PM enche um ônibus com presos ilegais após ato em SP

    Além de agredir e prender “para averiguação” militantes do MPL, PM do governo Doria fez o mesmo com jornalistas

    PMs agrediram manifestantes e jornalistas para dispersar pessoas da estação Trianon/Masp | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Policiais militares do estado de São Paulo, comandados pelo governador João Doria (PSDB) e pelo secretário da Segurança Pública, coronel João Camilo Pires de Campos, detiveram ilegalmente um grupo de ao menos 20 pessoas durante protesto contra o aumento no valor das passagens do transporte público na noite desta terça-feira (7/1), na cidade de São Paulo. Entre as pessoas “presas para averiguação”, nas palavras de um PM, está o repórter fotográfico Rodrigo Zaim. A PM ainda agrediu manifestantes e jornalistas durante o ato.

    Manifestante é revistado antes de ser detido pela PM | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    O protesto, puxado pelo MPL (Movimento Passe Livre), aconteceu pelo aumento de R$ 0,10 no valor da tarifa do transporte público, entre trem, metro e ônibus, de R$ 4,30 para R$ 4,40, em acordo da Prefeitura, administrada por Bruno Covas, com o Governo estadual, gerido por João Doria, ambos do PSDB.

    A detenção aconteceu após a tropa dispersar manifestantes na estação Trianon/Masp, da linha 2 – Verde do Metrô, na Avenida Paulista, região central da capital paulista, e todos foram levados ao 78º DP (Jardins). As pessoas estavam no entorno da Paulista quando abordada pelos PMs. Testemunhas relatam que as abordagens eram aleatórias. As pessoas permanecem detidas em frente à delegacia. Nesta mesma ação os policiais agrediram quem estava no local, seja manifestante ou jornalista.

    Objetos apreendidos que teriam sido encontrados com os detidos | Foto: Caê Vasconcelos/Ponte Jornalismo

    A Ponte questionou um PM sobre a prisão das pessoas, informando que havia um fotógrafo no grupo. “Ele tem imunidade parlamentar? Por que ele não pode ir para averiguação?”, questionou o policial, complementando: “É averiguação, porra”. O diálogo se deu antes do ônibus partir da Avenida Paulista em direção ao DP.

    Policiais colocaram os detidos em um ônibus sem identificação e os levaram ao 78º DP | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    A chegada à Avenida Paulista se deu após marcha iniciada na Prefeitura e que passou pela Avenida 9 de Julho. Chegando lá, interditaram a avenida totalmente e a reivindicação era de que as catracas fossem abertas gratuitamente para quem estava no ato ir embora, caso contrário a Paulista não seria liberada. Após minutos de impasse, a PM se colocou à frente da catraca e bloqueou totalmente a passagem, inclusive para quem não estava no ato. A discussão prosseguiu, enquanto lideranças do ato tentavam negociar.

    PM tira foto de um manifestante detido com seu celular | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    O clima piorou quando teve início forte chuva na cidade de São Paulo e praticamente todos os manifestantes se abrigaram na estação Masp e o Baep (Batalhão de Ações Especiais de Polícia), tropa que atua no “padrão Rota”, como define o governador João Doria, entrou no local. Houve dispersão dos manifestantes, momento em que PMs de capacete branco distribuíram chutes, empurrões e golpes de cassetetes em quem estivesse na frente.

    Tropa usou gás de pimenta para forçar as pessoas a saírem da estação | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Assim como os manifestantes, jornalistas que cobriam o ato também foram agredidos. A tropa deu golpes de cassetete em cerca de 10 repórteres e fotógrafos, os empurrando-os para fora da estação. O fotojornalista Daniel Arroyo, da Ponte, levou ao menos um golpe de cassetete no braço.

    Em seguida, um grupo de manifestantes lançou duas garrafas em PMs, que perseguiu e deteve um homem, que admitiu ter jogado o objeto. Os policiais intimidavam o homem. “Ele jogou garrafa? Vai ser fuder. Está fodido”, disse um integrante da tropa. Em seguida, um comandante dos PMs chamou um policial de capacete e disse a ele: “agora você tomou uma garrafada”.

    Manifestantes lançaram ovos com tinta em direção à tropa | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Início sob tensão

    Já havia tensão no começo do ato, quando as pessoas se reuniam em frente a Prefeitura. Policiais revistaram algumas pessoas de forma aleatória logo na chegada dos manifestantes, por volta das 17h. Quem era selecionado ficava dentro de um cerco feito pelos policiais enquanto tinha documentos e itens, como mochilas e bolsas, verificados.

    Representantes do MPL discordaram dos policiais mediadores, que intermediavam as negociações com o comando da ação, quanto ao trajeto do ato. Segundo o tenente Crúvel, um dos dois mediadores, o protesto estava em “desobediência” a um decreto imposto pelo governador João Doria (PSDB) em 2019.

    Paredão da PM bloqueou entrada do metrô | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Em janeiro do ano passado, o tucano instituiu uma série de regras para a realização de protestos no estado de São Paulo. Entre a medidas estava a proibição do uso de máscaras, a necessidade de que o poder público fosse avisado oficialmente cinco dias antes de cada manifestação, entre outros.

    À época, entidades que defendem o direito de manifestação criticaram a decisão, considerada inconstitucional e um ataque à liberdade de expressão. “São ações inconstitucionais e repressivas que estão acontecendo em São Paulo”, definiu a advogada Camila Marques, da Artigo 19, que denunciou internacionalmente o decreto de Doria.

    Novo bloqueio impedia que as pessoas descessem rumo à catraca da estação | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Definido o trajeto, com saída da Prefeitura, passando pela Avenida 9 de Julho e terminando no Masp, o ato começou com sua marcha. O caminho foi feito sem problemas, com policiais armados com calibres 12 de munição feita de balas de borracha e bombas de um lado, enquanto outra leva de PMs escoltava os manifestantes envelopando a marcha, que chegou na Avenida Paulista.

    Em nota divulgada em suas redes sociais, o MPL criticou a forma com que o protesto foi encarado pelo poder público. “Em vez de reconheceram nossas pautas como legítimas, os governantes mandaram as forças policias fechar a estação e defender as catracas. Toda essa violência para impedir nosso direito de ir e vir e defender o lucro dos empresários”, posicionou-se o grupo. Um novo ato acontecerá na quinta-feira (9/1), às 17h, na Praça da Sé, centro de São Paulo.

    Momento de discussão entre manifestantes e policiais | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    A reportagem questionou a SSP (Secretaria da Segurança Pública) de São Paulo e a PM, comandada pelo coronel Marcelo Vieira Salles, sobre a detenção das pessoas e o número exato de detidos na delegacia dos Jardins. Às 22h33 desta terça-feira (7/1), a assessoria de imprensa terceirizada da pasta, a InPress, descreveu em nota que a PM atuou “para garantir a segurança dos participantes e o direito de ir e vir dos paulistanos” na estação Masp.

    “Após orientação dos PMs, os manifestantes foram conduzidos para a área externa da estação, que foi depredada. Um grupo com aproximadamente 30 manifestantes foi detido e encaminhado ao 78º DP, onde a ocorrência está sendo registrada”, diz a SSP, informando que apreendeu coquetéis molotovs, recipientes com materiais inflamáveis e outros objetos com as pessoas.

    A SSP ainda informa que um major da PM foi ferido por estilhaço de vidro, “sendo socorrido ao Hospital das Clínicas”. Não há detalhes sobre o estado de saúde do major nem o momento em que ele foi ferido na ação.

    PM vigia os detidos dentro do ônibus | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Atualização às 23h34 do dia 7/1 para incluir posicionamento da SSP.

    PM procura vestígios da garrafada que um dos integrantes da tropa teria levado | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

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