Profissional que perdeu a visão após ser atingido por tiro de bala de borracha da PM durante manifestação na avenida Paulista, em 2000, vai receber troféu na categoria Carreira da edição deste ano do prêmio
O fotógrafo Alex Silveira, que perdeu a visão do olho esquerdo após ser baleado enquanto cobria uma manifestação em São Paulo, em 18 de maio de 2000, vai receber Troféu Vladimir Herzog Especial na categoria Carreira na edição deste ano do prêmio.
“Esta homenagem é um reconhecimento por sua luta em defesa do exercício profissional, uma posição pelo fortalecimento da liberdade de imprensa e a celebração de uma decisão que responsabiliza o Estado pelos ferimentos causados a um jornalista que estava no local dos fatos, exercendo uma atividade de interesse público e social”, disse Ana Luisa Zaniboni Gomes, curadora da edição, em carta enviada ao fotógrafo.
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A cerimônia de premiação da 43ª edição do prêmio acontece no dia 25 de outubro, em um evento virtual. A categoria que Silveira foi indicado existe desde 2009, e ela indica jornalistas que são homenageados “pelos relevantes serviços prestados às causas da Democracia, Paz, Justiça e contra a Guerra”.
Na última edição, em 2020, o prêmio da categoria foi entregue para a cartunista Laerte, à filósofa Sueli Carneiro, e ao advogado abolicionista Luiz Gama. Neste ano, além de Silveira, os jornalistas Neusa Maria Pereira e José Marques de Melo (que morreu em 2018), e o ator Abdias do Nascimento (falecido em 2011).
“Fico extremamente honrado com essa homenagem, me dá um novo fôlego. Não enxergo como um prêmio que ganhei, mas sim que foi personalizado em mim, porque a luta é de todo mundo, e um dos grandes méritos que posso ter foi de demonstrar que a gente tem que se unir para se proteger. Eu tenho orgulho de ver todo mundo junto brigando por uma causa”, afirma Silveira.
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O fotógrafo também destaca a presença de Neusa Maria entre as homenageadas. “Estamos em um momento muito difícil na história, com muitas coisas distorcidas, algumas coisas muito revoltantes, e é bastante especial ter esse tipo de reconhecimento”, afirma.
Silveira conta que, quando soube da indicação, estava estudando sozinho em casa, “durango e tristonho”, e ficou muito feliz com a notícia. Mesmo assim, destaca que o tiro que levou e a demora de duas décadas para julgamento favorável não foram motivos para ele “sentar e chorar”.
“Foi isso que a vida me deu, e eu procuro ajudar as pessoas, porque não quero ver ninguém levando tiro ou esperando 20 anos para conseguir justiça como aconteceu comigo”, afirma o fotógrafo.
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Silveira foi atingido no olho esquerdo por bala de borracha disparada pela Tropa de Choque da Polícia Militar de São Paulo durante uma cobertura de um protesto de servidores públicos na avenida Paulista, na capital paulista. Aos 29 anos, ele trabalhava no jornal Agora, do Grupo Folha.
Em 2008, a primeira instância do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou o Estado de São Paulo a restituir despesas médicas e a pagar 100 salários mínimos por danos morais a Silveira. Em 2014, o tribunal reformou a decisão, considerando que o fotógrafo era o único culpado por seu ferimento, uma vez que teria permanecido no local do tumulto.
Somente em junho deste ano, então, o plenário do Supremo Tribunal Federal votou pela indenização do fotógrafo. A decisão representou também que outros jornalistas que tenham sido vítimas de agressão por parte da polícia no exercício da profissão podem pedir indenização do Estado, como no caso do fotógrafo Sérgio Silva, que perdeu o olho em 13 de junho de 2013, enquanto cobria as Jornadas de Junho.