Invasores em uma ocupação de sem-teto: eram policiais

    Sem mandado judicial, dupla de PMs invadiu Ocupação Mauá, no centro de São Paulo, para abordar um jovem negro, que foi ver se a esposa, grávida, estava bem

    Imagine a cena: apesar da pandemia, você precisa sair para trabalhar. Sua esposa, grávida, te espera em casa para almoçar. Todos os dias, você almoça com ela e a sua filha em casa.

    Mas, em um determinado dia, dois policiais militares te seguem e invadem a sua casa para te revistar. Isso aconteceu na tarde desta terça-feira (4/8) com um dos moradores da Ocupação Mauá, localizada no centro da cidade de São Paulo.

    O morador, que não será identificado por temer represália, trabalha em um estacionamento perto da ocupação. Para ver a esposa que está prestes a dar à luz o segundo filho do casal, ele almoça todos os dias em casa. Ele foi seguido por dois policiais que, sem informar o motivo, entraram na ocupação correndo, com armas na mão e o abordaram.

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    Em um vídeo enviado à Ponte é possível ver o momento em que o jovem negro entra no prédio por volta das 13h. Pouco depois, dois PMs da Rocam (Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas) entram correndo atrás dele, com armas em punho. Os policiais colocam o jovem contra a parede para ser revistado e o levam dali, rendido, para fora do local.

    Silmara Congo da Costa, uma das coordenadoras da ocupação, presenciou a ação. Ela conta que o jovem não tinha visto a polícia, só notou quando ela os avisou. “Os policiais abordaram ele perguntando por que ele tinha corrido, mas ele disse que não tinha corrido, que estava vindo do trabalho”, conta.

    “Os policiais conduziram ele para o lado de fora e fizeram a mesma revista que fizeram aqui dentro. Quando puxaram os documentos dele, viram que não tinha nada”, continua. “Eles não falaram nada, já entraram correndo. Tinha um outro morador na portaria e eles já chegaram empurrando. O rapaz ficou muito constrangido porque ele estava na casa dele”, critica.

    Na hora em que os policias entraram na Ocupação Mauá, detalha Silmara, os porteiros estavam trocando de turno, por isso a porta estava aberta. “Os policiais aproveitaram isso, não se identificaram e invadiram com tudo. A portaria fica fechada e quase passaram por cima do porteiro para entrar”.

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    Para Benedito Roberto Barbosa, advogado do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, a ação policial foi uma invasão. “Os PMs não respeitaram o espaço, não pediram licença. Ali é uma entrada dos moradores, a polícia não pode chegar e invadir o local dessa forma”, critica.

    “E se fosse a casa deles ou o batalhão deles? A polícia age com violência nas comunidades mais pobres e deixam as pessoas com medo, especialmente na região da Luz em que as pessoas estão em constante ataque da PM e da GCM. Não só na [Ocupação] Mauá, mas na Favela do Moinho e na região conhecida como Cracolândia“, aponta.

    Outro lado

    A reportagem procurou a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo e a Polícia Militar.

    Em nota, a PM esclarece que a “abordagem foi feita em área comum do edifício e que, como não houve qualquer obstrução à entrada dos agentes, não é necessária apresentação de mandado ou autorização judicial. Na ação, os policiais realizaram busca pessoal, de acordo com procedimentos operacionais padrão”.

    Reportagem atualizada às 12h48 do dia 6/8 para inclusão da nota da Polícia Militar

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