Professor de história e fundador da União dos Coletivos Pan-Africanistas faleceu nesta sexta-feira (20/12), em decorrência de problemas cardíacos
O professor de história e ativista negro Alaru morreu, nesta sexta-feira (20/12), aos 43 anos. Fundador da UCPA (União dos Coletivos Pan-Africanistas), ele esteve na linha de frente em importantes manifestações contra o racismo.
O ativista morreu em decorrência de problemas cardíacos. Ele ficou internado no Hospital Geral de São Matheus, na zona leste da cidade de São Paulo, e morreu na tarde de sexta-feira. O velório aconteceu na manhã deste sábado (21/12), e o enterro à tarde, no cemitério da Vila Formosa, também na zona leste.
Formado em História desde 2007, dizia que sua faculdade era a luta, as ruas e as praças. Lecionou na zona leste paulistana em escolas municipais e estaduais, além de dar aulas em cursinhos comunitários pré-vestibular.
Em agosto de 2000, quando editava o jornal autônomo Filhos da África, juntou com membros de outros cinco movimentos para formar a UCPA com o objetivo de difundir o pan-africanismo e o fortalecimento do povo preto de forma autônoma, sem vínculo com ONGs, partidos políticos, sindicatos e empresas.
“Na época, queríamos provar a possibilidade de fazer luta em prol da comunidade preta sem estar atrelado a outras instituições. Queríamos ter o controle de nossas narrativas e agendas”, conta o professor Abisogun Olatunji, de 37 anos, que esteve com Alaru desde o começo da UCPA.
Companheiros de movimento destacam que Alaru foi responsável por ensinar uma geração de jovens pretos a ter autonomia na luta contra o racismo e atuar intransigentemente contra a supremacia branca.
“Alaru era um grito, um professor para cada preto e preta que luta diariamente pela dignidade de nosso povo. Foi uma perda irreparável”, diz o assistente jurídico Wesley Nascimento, 27 anos, que militou no mesmo movimento que ele por cerca de um ano.
O militante negro Jomo Akanni, de 46 anos, destaca que Alaru “sempre pautou a luta coletiva como o mais importante”. Parceiros de luta durante 17 anos, Akanni lembra que o professor “criou o termo pan-africanista por essência, que seria um reconhecimento a irmãos e irmãs que, apesar de não se denominarem seguidores do pan-africanismo, tinham o amor ao povo preto como pilar de vida”.
O ativista negro Kairu Kijani, de 22 anos, diz que Alaru “foi muito dedicado e com muita disposição na luta, acolhedor e carinhoso na forma de tratar os irmãos”. Afirma ainda que o professor “ensinou a amar o povo preto e lutar por todos os meios necessários”.
Para Wesley, “era incrível observar os jovens por volta dos 18 anos que ficavam em silêncio para ouví-lo, pois todos tinham consciência do aprendizado que teriam com ele”. Eles se conheceram durante protestos pela liberdade do ajudante Igor Barcelos Ortega.
Em uma manifestação pela liberdade de Igor, que também apontavam racismo nas prisões da modelo Babiy Quirino e do educador Marcelo Dias, em setembro do ano passado, Alaru foi o responsável por puxar um jogral no fim do protesto.
“Nós não podemos acreditar em promessas de partidos políticos, a justiça não é cega, a justiça é branca e racista. Nós temos que nos organizar, entre nós, em nome de uma única bandeira, a bandeira do povo preto. Lutar por liberdade e poder para o povo preto”, disse na ocasião.
Em outro ato que a Ponte cobriu e Alaru estava na linha de frente, militantes negros escracharam uma manifestação de brancos em frente ao Palácio dos Bandeirantes, no Morumbi, zona sul da capital paulista. Os moradores da região foram às ruas para apoiar os policiais militares que mataram o menino Ítalo Ferreira de Jesus Siqueira, de 10 anos.
Enquanto os brancos entoavam palavras de ordem apoiando a morte do menino, na manhã de 11 de junho de 2016, Alaru usava uma caixa de som, acompanhado de outros militantes negros, para dizer que estavam lá “mais uma vez denunciando e prontos para o enfrentamento contra o povo que apoia o genocídio do povo negro”.
Em 2017, novamente o professor estava na linha de frente das manifestações denunciando racismo no caso do menino João Victor Souza de Carvalho, de 13 anos, que morreu em frente ao Habib’s da Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte paulistana, em fevereiro.
Depois de um dos protestos que terminou com o fechamento momentâneo de duas unidades da esfiharia, no dia 1º de abril, Alaru disse sobre a importância em “manter o enfrentamento contra esse gigante chamado Habib’s, que é uma forma de não cair no esquecimento o caso do João Victor e o genocídio que acontece com nossas crianças”.
Sempre preocupado com as crianças, sonhava em construir uma escola pan-africanista na periferia da zona leste paulistana, onde vivia. Ele deixa a companheira com quem tem dois filhos ainda criança e outro filho de 20 anos de um relacionamento anterior.
No Facebook, a advogada Dina Alves, que integra o IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), disse que “a luta pela educação e por uma sociedade antirracista perdeu um professor”, e destacou que “a luta segue e seus ensinamentos serão lembrados”.
Nos registros, Alaru deixa a frase que costumava puxar nas manifestações: “Racistas, otários, nos deixem em paz”.