Sérgio Vaz: ‘a poesia desce do pedestal e beija os pés da comunidade’

    O “poeta das periferias” e fundador da Cooperifa foi o convidado de estreia da Academia de Literatura das Ruas, nova série de lives Ponte, e falou da inspiração para os seus versos

    A estreia da live Academia de Literatura das Ruas foi com o poeta que inspirou seu nome, Sérgio Vaz. Comandado pela editora de redes sociais da Ponte, Jessica Santos, o bate-papo desta quarta-feira (04/11) mergulhou na literatura dos nobres imortais que não ocupam uma cadeira na Academia Brasileiras de Letras (ABL): os autores da periferia.

    Sérgio Vaz vive em Taboão da Serra (SP) e é autor de livros como “Literatura, pão e poesia”, “Colecionador de pedras”, “Flores de alvenaria”, “Subindo a ladeira mora a noite”, e “Cooperifa – Antropologia Periférica (2008)”. Entre os prêmios que já conquistou na carreira estão Unicef (2007), Orilaxé (2010), Trip Transformadores (2011), Governador de São Paulo, nas categorias Inclusão Cultural e Destaque Cultural (2011), Heróis invisíveis e Hutúz. Além disso, é fundador da Cooperifa (Cooperativa Cultural da Periferia), projeto que apoia a produção literária e cultural nos extremos invisíveis de São Paulo.

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    Eleito em 2009 pela revista Época uma das cem pessoas mais influentes do Brasil, o poeta contou que o gosto pela leitura partiu da influência de seu pai, e serviu de refúgio nos anos 70 e 80, época de muita violência no Jardim São Luiz, bairro em que morava na zona sul da capital paulista. Capitães de Areia, de Jorge Amado, e Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, são as histórias que mais o marcaram. 

    Mas, o gosto pela poesia começou de uma forma diferente. Vaz lembrou de quando achava a poesia coisa de intelectual e o que fez mudar seu pensamento. “Em 1983, quando fui servir ao Exército, eu já estava gostando de música popular brasileira, as letras me atraiam. Então, eu despertei para as metáforas”, recordou. Ele conta que a música que abriu sua mente, durante a ditadura militar, foi “Pra Não Dizer Que Não Falei Das Flores”, de Geraldo Vandré. A partir disso, começou a escrever seus próprios versos, percebendo que a poesia servia para falar da fome e para se posicionar contra o racismo e a violência.

    A arte de popularizar a palavra

    Desde o seu primeiro livro, Subindo a Ladeira Mora a Noite, lançado em 1988, Sérgio Vaz aborda temáticas sociais, mas para ele, o que inspirou ele a adentrar a literatura das ruas foi ler Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus. Nesse momento, a sua vontade era ficar conhecido na própria quebrada: “Não adianta ter muita gente escrevendo se o nosso povo não vai ler. Então, eu parti nessa missão de popularizar a literatura, dessacralizar a poesia e de popularizar a palavra”.

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    Vaz explica que a Cooperifa (Cooperativa Cultural da Periferia) partiu desta vontade e o projeto empoderou a comunidade a trazer sua arte, apresentada em um sarau “onde a poesia desce do pedestal e beija os pés da comunidade”. Dessa iniciativa, a periferia colheu frutos com novos escritores, artistas e, principalmente, leitores. “Sou capaz de falar que, hoje, nós pretos e pobres lemos mais que muita gente”, afirmou, ao falar da leitura como ato político e se posicionar contra a taxação dos livros.

    Sobre o seu processo criativo, o poeta define seu método como “caos”. A sua inspiração é a observação das ruas e a leitura de pessoas.

    O livro liberta

    Em mundo cada mais imediato e virtual, Sérgio Vaz comenta a falta de trocas de ideias e o papel da literatura nesse sentido, em aceitar ouvir opiniões divergentes e o pensamento crítico. “Nós chegamos a esse país, justamente, porque a gente não conversa mais. É lado A e lado B, só ouço quem é do lado B. A literatura te dá esse poder de você ter coragem para falar. E não é para enganar os outros, mas até para não ser enganado também”, afirma.

    Vaz destacou também o futuro promissor com o trabalho da literatura negra, feminina e jovem que o movimento da luta periférica gerou até aqui. Por fim, ao falar da contribuição literária para mudar o mundo, o poeta recitou sua poesia “Novos Dias”.

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