ONG Repórteres Sem Fronteiras identificou que 88% dos ataques foram feitos pelo presidente e seus filhos parlamentares em 2021; Twitter e Facebook são as principais plataformas usadas para ofensivas contra veículos e jornalistas
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Nos primeiros seis meses de 2021, o governo Bolsonaro atacou a imprensa, um aumento de 5,4% em relação ao semestre passado, de acordo com a ONG Repórteres Sem Fronteiras. O levantamento, lançado nesta quarta-feira (28/7), identificou que o presidente e os seus filhos, os parlamentares Carlos, Flavio e Eduardo Bolsonaro, foram os principais agentes que direcionaram ofensivas tanto para a imprensa como um todo quanto para jornalistas e veículos específicos: 293 ocorrências. Jair Bolsonaro (sem partido) sozinho, do semestre anterior para o atual, aumentou em 74% os ataques, de 50 para 87. Ele foi incluído, no dia 2 de julho, na lista de “predadores globais” da liberdade de imprensa, realizada pela mesma organização e que elencou ao menos 37 chefes de Estado que reprimem o exercício da profissão.
O “sistema Bolsonaro”, como a entidade chama, inclui seis ministros do governo como agressores: Onyx Lorenzoni, da Cidadania mas de malas prontas para o renovado Ministério do Trabalho, com 18 ataques; Damares Alves, da Mulher, Família e Direitos Humanos, e Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, ambos com sete; Ricardo Salles, que deixou o Ministério do Meio Ambiente em 23 de junho, três; André Mendonça, que ocupou o Ministério da Justiça e Segurança Pública de abril de 2020 a março de 2021, um ataque; Milton Ribeiro, da pasta da Educação, também um ataque. O vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) aparece na lista com um ataque.
Os números são considerados graves e preocupantes pela organização internacional. “Enquanto a crise sanitária continua a devastar o país (mais de 550 mil vítimas em 26 de julho), devido sobretudo à gestão desastrosa do governo federal, os ataques do presidente e seus apoiadores contra jornalistas se intensificaram e diversificaram, atingindo às vezes um nível inimaginável de vulgaridade e violência”, diz o estudo.
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O Brasil está na 111ª posição no ranking mundial de Liberdade de Imprensa 2021, também elaborado pela Repórteres Sem Fronteiras, ocupando a zona vermelha, considerada como “situação difícil”.
É principalmente as mulheres jornalistas que são hostilizadas pela família Bolsonaro, que fez 16 ataques. Elas representaram 5,13% das agressões totais. A ONG destaca que as apresentadoras Maria Julia Coutinho, da TV Globo, e Daniela Lima, da CNN Brasil, foram os principais alvos neste ano. Maju, como é conhecida, foi atacada em março pelas redes sociais quando falou sobre eficácia do lockdown e teve a fala editada por bolsonaristas, incluindo o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Daniela foi chamada de quadrúpede por pelo presidente, em junho, após também ter a fala editada num vídeo em que falava de taxa de desemprego, desencadeando também investidas misóginas por apoiadores nas redes sociais.
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Outras investidas ocorridas no mês passado, em menos de uma semana, também foram enfatizadas, como contra a uma jornalista da TV Vanguarda que questionou Jair Bolsonaro sobre não estar usando máscara durante a coletiva. “Cala a boca (…) a Globo é imprensa de merda, imprensa podre”, gritou ele na ocasião. E contra a repórter Victoria Abel, da Rádio CBN, ao ser indagado sobre as suspeitas de corrupção na aquisição de vacinas contra a Covid-19. “Volta para a universidade, depois para o ensino médio, depois para o jardim de infância, então você pode renascer!”, descontrolou-se, também mandando os jornalistas pararem de fazer “perguntas estúpidas”.
Por causa falta de segurança e humilhações contra jornalistas na cobertura presidencial em Brasília, onde em aparições públicas Bolsonaro também fez ataques à imprensa, o Ministério Público Federal enviou um parecer à Justiça solicitando análise técnica sobre o risco aos profissionais no Palácio da Alvorada, em maio deste ano, a pedido da Repórteres Sem Fronteiras junto a outras organizações e sindicatos.
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Segundo a entidade, o Twitter foi a plataforma mais usada para hostilizar a imprensa: 80% dos registros. É também nessa rede social que o presidente mais limita quem lhe faz críticas, bloqueando quem o incomoda. A própria Repórteres Sem Fronteiras apontou ter tido sua conta em português bloqueada por Bolsonaro após a divulgação do relatório de ataques de 2020. A Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), em conjunto com o site Congresso em Foco, lançaram a campanha Bolos AntiBlock, que monitora os bloqueios de jornalistas, influenciadores e outros profissionais por autoridades públicas. Essa campanha apontou que a conta do presidente foi responsável por 20% dos bloqueios, liderando o ranking de 600 perfis de autoridades monitoradas.
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Além disso, devido a algumas penalizações que Bolsonaro sofreu no Twitter em 2020 devido a postagens falsas sobre a pandemia, a entidade nota que ele passou a privilegiar o Facebook por meio de lives semanais pelo canal do Palácio da Alvorada, que também é retransmitido pelo YouTube. A ONG enumera que, das 24 lives semanais ocorridas no primeiro semestre de 2021, em 19 delas Jair Bolsonaro atacou a imprensa, o que corresponde a 58,62% de intervenções ao vivo, comparados a 21,84% no Twitter e a 19,54% feitos durante atos e atividades públicas.
Nesse espaço em que propaga desinformação e hostiliza veículos e jornalistas, a Repórteres Sem Fronteiras apontou que as lives 14 de janeiro e 12 de fevereiro foram apagadas e bloqueadas pelo YouTube, que classificou seus comentários como desinformação. Em 21 de julho, pelos mesmos motivos, o YouTube decidiu excluir 14 dessas lives de sua plataforma, transmitidas entre 2020 e 2021.
Ainda de acordo com a ONG, os veículos que mais foram hostilizados foram Grupo Globo (76), Grupo Folha (44), Grupo Estado (11), Grupo UOL (8), Grupo Abril (4), CNN Brasil (3), Antagonista (3).