Judiciário intermedeia leilão de prédio ocupado há 21 anos e famílias protestam

Moradores e coletivos marcharam até o Fórum Trabalhista, na segunda-feira (10), para cobrar decisão contra ordem de desocupação; prédio da antiga Casa de Saúde Anchieta foi arrematado por empresa em leilão

Aos gritos de “quem ocupa, não tem culpa” e “ocupar e resistir”, moradores da Ocupação Anchieta junto com movimentos sociais reivindicaram o direito à moradia na última segunda-feira (10/01). O ato foi em frente ao Fórum Trabalhista localizado no centro de Santos, no litoral paulista.

Cerca de 70 famílias temem ser despejadas do prédio da antiga Casa de Saúde Anchieta por conta de um processo de desocupação que tramita na Justiça do Trabalho.

O protesto cobrou uma revisão do processo dado que o imóvel, mesmo ocupado pelos moradores há 21 anos, foi arrematado pela PJGC e Bragil Empreendimentos e Participações em um leilão intermediado pelo Judiciário. No mesmo dia, a defesa da ocupação, formada por seis advogados, tentou protocolar um pedido de audiência com a juíza da 1ª Vara do Trabalho – responsável pela decisão de imissão de posse –, mas não foi aceito.

Atualmente, mais de 200 pessoas, muitas desempregadas, sem emprego fixo e que não conseguem pagar aluguel, vivem no imóvel que foi abandonado na década de 1990 com dívidas dos antigos proprietários.

“Viemos aqui fazer um apelo para que venha ser dado uma atenção e que venha ser analisado com cautela esse processo”, fala Patricia Maria, residente do Anchieta. Outra moradora, Flávia Santos, reivindicou: “Nós precisamos de moradia, porque temos crianças, idosos lá e não precisamos ir para a rua”.

À Ponte, a advogada Gabriela Ortega, do Núcleo de Direitos Humanos José Martí, diz que o ato realizado esta semana foi importante para mostrar a mobilização em torno do caso, com apoio da CUT, coletivos ligados ao PSOL e ao PT e de outras ocupações. “Como houve a tentativa de protocolar [a solicitação da audiência], a funcionária ligou para a juíza, então agora ela sabe da manifestação”, explica. Um novo pedido deverá ser feito de forma digital nos próximos dias.

Área gentrificada

A expectativa, segundo ela, é de que a juíza aguarde a decisão sobre uma ação de reconhecimento de usucapião dos moradores, que caminha na Justiça estadual e é acompanhado pelo Ministério Público e a Defensoria Pública do Estado, antes de analisar o pedido de desocupação. Além disso, há também uma decisão do STF, de dezembro de 2020, que suspendeu os despejos durante a pandemia até março deste ano.

Para a advogada, a venda do imóvel representa o processo de gentrificação e a expulsão dos moradores de baixa renda do bairro de Vila Matias, uma das áreas mais caras da cidade. “A Bragil já colocou o imóvel a venda por 23 milhões”, afirma Ortega.

Em uma audiência pública realizada em novembro do ano passado, organizada pela vereadora Telma de Souza (PT), as famílias cobraram uma proposta que resolva a questão da realocação em contraposição à proposta de indenização da Bragil. Até hoje, a prefeitura de Santos não incluiu os moradores em programas habitacionais e apenas prestou apoio pontuais com assistência social. De acordo com Gabriela, a prefeitura alega que a área é privada e, por isso, não irá intervir.

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Além de abrigar as famílias, o prédio da Casa de Saúde Anchieta faz parte da história da cidade e da memória da luta antimanicomial do país. Entre as décadas de 1950 e 1980, o hospital psiquiátrico ficou conhecido como “Casa do Horrores” por conta das diversas denúncias de violações de direitos humanos contra seus pacientes. Pressionada pelo movimento da reforma psiquiátrica, a prefeitura interviu no local em 1989. Desde então, arquitetos e geógrafos defendem a preservação do imóvel.

Atualização às 13h30 de 15/01/2022: removida informação sob o imóvel sem confirmação técnica.

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