu matar a saudade de um dia de visita que não acontecia há quatro meses, desde que a Justiça suspendeu a entrada de familiares nas unidades prisionais, em 20 de março, por causa da pandemia de Covid-19.

    Ainda não é um encontro presencial, como os familiares de pessoas presas aguardam, mas para Rosângela a alternativa do encontro on-line, adotada pelo gestão João Doria (PSDB), já ajuda para “aliviar a saudade”. Depois de rever e conversar brevemente com o marido, ela classificou a visita virtual como “maravilhosa, graças a Deus”.

    Veja também: Como estão as visitas nos presídios do Brasil em tempos de isolamento

    As visitas on-line começaram a acontecer neste final de semana e, segundo a Secretaria de Administração Penitenciário de São Paulo, abrange todas as 176 unidades prisionais do Estado. Cada preso poderá receber uma visita de, no máximo, cinco minutos mensalmente. Na prática, porém, o governo não está conseguindo cumprir o que prometeu.

    Visitantes barrados

    De acordo com dados divulgados pelo Departamento Penitenciário Nacional, órgão subordinado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, atualizados na última sexta-feira, os presídios de São Paulo têm 1.713 confirmações de coronavírus, 18 óbitos, 105 suspeitas e 1.203 recuperados. 

    Outros familiares não tiveram a mesma alegria de conseguir realizar as visitas on-line previstas para este final de semana. A auxiliar de enfermagem Luara Dutra, 22, estava com a visita agendada para 8h15 deste domingo. No horário marcado, realizou o procedimento para iniciar a videochamada, mas, devido a problemas técnicos na Penitenciária 2 de Itapetininga, onde o marido está, ficou os cinco minutos da visita apenas ouvindo os agentes penitenciários tentando resolver o problema, sem conseguir. 

    Já a ajudante de cozinha Shirley de Lima Dias, 26, afirma que os cinco minutos que a Secretaria de Administração Penitenciária disponibiliza para cada visitante são insuficientes. “Não dá tempo nem de expressar o que estamos sentindo, sem dizer que a internet na unidade não é muito boa e cortava toda hora”, conta.

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    Shirley fez a videochamada com o marido, que está preso na Penitenciária 2 de Itapetininga, na manhã deste domingo. Além de não ter conseguido matar a saudade do marido, lamenta que muitas pessoas não conseguiram acessar o endereço eletrônico disponibilizado pelo governo para fazer o agendamento. 

    Na semana que antecedeu ao início das visitas on-line, a Ponte recebeu diversas denúncias de erros no site criado pela Secretaria de Administração Penitenciária para fazer os cadastros. Houve relatos de familiares que passaram a noite inteira tentando fazer o agendamento, mas sem sucesso. 

    Embora tenha ficado feliz por ter voltado a ver o marido, Rosângela destaca que a “visita em vídeo só é boa se levar em consideração o momento, já que não é possível estar nos presídios junto com o familiar”. A doméstica afirma que “estava muito difícil se comunicar só por carta e pela Conexão Familiar, que permite apenas dois e-mails por semana”. 

    Já para Shirley, a medida ideal que deveria ser adotada pelo governo é a disponibilização de testes para os familiares de presos, para que as visitas voltem a ser gradativamente liberadas. “Essa visita on-line não resolve para mim, e acho que para nenhuma família de preso”. 

    A Ponte pediu para a Secretaria de Administração Penitenciária os dados de visitas on-lines que aconteceram neste primeiro final de semana e também questionou quais foram os problemas mais recorrentes neste primeiro final de semana. Além disso, perguntou sobre o caso específico da visitante Luara. Até a publicação desta reportagem, não houve retorno.

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