No primeiro semestre deste ano, PM matou 20% a mais e prendeu 19% a menos; para especialista, dados colocam em dúvida desculpa do governo de que mortes ocorrem em confronto
Os seis primeiros meses de 2020 marcam um recorde histórico: 498 pessoas perderam a vida nas mãos de policiais militares, 435 mortos por PMs em serviço e os demais por policiais de folga. É o maior número já registrado em um primeiro semestre desde que a Secretaria da Segurança Pública passou a disponibilizar esses dados, em 1996.
Os homicídios cometidos pela polícia explodiram na gestão do governador João Doria (PSDB). Nos últimos nove meses, entre outubro do ano passado e junho deste ano, o governo registrou três trimestres consecutivos em que as mortes ficaram acima da média registrada desde 2016 — antes disso, as estatísticas não informam as mortes cometidas por policiais de folga.
E não foram apenas os PMs. Os policiais civis também estão matando mais: tiraram a vida de 16 pessoas entre janeiro e junho deste ano — 4 a mais do que no mesmo período de 2019.
Tanto o governador como o comando da Polícia Militar alegam que os policiais matam em legítima defesa e atribuem a explosão das mortes a um aumento nos confrontos com supostos criminosos, mas os números não corroboram essa tese. No mesmo período, o número de pessoas presas em flagrantes foi de 52.671, o menor número desde 2011, e que representa uma redução de 19% em relação às 65.042 pessoas presas em flagrante no primeiro semestre de 2019.
Para Rafael Alcadipani, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, “esse fato de que a gente está com menos prisões em flagrante mostra incongruência das desculpas que o Governo do Estado de São Paulo tenta dar para esse problema gravíssimo”.
“Parece que a gente tem uma polícia que está optando muito pela letalidade e isso precisa ser revisto urgentemente”, afirma Alcapipani. Segundo ele, o “clima do mundo” mudou após a morte de George Floyd, assassinado por um policial em Minneapolis, nos EUA, em maio. “A população do mundo não está mais aceitando uma polícia violenta, então é urgente que isso seja mudado.”
“Não se prende morto em flagrante delito, por isso a alta em um e redução no outro”, é o que diz tenente-coronel aposentado da PM paulista Adilson Paes de Souza, mestre em Direitos Humanos pela USP (Universidade de São Paulo).
Para Souza, existem “causas históricas” que justificam a alta na letalidade policial. Segundo ele, “a ideia de eliminação do inimigo, o apelo popular para matar pessoas, achando que pode trazer segurança” e o “discurso de aumento do uso de armas” explicam o aumento da letalidade policial.
Os dados também apontam para um aumento no número de policiais militares mortos. Nos primeiros seis meses do ano, 24 PMs foram assassinados (metade deles estava de folga), ante 14 PMs no mesmo período de 2019 (sendo que 7 estavam em horário de serviço).
Homicídios voltam a subir
A pandemia de coronavírus não contribuiu para diminuir o número de mortes violentas, tanto as cometidas pela polícia como os homicídios comuns. As estatísticas trimestrais do Governo de São Paulo indicam uma alta de 4% no número de homicídios dolosos (quando há intenção de matar), que saiu de 1.465, no primeiro semestre do ano passado, para 1.522 vítimas em 2020. Trata-se da primeira alta de homicídios dolosos em São Paulo, num primeiro semestre, dos últimos sete anos.
Com a soma dos dados, é possível dizer que, a cada quatro pessoas assassinadas no estado, uma morreu pelas mãos de um policial militar.
Na avaliação de Alcadipani, “parece que não há uma preocupação em reduzir esses números, tanto é que só aumentam”. O professor acredita que “enquanto a Polícia Militar não for impedida de ser a primeira a mexer na cena do crime, enquanto a Corregedoria da PM não for responsável por resolver esse problema, e enquanto o Ministério Público não exercer de fato seu papel de controle das polícias, a gente vai acabar tendo esse tipo de problemas”.
O que diz o governo
Questionada pela reportagem, a Secretaria da Segurança paulista afirma que as polícias têm compromisso com a vida e, por isso, “medidas para a redução de mortes são permanentemente estudadas e implementadas”. Diz ainda que, por determinação do governo, todos casos de mortes por PMs são investigados pela Polícia Civil e pela própria PM, além de comunicados ao Ministério Público.
Por meio de nota, o governo paulista diz que analisa todas ocorrências policiais que resultam em morte e avalia medidas alternativas de intervenção em ocorrências futuras. “Não há complacência com o erro, desde o início do ano, mais de cem policiais militares foram presos”, diz.
A Secretaria de Segurança Pública afirma que, desde o início da gestão do governador João Doria, tem reforçado ações de combate à criminalidade e proteção à pessoa. “A partir da análise dos indicadores criminais, os programas de policiamento são posicionados em áreas com maior incidência de delitos de forma a coibir essas práticas”, conclui.
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