Jovens, negros e sem antecedentes: quem são os presos na Operação Escudo

Dados da Defensoria Pública apontam que 73% dos presos em flagrante em ação policial na Baixada Santista (SP) teriam cometido crimes sem violência ou grave ameaça

Manifestantes fizeram ato em 3 de agosto em São Paulo pedindo o fim da operação das polícias na Baixada Santista | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

Jovens, negros e sem antecedentes criminais. Esse é o perfil da maior parte dos presos em flagrante durante a Operação Escudo, que já dura 18 dias na Baixada Santista, litoral de São Paulo. Os dados são de levantamento feito pelo Núcleo Especializado de Situação Carcerária (Nesc) da Defensoria Pública do Estado de São Paulo que teve acesso a 170 casos de prisão em flagrante e 94 de pessoas que já tinham mandado contra elas expedido.

Os dados incluem prisões feitas entre 28 de julho (quando teve início a operação) e 15 de agosto. O número é inferior ao total de prisões feitas até aqui durante a Operação. A informação mais recente divulgada pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) no sábado (12/8) dá conta de 363 prisões — 137 delas com mandado prévio.

A ação policial na Baixada Santista foi deflagrada com objetivo inicial de identificar e prender os responsáveis pela morte do soldado da Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota) Patrick Bastos Reis, 30 anos, morto em 27 de julho no Guarujá. No dia 7 de agosto, o Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) denunciou três pessoas pelo homicídio do militar. 

“O cenário evidencia a necessidade de que a Defensoria Pública tenha acesso à integralidade dos dados, fazendo cumprir sua missão constitucional de promoção dos direitos humanos dos grupos vulneráveis, entre eles as pessoas privadas de liberdade”, diz o texto do levantamento.

Mesmo com os suspeitos da morte já presos e transformados em réus, a Operação Escudo agora é justificada pela SSP com “objetivo de melhorar a segurança dos moradores, asfixiar o tráfico de drogas e desmantelar o crime organizado, que tem grande presença em morros e comunidades da Baixada”. 

Dezoito pessoas foram mortas por intervenção policial até momento — especialistas ouvidos pela Ponte classificam a ação policial como uma “operação vingança”. Os dois óbitos  mais recentes ocorreram na terça-feira (15/8) em Guarujá, no mesmo dia em que o delegado da Polícia Federal Thiago Selling foi atingido por um tiro na cabeça na cidade do litoral. 

Jovens, negros e sem antecedentes

O levantamento do Nesc foi feito com base nos casos apresentados em audiência de custódia e/ou comunicados ao juízo na 1ª Circunscrição Judiciária – Comarca de Santos, porque, segundo o Núcleo, ali são abarcadas no litoral sul de São Paulo. 

Foram consideradas para construir o relatório informações como idade, raça, suposto crime praticado e se a pessoa possui ou não antecedentes.  

Os dados apontam que 35,9% dos presos em flagrante têm entre 18 e 24 anos, seguidos pela faixa etária de 25 a 29 anos; e 17,6% 30 a 34. Em sua maioria são pessoas negras (71,8% — 60% de pardos + 11,8% de pretos) e sem antecedentes (55%).  

A maior parte dos flagrantes foi de crimes sem violência ou grave ameaça — 73% dos casos. E em 90% dos casos não houve apreensão de armas e nem drogas (67%) com os suspeitos. 

Do total de flagrantes analisados pela Nesc, foram registradas prisões em Guarujá (44), Praia Grande (40), Santos (33), São Vicente (31), Cubatão (12) e Bertioga (10). 

Em 40 dos casos há registros de lesão nos presos e dois deles hospitalizados após a prisão. De acordo com o relatório, 59% dos presos em flagrante tiveram a manutenção da prisão e 81% são atendidos pela Defensoria Pública. 

As prisões foram feitas, em sua maioria, por policiais militares (75%); 15% foram por agentes da Guarda Civil Metropolitana e 10% por policiais civis. Na ocasião do anúncio da Operação, a SSP informou que foram mobilizados 600 policiais militares de diferentes batalhões. 

A análise do Nesc também reúne dados sobre a prisão de pessoas que já eram procuradas pela Justiça. O perfil é semelhante ao dos presos em flagrante: são negros (57,7%, com 53,2% de pardos e 4,3% de pretos) e com idade entre 30 e 34 anos (24%), em sua maioria. 

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A maior parte desse grupo estava em cumprimento de pena (61%), seguido por pessoas que tinham mandados de prisão civil (relacionadas muitas vezes ao pagamento de pensão alimentícia). 

Dez presos apresentaram lesões segundo o laudo do Instituto Médico Legal (IML) e um está hospitalizado. 

Outro lado 

A Ponte procurou a SSP questionando sobre os dados do relatório e, em especial, sobre os presos que apresentaram lesão no laudo do IML e sobre o que aconteceu na abordagem das três pessoas hospitalizadas. Não houve retorno. 

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