Segundo MP, 14 policiais da tropa de elite da polícia paulista usaram pistola e revólver furtados de delegacias para forjar tiroteios e execuções em agosto de 2015
A Justiça marcou para o dia 16 de maio a audiência com 14 PMs da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), acusados de usar armas furtadas de delegacias, submetralhadora artesanal, bananas de dinamite e até colete da Polícia Civil para forjar tiroteios e execuções sumárias.
Segundo o MPE (Ministério Público Estadual), os milicianos da Rota utilizaram uma pistola 40 furtada do 3° DP de Diadema, cidade no ABC Paulista, e um revólver calibre 32 extraviado da Delegacia de Ribeirão Pires, no interior do estado, além de explosivos, em uma cena de crime para “justificar” as mortes de dois homens em Pirituba, zona oeste de São Paulo, em agosto de 2015.
O depoimento de testemunhas e o avanço tecnológico, como câmeras da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) e sistemas de GPS desmascararam a farsa dos policiais militares da tropa de elite da Polícia Militar, que alegaram “ter revidado à injusta agressão”.
Ainda segundo o MPE uma das vítimas, Herbert Lúcio Rodrigues Pessoa, foi abordado pelos PMs Luís Gustavo Lopes de Oliveira, Moisés Araújo Conceição, Erlon Garcez Neves, Renato da Silva Pires e Luiz Fernando Pereira Slywezuk, da viatura 91210, por volta das 10h30 de 6 de agosto de 2015, na rua Hélio Manzoni, Gopoúva, Guarulhos, na Grande São Paulo.
Funcionários de um pet shop e moradores do bairro, ouvidos na Corregedoria da PM e no DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), disseram ter visto Herbert ser abordado por PMs da Rota e colocado no compartimento de presos da viatura oficial.
Herbert ocupava o veículo Fiat Palio azul placas DDE-4459 e o carro não tinha queixa de roubo ou furto. As testemunhas também afirmaram que viram os PMs da Rota revistar o veículo na mesma rua onde ocorreu a abordagem policial.
Testemunhas acrescentaram ainda que presenciaram um policial militar da Rota entrar no carro e dirigir o veículo, que passou a ser escoltado pela viatura 91210 das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar.
Um montador de fotolito relatou que chegou até a fazer uma pesquisa da placa do Fiat Palio por meio do aplicativo Sinesp/Cidadão (Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública), para saber se o automóvel era roubado ou furtado. Ele disse que nada constou.
Herbert, no entanto, foi encontrado morto quase quatro horas depois, às 14h02, na avenida Doutor Felipe Pinel, em Pirituba, zona oeste, a 29,4 km de distância do local onde foi abordado pelos policiais militares. Além de Herbert, os policiais militares também mataram, no mesmo local, Weberson dos Santos Oliveira. O MPE apurou que as duas vítimas não tinham nenhum vínculo e não se conheciam.
A ocorrência foi registrada na Divisão de Homicídios do DHPP, onde os policiais militares da Rota alegaram ter havido um confronto. Os PMs da viatura 91210 disseram que faziam patrulhamento na avenida Doutor Felipe Pinel quando avistaram um Fiat Palio azul com vidros escuros e fechados, despertando suspeitas.
Acrescentaram que iniciaram um acompanhamento e acionaram os sinais luminosos e sonoros (sirene) da viatura e que pediram reforço à Rota pelo rádio. Segundo os PMs, o Fiat Palio reduziu a velocidade e, pela porta traseira do lado do motorista, um indivíduo desceu com arma em punho e “diante da injusta agressão, houve imediato revide e o agressor foi baleado”.
O Ministério Público e o DHPP apuraram que os PMs Moisés Araújo da Conceição e Luís Gustavo Lopes de Oliveira foram os autores do disparo.
Ainda na versão dos PMs, o Fiat Palio tentou empreender fuga até se chocar nas grades de um acostamento. Os PMs disseram que dois indivíduos desceram do carro, sendo que o motorista correu para um matagal e fugiu.
Já o segundo ocupante, de acordo com os PMs, atravessou a rua e disparou contra eles, sendo baleado e morto em seguida, após novo confronto com policiais da viatura 91216, que foi chamada para auxiliar a outra guarnição. As investigações apontaram que o segundo homem foi morto pelos PMs Emerson Bernardes Heleno e Tiago Belli, da viatura 91216.
Os milicianos da Rota declararam ainda no DHPP que com os mortos foram apreendidos uma pistola 40, um revólver 32, uma submetralhadora artesanal, duas bananas de dinamite, um colete com inscrição da Polícia Civil, além de cartuchos de fuzil.
Para o promotor de Justiça Hidejalma Muccio, os policiais militares inventaram toda a história e “plantaram” as armas junto aos dois homens mortos para forjar confronto.
Segundo o promotor, a pistola 40, Taurus, plantada junto ao cadáver de Herbert é da Polícia Militar e foi apreendida em 9 de agosto de 2014 no 3° DP de Diadema. A arma foi furtada da delegacia entre 28 de agosto de 2014 e 11 de fevereiro de 2015. Um investigador da Polícia Civil foi apontado como suspeito pelo desaparecimento. O revólver calibre 32, Taurus, de numeração 76535, foi extraviado em 10 de setembro de 1992 da Delegacia de Polícia de Ribeirão Pires.
A exemplo da versão das armas encontradas com os mortos, a alegação de acompanhamento e perseguição ao Fiat Palio azul, apresentada pelos policiais militares, também acabou desmentida. O Sistema de Informatização de Administração Geoprocessada Ostensivo em Tempo Real, da Polícia Militar, detectou as viaturas 91210, 91216 e 91218 escoltando o Fiat Palio azul em Guarulhos.
A viatura 91210 foi flagrada fazendo uma incursão às 13h do dia da abordagem de Herbert, a 12 km daquele local, mais precisamente na rua Porto de Pedras, em Taboão, Guarulhos, perto do aeroporto internacional.
Já a viatura 91218 foi flagrada por câmeras da CET trafegando pela avenida General Edgar Facó, 1.754, via de acesso ao local das execuções, no dia 6 de agosto de 2015, às 13h43m51s, a uma velocidade de 23,89 km/h,
O Fiat Palio azul também foi flagrado por câmeras da CET passando nessa mesma avenida, no mesmo dia, às 13h43m50s, ou seja, um segundo antes da viatura 91218.
Apesar das fartas provas materiais e testemunhais, os policiais militares respondem ao processo em liberdade, já que em 3 de agosto do ano passado, a Justiça negou o pedido de prisão feito pelo Ministério Público.
Na semana retrasada, a juíza Renata Vergara Emmerich de Souza, da Vara do Júri de Guarulhos, envio ofício ao Comando da Polícia Militar intimando os 14 PMs a comparecer ao fórum para audiência de inquirição de testemunhas, marcada para o próximo dia 16 de maio, às 13h.
No livro-reportagem “Rota 66 – a História da Polícia que mata”, um clássico da literatura policial investigativa, o jornalista Caco Barcellos, denunciava com coragem e maestria, 16 anos atrás, como policiais da Rota forjavam, nos anos 70 e 80, perseguições e confrontos na execução de vítimas, sempre alegando “revide às injustas agressões”.
Nas últimas décadas, o modo de agir dos maus policiais da Rota não mudou. Porém, houve outras transformações, como o avanço tecnológico, que nos últimos anos vem ajudando e muito os setores de investigações a desvendar farsas cometidas pelos assassinos milicianos rotarianos, também conhecidos como Boinas Pretas.
Graças ao avanço tecnológico, a farsa macabra, cometida por policiais da Rota 91210, 91216 e 91218, segundo o Ministério Público estadual, desmontou a versão dos PMs.
A Ponte Jornalismo telefonou para o advogado dos policiais militares, mas não conseguiu contato.