Ação para impedir que data seja celebrada foi proposta pela Defensoria Pública da União; na decisão, juíza Ivani Silva da Luz afirma que comemoração afronta os direitos humanos e os valores democráticos
A juíza federal Ivani Silva da Luz, titular da 6ª Vara do Distrito Federal, proibiu qualquer comemoração dos 55 anos do golpe que deu início a uma ditadura militar no Brasil. Leia decisão na íntegra aqui. A ação civil pública havia sido proposta pela DPU (Defensoria Pública da União) que, no texto, que é de “conhecimento público os horrores relacionados ao período ditatorial, ocorrido no Brasil entre 1964 a 1985”, e destaca que há depoimentos de familiares e vítimas nos relatórios da Comissão da Verdade do Brasil.
Além disso, a DPU argumentou que “mensagem presidencial ofende ao princípio da moralidade administrativa, não se admitindo o dispêndio de recursos públicos para essa finalidade, bem como viola o direito à memória e à verdade, em especial em sua função preventiva, a fim de não se estimular novas rupturas com a democracia e o Estado de direito”.
A ação foi motivada depois que o presidente Jair Bolsonaro determinou, na última segunda-feira (25/3), que fossem feitas “as devidas comemorações” no dia 31 de março, data do golpe de 1964. O próprio Ministério Público se pronunciou publicamente desaconselhando qualquer tipo de comemoração neste sentido.
Em reportagem publicada esta semana na Ponte, mostramos como o dia 24 de março, data do início da ditadura na Argentina, é lembrada: como um feriado nacional e dia de luta pela memória dos mortos e desaparecidos no período.
Na decisão, a magistrada utilizou o ato administrativo do Ministério da Defesa justificando supostas razões é um disfarce do evidente autoritarismo do regime militar, para parecer ser legítima a comemoração, sendo que ela ataca os princípios dos direitos humanos e do Estado Democrático de Direito. “O compromisso com os valores democráticos para restabelecimento do Estado de direito e superação do Estado de exceção antes vigente, está canalizado pelo discurso do presidente da Assembleia Nacional Constituinte, na promulgação da Constituição Federal de 1988, esta, sim, a ser celebrada diuturnamente pelos cidadãos brasileiros, suas instituições e as autoridades que os servem”, escreve Ivani. Na sequência, coloca o discurso, que traz frases como “Temos ódio à ditadura. Ódio e nojo”, na íntegra.
Mais adiante, a magistrada lembra da condenação do Estado Brasileiro pelo assassinato do jornalista Vladimir Herzog, no Doi-Codi, além de chamar o ato administrativo do governo Bolsonaro de “ilegal”, já que para propor uma uma data comemorativa é necessário um projeto de lei, “acompanhado de comprovação da realização de consultas ou audiências públicas (art. 2º), segundo critério de alta significação para os diferentes segmentos que compõem a sociedade brasileira (art. 1º)”.
O episódio 7 do PonteCast trata sobre o absurdo que é comemorar a ditadura militar e o golpe de 64, que tanto Bolsonaro quanto seus apoiadores insistem em chamar de “revolução”.
Bolsonaro, que utiliza o Twitter como uma espécie de comunicação oficial do Planalto, fez uma postagem na noite de sexta-feira, após a decisão da magistrada, mas nada comentou. Se limitou apenas a dizer que está embarcando para Israel. Portanto, o presidente sequer estará no Brasil no dia 31 de março.
Amanhã embarco para Israel para mais uma bateria de compromissos que serão de grande importância para o Brasil. Buscaremos acordos concretos nas áreas de ciência, tecnologia, defesa, entre outras. Ótimas expectativas! Israel é uma nação amiga e juntos temos muito a somar! 🇧🇷🤝🇮🇱
— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) March 30, 2019