Chacina de 13 de agosto de 2015 deixou 17 vítimas e é a maior da história do estado de São Paulo; ato teve caminhada e exibição de um documentário sobre a luta das mulheres pela memória dos filhos
Debaixo de uma árvore, em uma praça no Jardim Munhoz Jr, na divisa entre os municípios de Barueri e Osasco, Zilda Maria de Paula chorou.
As lágrimas eram de saudade. Naquele mesmo lugar costumava ficar com os amigos depois de jogar basquete na quadra do local seu filho Fernando Luis de Paula, uma das 17 vítimas da chacina ocorrida em 13 de agosto de 2015.
Em memória dos sete anos da Fernando e das outras pessoas que foram assassinadas por policiais militares e guardas civis, no que maior chacina da história do estado de São Paulo, o grupo Mães de Osasco/Barueri organizaram um ato que contou com a presença de ativistas de movimentos sociais, como a Rede de Proteção e Resistência ao Genocídio, além de outros coletivos de familiares que perderam seus entes de forma violenta por conta da ação das forças de segurança do Estado como as Mães de Maio e as Mães de Paraisópolis.
Amigos e vizinhos também participaram da manifestação, que teve início na casa de Zilda com um almoço e depois saiu em caminhada pelas ruas da comunidade até a praça local. Uma enorme bandeira com o rosto de Fernando foi carregada pelos companheiros do Bola +1 FC, time de várzea da comunidade do qual o jovem fazia parte.
“Quando a polícia mata nossos filhos, não são somente eles que morrem. Naquele momento também morre uma mãe e adoece toda uma família”, disse Zilda momentos antes de ser exibido a primeira parte de um documentário sobre seu trabalho frente às Mães de Osasco/Barueri e luta pela memória e justiça pelos parentes.
Presente no ato, Ilza Maria de Jesus Soares compartilha a dor das mães. Ela perdeu o filho, Thiago Roberto Soares, em outra chacina, em 2006, promovida por policiais na Baixada Santista. É uma das representantes do grupo Mães de Maio. Ela afirma que a luta das mães é dolorosa, mas que serve além de apoio de uma para as outros, consegue pequenas vitórias que estimulam a perseverarem na militância por seus entes.
Animada com a decisão do Superior Tribunal de Justiça em federalizar as investigações sobre os crimes ocorridos 16 anos atrás, ela afirma que o trabalho em memória de todos aqueles que perderam a vida nas mãos do Estado: “Se um dia a gente não tiver mais aqui, porque o sistema vai acabando com a nossa saúde, tenho certeza que outras pessoas também estarão na luta também por nós” .
Se por um lado as mulheres da baixada santista comemoram um avanço após mais de uma década, a dor de Maria Cristiana Quirino é a mais recente dentre os grupos de mães que compareceram ao ato. Ela perdeu o filho, Denis Henrique Quirino da Silva, em dezembro de 2019, quando nove jovens morreram após uma ação da PM em Paraisópoilis.
O processo ainda está na fase das audiências de instrução e Maria Cristina aguarda para prestar seu depoimento à Justiça. A mais emocionada entre as mães que participaram da manifestação, ela agradece o apoio de todas as outras mulheres que passaram pela mesma situação antes dela e que hoje servem de refúgio para acalentar os dias mais difíceis.
“Eu encontrei nelas a força para continuar”, afirma Maria Cristina. “Eu sabia que existia esse trabalho delas e não sabia como funcionava, da mesma forma que nunca pensei que um dia eu seria uma delas. A gente precisa fazer isso aqui para manter a memória dos nossos viva. Nossos filhos têm voz e nós somos as vozes deles”, comentou.
Sete anos depois
O processo da chacina de Barueri e Osasco condenou os ex-PMs Fabrício Eleutério e Thiago Henklain, em setembro de 2017, a cumprir 255 anos, 7 meses e 10 dias; e a 247 anos, 7 meses e 10 dias de prisão, respectivamente.
Em março de 2018, Victor Cristilder Silva dos Santos foi condenado pelas execuções de 17 pessoas e a tentativa de matar outras 7 em 13 de agosto de 2015 com pena de 119 anos, 4 meses e 4 dias de prisão. Mas em 2019, Cristilder e o Guarda Civil Municipal (GCM) de Barueri Sérgio Manhanhã tiveram suas sentenças anuladas pelo Tribunal de Justiça de SP. Na época, o TJ alegou que as provas usadas pela acusação eram insuficientes para confirmar a participação dos dois na chacina. Em fevereiro de 2021, os dois foram absolvidos após júri popular.
Segundo as investigações, os assassinatos foram praticados para vingar a morte do PM Admilson Pereira de Oliveira, em 8 de agosto de 2015, e do GCM de Barueri Jeferson Luiz Rodrigues da Silva, no dia 13 do mesmo mês. Em 2019, o Ministério Público explicou que mensagens de WhatsApp foram fundamentais para ligar os acusados.