PM que matou artista plástico Nego Vila é expulso da corporação

Comando entendeu que ação do sargento Ernest Decco Granaro foi contra os direitos humanos; ele foi condenado a 15 anos de prisão por disparar contra a vítima após uma discussão em 2020 na Vila Madalena, zona oeste de SP

À esq., o agora ex-sargento Ernest Decco Granaro, à dir., o artista plástico Nego Vila | Fotos: reproduções/redes sociais

O Comando-geral da Polícia Militar do estado de São Paulo expulsou da corporação, nesta segunda-feira (8/1), o sargento Ernest Decco Granaro por disparar contra e matar o artista plástico Wellington Copido Benfati, conhecido como Nego Vila, após uma discussão num bar no bairro da Vila Madalena, na zona oeste da capital, em 2020.

A PM entendeu que Granaro praticou “atos atentatórios ao Estado, à Instituição e aos direitos humanos fundamentais” que desonraram a corporação por “disparar arma por imprudência, negligência, imperícia, ou desnecessariamente”, que é considerada uma falta disciplinar grave. A decisão foi publicada no Diário Oficial do Estado.

Além da expulsão, o agora ex-sargento está recorrendo em liberdade contra uma sentença de 15 anos de prisão em regime fechado pela morte do artista plástico. Em 2022, um júri popular seguiu o entendimento do Ministério Público e o condenou por homicídio qualificado, por ter sido cometido com recurso que dificultou a defesa da vítima e pelo crime ter ocorrido durante uma situação de calamidade pública (pandemia).

De acordo com os amigos da vítima em depoimento à Polícia Civil e durante as audiências, também ouvidos pela Ponte na ocasião, eles estavam com Wellington em uma adega na Rua Deputado Lacerda Franco, no bairro da Vila Madalena, na zona oeste da capital paulista, em 28 de novembro de 2020.

O artista e o então sargento, que estava de folga, teriam iniciado uma discussão por causa de um violão de um amigo de Granaro, tendo sido apartados por pessoas que estavam no local. Segundo eles, em determinado momento, o policial sacou a arma e disparou para cima, o que fez com todos corressem.

As testemunhas disseram que viram Wellington cair no chão “muito provavelmente pelo susto” e que Ernest se aproximou dele e fez um disparo contra o seu peito. De acordo com elas, o sargento só não fez um outro disparo porque uma terceira testemunha se jogou contra o corpo do artista. Nego Vila chegou a ser socorrido com vida, mas não resistiu. De acordo com o laudo necroscópico, ele foi atingido com um tiro entre o peito e a axila esquerda.

No termo de interrogatório feito na delegacia, Granaro afirmou que teria evitado que alguém furtasse o violão de um amigo que o acompanhava, com quem diz formar uma dupla de música amadora que se apresenta em bares da região. Depois de desfeita a confusão, pessoas teriam voltado à falar com o PM, perguntando se ele seria advogado do amigo.

Ele também alegou ter sido agredido fisicamente na sequência, indo ao chão após tomar uma “gravata”, ou golpe de enforcamento. O PM disse que foi cercado por várias pessoas que bateram em sua cabeça e tentaram pegar sua arma. O laudo do Hospital da Polícia Militar identificou lesões leves na cabeça, cotovelo esquerdo e punho direito.

O sargento declarou que Nego Vila o atacou e que atirou para “repelir a agressão”, informando ainda que não saberia precisar se atirou para cima ou para baixo e que não sabia quantos disparos deu. O boletim de ocorrência informa que outras duas testemunhas confirmaram essa versão.

Além da acusação de homicídio, também havia sido registrada resistência à prisão, uma vez que os policiais que levaram o caso ao 14º DP (Pinheiros) informaram que Granaro se recusou a cumprir as ordens para largar a arma e colocar as mãos na cabeça, dizendo que era policial militar. Ele acabou desarmado e algemado.

A juíza Michelle Carreiro, que determinou que o policial fosse levado a júri popular pelo homicídio qualificado, decidiu não submeter o crime de resistência a julgamento porque os depoimentos dos PMs que atenderam a ocorrência denotam que “não houve violência e nem ameaça, sendo certo que o réu apenas teria se identificado e pedido o cumprimento do procedimento previsto nas normas da Polícia Militar para a prisão de superior”.

Granaro ficou dois anos preso. Quando da condenação, em 2022, a magistrada já havia proibido que ele tivesse a posse e o porte de arma da corporação até o trânsito em julgado da sentença, ou seja, quando todos os recursos para reverter a condenação tivessem sido esgotados.

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A família de Nego Vila atuou como assistente de acusação do caso. Em abril de 2021, de acordo com o G1, os parentes entraram com uma ação judicial contra Granaro e o governo do Estado de São Paulo com pedido de indenização por danos morais em R$ 200 mil e pagamento de pensão à filha do artista até ela completar 25 anos. Hoje, ela tem 11 anos e vive com a mãe, que já era separada da vítima. A Ponte apurou que esse processo está em andamento e ainda não teve uma decisão do Tribunal de Justiça.

O que diz a defesa

A Ponte procurou o advogado Renan de Lima Claro, um dos que representam Ernest Granaro pelo escritório Ochsendorf & Lima Claro Advogados, mas não teve retorno até a publicação. A reportagem não localizou o advogado Ivândaro Alves da Silva, que aparece no Diário Oficial como defensor dele no procedimento disciplinar da PM. Caso se manifestem, o texto será atualizado.

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