Inicialmente indiciado por agressão, trio responderá por homicídio triplamente qualificado e pode ir a júri popular; crime aconteceu em 2016, quando Luana levava seu filho ao curso de informática
Os policiais militares Douglas Luiz de Paula, André Donizete Camilo e Fábio Donizeti Pultz responderão por homicídio triplamente qualificado pelo espancamento e morte de Luana Barbosa dos Reis, em 8 de abril de 2016, na periferia de Ribeirão Preto. A decisão é do juiz José Roberto Bernardi Liberal, que aceitou denúncia feita pelo Ministério Público.
Segundo Liberal, há “indícios de autoria por parte dos acusados”, conforme decisão em 8 de maio. Agora, inicia-se a chamada “fase de instrução”, em que o magistrado ouvirá primeiramente as testemunhas de acusação, depois os policiais e decidirá se enviará ou não o caso para júri popular. Uma audiência de instrução e julgamento está marcada para o dia 18 de julho, no Fórum de Ribeirão Preto.
O pedido do MP para que o trio de PMs respondesse por homicídio triplamente qualificado é justificado por motivação torpe, ter sido feito por meio cruel e sem chance de defesa. “Os policiais deliberaram em matar a Luana porque ela reagiu a uma abordagem desnecessária”, afirmou à Ponte Jornalismo o promotor Eliseu José Berardo Gonçalves. Anteriormente, o indiciamento nas investigações da Polícia Civil enquadrava os policiais militares por lesão corporal seguida de morte.
Luana morreu na noite do dia 13 de abril de 2016, cinco dias após ser abordada pelos três policiais militares no bairro Jardim Paiva II, na periferia de Ribeirão Preto. Segundo boletim médico emitido à época pelo IML (Instituto Médico Legal), a morte foi causada por um traumatismo crânio encefálico e uma isquemia cerebral.
Segundo familiares, Luana levava seu filho a um curso de informática quando parou em frente a um bar para cumprimentar um amigo e foi abordada. Ao questionar a abordagem e exigir a presença de uma policial mulher para revistá-la, Luana recebeu um soco e um chute que a derrubaram no chão, segundo contaram testemunhas aos familiares.
Ao se levantar, Luana deu um soco na boca de um dos policiais e um chute no pé de outro, sendo então espancada pelos três PMs com cassetetes e com o capacete que ela usava. Em seguida, Luana foi levada para a delegacia, onde foi registrado um termo circunstanciado. Cinco dias depois, Luana faleceu no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto.
A morte de Luana ganhou repercussão internacional após a ONU Mulheres e o ACNUDH (Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos) solicitar ao poder público brasileiro a “investigação imparcial e com perspectiva de gênero e raça na elucidação das violências cometidas contra Luana” e afirmar que trata de “um caso emblemático da prevalência e gravidade da violência racista, de gênero e lesbofóbica no Brasil.”
Prisão preventiva negada
Além de mudar a tipificação do crime, o MP pedia à Justiça a prisão preventiva de Pultz, De Paula e Camilo. O juiz José Roberto Bernardi Liberal negou por considerar que não há “qualquer indício concreto” de que os policiais estejam atrapalhando as investigações. “Com efeito, não há nos autos do processo qualquer indício concreto de que os réus estão criando embaraços à adequada apuração dos fatos, que deixaram o distrito da culpa, tomando rumo ignorado, ou, ainda, que estão se dedicando ao cometimento de atos ilícitos – antes ou depois – do fato em questão”, sustenta.
Advogado de Fábio Donizeti Pultz, Paulo Maximiano Junqueira Neto avalia a decisão como “acertada”. “A negação da prisão preventiva já ocorreu duas vezes na justiça comum. Eles nunca tiveram nenhum tipo de problema na vida inteira sobre sua atuação como policiais”, afirma. A análise é a mesma de Júlio Mossin, que atua na defesa de André Donizete Camilo e Douglas Luiz de Paula, PM aposentado. “O fato ocorreu dois anos antes do pedido de prisão pelo Ministério Público. Não houve nenhum elemento novo concreto que embasasse que a família estava sendo ameaçada. É um elemento ardil para conseguir a prisão dos policiais”, argumenta.
Porém, o advogado da família de Luana, Daniel Rondi, rebate este argumento. Ele aponta que os policiais ameaçaram os parentes durante as investigações do caso. “As ameaças a familiares ocorreram logo depois do fato. O juiz considerou que não havia nada atual que justificasse a prisão preventiva dos policiais hoje. Isso não quer dizer que, havendo novos fatos, o juiz não possa determinar a prisão dos acusados ao constatar que alguma testemunha ou familiar está sob risco”, afirma.